Os veículos elétricos representam um grande avanço em termos de pesquisa e tecnologia em relação aos automóveis com motor a combustão. Mas eles ainda têm pela frente um campo ilimitado de desenvolvimento de inovações, que ajudarão a mudar o futuro da mobilidade. “Muitos recursos complementares e convergentes estão por vir para ser instalados nos veículos com motorização elétrica”, adianta Diogo Seixas, fundador da Atlas Power, startup de mobilidade elétrica de Santa Catarina e diretor de componentes da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).
Um dos estudos mais bem encaminhados é o carro autônomo. A automação é dividida em níveis que vão de 0 a 5. O 0 depende 100% da ação do motorista, mas já apresenta dispositivos, como sensor de ré, para evitar batidas no carro de trás, e controle de velocidade, que emite um som quando o automóvel está muito acelerado.
O nível 1 incorpora o controle de cruzeiro adaptativo (ACC), sistema eletrônico que mantém a velocidade predefinida na estrada, aumentando a segurança do motorista. Se o sensor detectar que o veículo da frente se encontra mais lento, o ACC, automaticamente, se ajusta para impedir uma eventual colisão.
O nível 2, além de reprogramar a velocidade de acordo com o carro adiante, pode desviar e até parar o veículo. “Ele acelera ou freia de maneira uniforme de acordo com o automóvel da frente, mas ainda é o motorista que está no comando do carro”, afirma Seixas.
No nível 3, o veículo começa a “entender” o ambiente ao redor, identificando a proximidade de pedestres, ciclistas e animais. Nele, os carros conseguem executar algumas operações com limitações, como percorrer uma estrada a uma determinada velocidade. Cabe ao motorista assumir o comando se o carro ficar desgovernado, uma vez que ele não é configurado para esse tipo de situação.
A intervenção humana é bem menor no nível 4 de condução autônoma. “O veículo faz tudo sozinho, mas em regiões delimitadas, como em um bairro específico”, revela Seixas. “Aqui, o ‘robozinho’ que conduz o veículo consegue interpretar a sinalização das ruas.”
O nível 5 permitirá que o motorista seja um mero passageiro, ocupando o tempo do percurso em uma reunião de trabalho ou usando o computador. O automóvel será capaz de reconhecer o buraco na rua, ler as placas de trânsito e até buscar o dono no escritório, bastando programar o endereço de destino pelo celular. O carro nem precisará de volante ou pedais, que podem ser substituídos por um assistente de voz.
Pedro Bentancourt, diretor de assuntos externos e relações governamentais da Nissan, faz uma comparação interessante. “Os carros autônomos mais evoluídos serão como aquele robozinho que aspira o pó da casa sem o comando humano. Quando estiver sem carga, ele se movimentará sozinho até o eletroposto para ser recarregado”, diz.
Muitas montadoras avançam no desenvolvimento de carros elétricos totalmente autônomos, que têm permissão para rodar apenas como projetos piloto. Sua utilização dependerá de fatores como mudanças de legislação de cada país, mas estados americanos como Califórnia, Arizona, Texas e Nevada já estão criando leis próprias para colocá-los nas ruas, quem sabe?, em 2025.
“É difícil precisar uma data, porque os 50 estados dos Estados Unidos possuem legislações diferentes, alguns são mais progressistas; outros, mais conservadores. Será necessária a autorização de cada um deles para o automóvel rodar no país inteiro”, avalia Seixas. “Uma coisa é certa. Quando o mundo todo migra para uma tecnologia, não tem mais volta.”
A automação do nível 5 é apenas uma das possibilidades de evolução dos veículos elétricos. Eles também permitirão o compartilhamento embarcado. Equipados com chaves digitais, os carros serão deixados nas ruas depois de guiados por motoristas que completaram seu deslocamento. O usuário seguinte pode abrir o veículo e fazer o pagamento do tempo de utilização por um aplicativo.
O carro elétrico será uma ferramenta rentável nos períodos de ociosidade, quando o proprietário cumpre seu expediente de trabalho, por exemplo. “Hoje, os mais jovens não desejam ter automóvel – preferem usá-lo quando necessário. Nesse contexto, o compartilhamento do carro elétrico é uma ótima solução”, diz Seixas.
Futuramente, montadoras e concessionárias deixarão de lucrar tanto com a venda e a manutenção dos automóveis. Por isso, o carro elétrico ajudará a mudar os hábitos de consumo com novos modelos de negócio, como planos de assinatura com chaves digitais – que poderão ser QR Code ou aplicativos. Isso permitirá que o dono alugue seu carro para terceiros.
