A região da Grande São Paulo é um dos polos do ciclismo de estrada no Brasil, modalidade esportiva que existe desde os Jogos Olímpicos de Atenas, em 1896, mas que se tornou popular com o Tour de France, competição iniciada em 1903. Um marco nacional para o esporte foi a criação da tradicional prova 9 de Julho, em 1933, na cidade de São Paulo, que culminou por disseminar ainda mais o ciclismo de estrada no Estado e no Brasil. “Não há como precisar o número de praticantes dessa modalidade por aqui. Mas, apenas como exemplo, a margem leste da ciclovia do Rio Pinheiros contabiliza mais de 110 mil usuários por mês, segundo dados da concessionária responsável”, afirma Daniel Guth, diretor executivo da Associação Brasileira do Setor de Bicicletas, a Aliança Bike.
O que se sabe, entretanto, é que o número de praticantes do esporte tem aumentado, seguindo tendência geral de maior procura pela bicicleta nos últimos anos, acentuada pela pandemia.
Esse é o principal resultado de um estudo recém-divulgado pela Aliança Bike, batizado Ciclismo de Estrada na Grande São Paulo, e elaborado em parceria com entidades como a Federação Paulista de Ciclismo, a Federação Paulista de Triathlon, entre outras, feito para entender o perfil dos ciclistas e as dificuldades da prática na região. “A pesquisa inédita que lançamos aponta com muita clareza a entrada de novos praticantes ao ciclismo de estrada: entre os mais de 3 mil respondentes, 11,5% afirmaram que começaram a praticar o ciclismo de estrada há menos de um ano. Se considerarmos até cinco anos, chegamos a 49,4% dos ciclistas”, explica Guth.
Mesmo aquecido, o segmento esbarra em dificuldades para seu desenvolvimento, outro aspecto que aparece na pesquisa. A principal delas é a falta de locais próprios para o treino,
apontado por 60% dos respondentes. “Não temos espaços adequados, livres da convivência com os carros em alta velocidade ou com ciclistas mais lentos. O correto seria utilizar estradas em que a preferência é do ciclista”, explica Renata Falzoni, vereadora em São Paulo, jornalista, arquiteta e cicloativista que adotou a bicicleta como transporte há mais de 40 anos. De acordo com ela, um local tradicional era no campus da Cidade Universitária, na USP (https://www5.usp.br/), mas que proibiu esse tipo de treino no final de 2019. “Parte dos esportistas migrou para a Ciclovia do Rio Pinheiros, espaço compartilhado com outros ciclistas, o que impacta no treino desses atletas, que precisam rodar em pelotões sem ter que frear”, diz Falzoni.
Divulgado no mês de maio, o estudo “Ciclismo de Estrada na Grande São Paulo”, feito pela Aliança Bike em parceria com federações esportivas, contou com o total de 3.107 ciclistas, sendo que, destes, 2.650 responderam todo o questionário. O resultado reuniu dados que acabaram servindo de subsídio para elaboração de um manifesto, endereçado às prefeituras das cidades da Grande São Paulo, pedindo apoio para a prática do esporte. “Na nossa visão, um dos os aspectos mais importantes revelados é que, mesmo com inúmeras adversidades, o ciclismo é uma atividade com ciclistas praticantes relativamente longevos: 60% deles têm mais de 40 anos e quase 30% do total treinam há mais de dez anos”, diz Daniel Guth, diretor executivo da Aliança Bike. Além disso, Guth destaca o fato de o esporte estar em crescimento, ganhando adeptos nos últimos anos.
A pesquisa revelou o que se observa no ciclismo de maneira geral, com participação feminina inferior à masculina.
Dessa forma, a divisão de gênero fica em 81,7% de homens e 17,85% de mulheres.
Diferentemente do observado em pesquisas de perfil de pessoas que usam a bicicleta como meio de transporte, a presença de brancos é preponderante no ciclismo de estrada, representando 78% entre todos os respondentes. Já os negros (pretos e pardos) representam 15,15% e os amarelos (ou asiáticos) alcançam 3,4% do total da amostra.
O pico da pirâmide etária se dá entre os 40 e 44 anos de idade. Ciclistas acima de 40 anos representam pouco mais de 60% de toda a amostra, sendo que a média dos praticantes está em 42 anos.
