Não há um caminho único que leva à descarbonização e a um ar mais limpo e respirável. Fabricantes de automóveis e de caminhões trabalham com diversas alternativas. Motores híbridos flexíveis, gás natural e elétricos alimentados por hidrogênio estão entre as opções. Algumas dessas tecnologias já estão em uso, enquanto outras estão em desenvolvimento. O assunto foi debatido no painel “Descarbonização: como o processo está avançando e o que há de novidades nos setores de leves e pesados”, do qual participaram João Irineu Medeiros (vice-presidente de compliance de produto da Stellantis para a América do Sul), Francisco Scroffa (presidente da Enel-X Brasil) e Paulo Genezini (head de sustentabilidade da Scania no Brasil).
Na Stellantis, a meta é alcançar 100% de descarbonização até 2038. Para isso, o grupo trabalha no desenvolvimento de veículos híbridos com motores flexíveis, para utilização com etanol (a exemplo do que a Toyota já faz).
Segundo Medeiros, a grande vantagem do etanol é que a plantação de cana-de-açúcar captura o CO2 emitido pelo motor a combustão, tornando o ciclo completo de emissões (well to wheel, ou do poço à roda) de um veículo movido a etanol muito próximo ao de um modelo 100% elétrico a bateria.
No caso do etanol, o combustível só não pode ser considerado 100% renovável porque o processo de produção e transporte (da usina aos postos) usa combustível fóssil. Já no caso dos veículos elétricos, a fabricação de baterias e a extração de materiais para sua construção (como lítio, níquel e cobalto) também geram carbono, informa o executivo.
Fabricantes de caminhões enfrentam um grau de dificuldade ainda maior do que o de veículos leves para desenvolver novas tecnologias aos veículos pesados. “O diesel é extremamente eficiente, mas é um combustível fóssil, que tira carbono de baixo da terra e joga para a atmosfera”, diz Paulo Genezini, da Scania. Por isso, ele informa que a empresa de origem sueca está trabalhando em algumas frentes. “Não teremos apenas um combustível alternativo.”
Uma das recentes soluções foi vender no Brasil caminhões a gás. “A Scania entendeu que o gás está maduro e o Brasil tem potencial para isso”, informou. Esse tipo de solução é capaz de funcionar tanto com gás natural como com biometano, que pode ser produzido a partir de qualquer tipo de biomassa (como o gás gerado por lixões, por exemplo). O executivo afirma que na Suécia desde a década de 90 não existe lixão que não produza biometano.
De acordo com Genezini, os modelos a gás começaram a rodar no País em 2020, e de lá para cá mais de 600 caminhões já estão em uso, “substituindo muito bem o diesel”. Segundo ele, a tecnologia “veio para ficar”.
Além da tecnologia no motor, os caminhões mais modernos adotam outros sistemas com a finalidade de ajudar a condução e a reduzir as emissões. É o caso do GPS com função “active cruise”. Ele utiliza informações sobre a topografia do caminho, para reduzir marchas antes de chegar a um aclive, por exemplo, e assim aproveitar melhor a força do motor (e economizar combustível).
Com a mesma finalidade, o executivo da Scania informa também que a empresa tem investido em treinamento de motorista. Com aprimoramento no modo de conduzir, é possível melhorar o consumo de combustível. No entanto, Genezini acrescenta que, com o passar do tempo, muitos motoristas retomam “os velhos hábitos”. Por isso, a tendência tem sido adotar a conectividade com o caminhão, que permite monitorar remotamente o comportamento do motorista e indicar possíveis correções de conduta.
O acompanhamento a distância também permite definir o plano de manutenção de acordo com o uso, e não mais pelo manual. “A conectividade avisa se precisa ou não trocar o óleo”, exemplifica. Segundo Genezini, com base nessas informações a concessionária prepara a peça necessária para a troca antes mesmo de o caminhão chegar, agilizando o serviço.
Para o presidente da Enel-X Brasil, Francisco Scroffa, o País tem um futuro “abençoado”, graças à matriz elétrica renovável. “O Brasil é forte em energia solar e em ventos, e isso vai acelerar (a geração de energia)“, garante.
Entre as diversas áreas em que atua, a Enel-X é fornecedora de carregadores elétricos. Por meio de parceria com as montadoras, o executivo garante que, quando o cliente compra um veículo elétrico, a empresa já instala o carregador em sua residência, antes mesmo da entrega do carro.
Apesar do baixo volume das vendas de automóveis elétricos, Scroffa garante que, só em janeiro deste ano, instalou mais carregadores do que em todo o ano passado. “O share (participação) está crescendo, então o custo do carro deve cair.”
Em parceria com a rede de estacionamentos Estapar, a Enel-X está ampliando os postos batizados de “Ecovagas”. Atualmente, são 250 vagas para elétricos, espalhadas por 23 cidades. De acordo com Scroffa, o projeto está em expansão e deve chegar a 1.500 vagas em prédios públicos, aeroportos, estádios e shoppings. Entre outras vantagens, ele cita o fato de que as vagas para veículos elétricos costumam ser “as melhores” dos estacionamentos, perto dos acessos.
Além disso, ele lista vantagens como a possibilidade de o carro poder devolver energia para a rede, além de aproveitamento da “segunda vida” da bateria, para uso residencial, por exemplo.
Segundo o executivo, ainda falta uma rede de carregamento rápido em rodovias, mas ele vislumbra a possibilidade de, no futuro, a operação poder ser feita por indução. Ou seja, enquanto o carro percorre a estrada ele vai sendo carregado automaticamente.