Outro estudo é o do robotáxi, união do carro autônomo com o compartilhamento e já em testes pela marca americana Tesla. Nele, o proprietário deixa o automóvel do nível 5 disponível quando não está sendo usado. Ao receber uma solicitação, o carro – programado com dados como posições geográficas e horários – vai sozinho até a casa da pessoa que fez a chamada. “São maneiras de fazê-lo trabalhar para você e de se pagar”, ressalta Seixas.
Em paralelo a esses recursos, está caminhando a passos largos a tecnologia 5G, que, além de mais rápida, permitirá a comunicação entre carros e trânsito. Um exemplo: um semáforo, quando estiver entrando na luz amarela, enviará um sinal ao automóvel que se aproxima, alertando-o sobre necessidade de iniciar a frenagem. Ele se comunicará com os carros de trás para que também reduzam a velocidade.
“Será o fim dos engarrafamentos e os deslocamentos serão feitos em menos tempo”, vislumbra Pedro Bentancourt, da Nissan. Mas faz a ressalva: “Talvez essa comunicação entre veiculo e entorno não seja possível ainda com a tecnologia 5G. Devemos esperar a 6G”.
As baterias dos carros elétricos também servirão de fornecedores de energia a estabelecimentos, residências e uma série de aparelhos. Na tecnologia V2L (vehícle to load), o veículo pode mandar energia a outro carro e equipamentos, como TV, fornos elétricos e ar-condicionado. Marcas como Audi, Honda, Hyundai e Kia já têm planos de instalar o V2L em alguns de seus modelos.
No sistema V2H (vehícle to home), a bateria é transformada em unidade de energia móvel, capaz de gerar corrente elétrica para uma residência ou determinadas áreas. Já o V2G (vehicle to grid) é mais amplo, porque o carro envia a energia de volta à rede elétrica – operação que ainda não é permitida no Brasil. “Seria uma ótima alternativa nos horários de pico de consumo”, afirma Diogo Seixas. “Além disso, a velocidade da entrega de energia proveniente da bateria é maior que a de uma termoelétrica.”
No Reino Unido, existem projetos bem adiantados em que, ao devolver energia à rede, o usuário ganha créditos das administradoras. “Os carros elétricos são grandes acumuladores de energia e, daqui a 20 anos, ajudarão a resolver possíveis gargalos de fornecimento. Depende de uma infraestrutura com redes inteligentes, que ainda não temos no Brasil”, salienta Bentancourt.
Os carros elétricos do futuro podem apresentar outra forma de armazenar energia, além das baterias, geralmente, instaladas no assoalho. Segundo Diogo Seixas, as células fotovoltaicas se mostram como solução altamente eficiente. “Os automóveis têm poucas áreas úteis para a instalação de painéis solares; por isso, é um desafio captar mais energia em menos espaço”, revela.
Modelos com superfícies planas no capô, no teto ou na tampa do porta-malas, como os sedãs, são capazes de incorporar as placas solares com mais facilidade. Há muitos países em que as pessoas deixam seus carros estacionados nas ruas, viabilizando o armazenamento da energia vinda da luz solar, que é limpa e gratuita”, afirma Seixas.
Outra fonte de energia pesquisada em países como Japão e China é o carregamento de bateria wireless. “Se os smartphones têm, por que o carro elétrico não teria?”, pergunta Gustavo Noronha, diretor de eletromobilidade da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA). “Nessa tecnologia, uma das pistas das principais rodovias é dotada de indução magnética. Quando o carro passa por ela, a bateria se recarrega e, depois, o motorista será cobrado por essa carga.”
Noronha destaca mais duas “revoluções” que, inevitavelmente, chegarão aos carros elétricos: a evolução das baterias e o menor tempo de recarga, que mudará a relação com a autonomia. “Estudos de desenvolvimento energético sinalizam que as baterias diminuirão de tamanho, fornecerão mais energia e levarão menos tempo para recarregar. Isso trará mais segurança e durabilidade”, assinala.
Além disso, outros materiais poderão compor a bateria do veículo elétrico, que, hoje, contém lítio, grafite, níquel, cobalto e manganês. “Novos elementos, como grafeno, nióbio e silício, podem aumentar de duas a cinco vezes a eficiência do componente”, completa Noronha.