A pesquisa também consolidou as dificuldades que os ciclistas encontram no cotidiano, além do que gostariam de ter em seus treinos: locais específicos para a modalidade, seguidos de segurança e mais respeito por parte dos motoristas. “Essas informações são estratégicas e muito relevantes ao planejamento de políticas públicas. Também sabemos, agora, quais são os dias e horários preferidos, o que ajuda muito no desenho de uma Área de Proteção ao Ciclismo de Competição (APCC)”, diz Guth.De acordo com o executivo da Aliança Bike, a criação de uma APCC seria uma solução para grande parte dos desafios enfrentados por esse público.
No final de maio, foi realizada uma consulta pública para que os ciclistas pudessem sugerir áreas para essa finalidade. “Recebemos mais de 1.500 indicações de locais. Para o funcionamento de uma APCC, o município define uma rua ou avenida que ficará livre de carros por um determinado período, com bloqueio de um trecho completo da via ou, pelo menos, a segregação de faixas de rolamento”, explica.
De acordo com Renata Falzoni, a implementação de uma APCC em São Paulo depende de uma decisão favorável da Prefeitura. Ela comenta que há experiências muito positivas no País, especificamente no Estado do Rio de Janeiro: a primeira APCC do Brasil é a do Aterro do Flamengo, criada há sete anos. “Hoje, ela funciona às terças e quintas-feiras, das 4h às 5h30”, explica. Depois dessa, segundo ela, foram inauguradas outras APCCs na Barra da Tijuca, Reserva na Praia do Recreio e, mais recentemente, em dezembro de 2019, uma na região do Porto Maravilha, no centro da cidade, que funciona aos domingos. “Esta última é icônica, pois está sendo um gatilho para o reaquecimento dos negócios de restaurantes e hotelaria na região”, explica Falzoni.
A pesquisa, realizada pela Aliança Bike, envolveu mais de 3 mil ciclistas
Desde 29 de maio, pessoas que pedalam na Estrada dos Romeiros, famoso percurso de treinamento de ciclistas no Brasil, contam com um ponto de apoio à altura da cidade de Cabreúva, interior do Estado de São Paulo. Idealizada pela Seguros Sura e o Clube Santuu, a iniciativa oferece assistência gratuita, com mecânicos especializados em pequenos reparos rápidos na bicicleta, como calibragem de pneu, troca de câmara, regulagem simples de câmbio e freio, servindo também como um espaço dedicado para que os ciclistas possam se hidratar e descansar.
“Nossa ideia é oferecer também outros serviços dedicados à segurança e ao bem-estar dos ciclistas, como um espaço para massagem e relaxamento, entre outros serviços que possam proporcionar mais experiências aos ciclistas durante as paradas nos pontos de apoio de cada região”, diz Rodrigo Fujita, gerente de mobilidade da Seguros Sura. A empresa conta, no total, com nove pontos de apoio no País, localizados em São Paulo, Niterói (RJ) e Brasília (DF).
“Pedalo há dez anos, comecei na cidade com um grupo de pedal noturno e, aos poucos, senti necessidade de intensificar o treino. Os locais que mais uso hoje são as Rodovias Anhanguera e Bandeirantes, além da Estrada dos Romeiros. Acho mais seguro pedalar em rodovia do que em ciclovia ruim, na qual podemos nos acidentar. Mas, sem dúvida, a criação de uma Área de Proteção aos Ciclistas de Competição (APCC) seria muito positiva. A Cidade Universitária, na USP, é perfeita porque é um local onde conseguimos desenvolver boa velocidade, sem paradas e com tráfego tranquilo de veículos. Eles deveriam rever a restrição de uso, pois hoje só podemos pedalar lá entre 5h e 6h30 e acho que até o Velódromo poderia ser usado para esta finalidade. Sinto falta é de uma conscientização maior dos próprios motoristas, que se comportam como se a estrada fosse só deles. A sinalização de trânsito poderia ajudar nesse sentido, alertando que há ciclistas e pedindo para diminuírem a velocidade em alguns pontos como travessias.” Diego Macena Nascimento, 30 anos, executivo de TI