SÃO PAULO – A pesquisa Viver em São Paulo: Pedestre aponta que 74% dos moradores da cidade já caíram na calçada ou presenciaram uma situação desse tipo. Ela também indica que 68% da população considera a manutenção de calçada como a medida mais urgente que a Prefeitura precisa tomar para garantir o “bem-estar dos pedestres“.
O levantamento foi encomendado pela Rede Nossa São Paulo, com margem de erro de três pontos percentuais. Ao todo, 800 pessoas com 16 anos ou mais foram entrevistadas em todas as regiões da capital entre 3 e 23 de abril.
Além das quedas, 60% dos entrevistados apontaram terem sido ou visto alguém ser assaltado ou sofrido algum tipo de agressão física em via pública. Já 53% disseram terem sido atropelados ou visto alguém ser atropelado, mesma porcentagem de pessoas que afirmaram terem sofrido (ou visto alguém sofrer) ameaças de um motorista.
A questão ainda aponta que 47% dos paulistanos já sofreram (ou viram alguém sofrer) assédio na rua, enquanto 38% tiveram (ou foram testemunhas de) quedas na faixa de pedestres e 25% caíram em bueiros.
Sobre as ações mais urgentes para o bem-estar do pedestre, a primeiro colocada foi manutenção de calçadas (68%), seguida de manutenção de faixa de pedestres (44%), aumento do tempo de travessia no semáforo (44%) e melhorias na iluminação (44%). A manutenção da calçada foi a mais citada em todas as regiões, especialmente no centro (86%).
O Ibope também fez a seguinte pergunta: “Considerando seus deslocamentos a pé de modo geral, quais são os aspectos que mais te incomodam?”. Do total, 68% respondeu buracos nas calçadas, seguido de irregularidades calçadas (53%), calçada estreita (47%), iluminação insuficiente (39%), sacos de lixo na calçada (38%), obstáculos na calçada (35%), fiação na calçada (31%), alta velocidade dos carros (28%), falta de acessibilidade (21%), área sem sombra/local para sentar (17%) e quantidade de saídas de garagens (8%).
Além disso, a pesquisa também questionou os lugares que os paulistanos mais costumam ir a pé. O primeiro local foi padaria (64%), em sequência veio mercado/feira (59%), farmácia (54%) e ponto de ônibus (53%), sendo que o último colocado foram os espaços culturais (8%).
A Prefeitura de São Paulo publicou em julho o decreto do Plano Emergencial de Calçadas para locais com “grande circulação de pedestres”, tanto públicos quanto privados, como terminais de ônibus e áreas de “grande comércio”. O projeto prevê investimento de R$ 400 milhões até o fim de 2020 para atender 1,5 milhão de metros quadrados de área.
Segundo a gestão Bruno Covas (PSDB), o processo licitatório está em fase de análise de propostas e habilitação das empresas participantes. Em nota, o Município ressalta que o proprietário que não mantiver a calçada de forma adequada (sem desníveis e com faixa livre para circulação de pedestres, dentre outros aspectos) pode ser multado em R$ 416,15 por metro linear. “Em toda a cidade de São Paulo há cerca de 34 mil quilômetros de calçadas e cerca de 17% são de responsabilidade da Prefeitura de São Paulo.”
Para a arquiteta Meli Malatesta, especializada em mobilidade a pé, a pesquisa traz dados que expõem a falta de investimento na infraestrutura utilizada pelos pedestres. “A própria legislação da calçada é a pior parceria público-privada que existe. A Prefeitura é encarregada de normatizar e fiscalizar, o proprietário é responsável por construir e fazer a manutenção. Só que ninguém faz a sua parte, e nossas calçadas são o que são.”
A pesquisadora ressalta que quase um terço dos deslocamentos na capital são feitos a pé (31,8% segundo a Pesquisa Origem Destino, de 2017, que contabiliza trajetos para trabalho/escola ou com distância superior a 500 metros), mas que não há estatísticas sobre acidentes na calçada. “Mais de 70% caíram ou virem alguém cair (segundo a pesquisa Ibope), isso é uma coisa extremamente séria”, diz.
Para ela, se houvesse melhor manutenção das calçadas, pessoas que hoje utilizam carro ou transporte público para trajetos curtos poderiam optar por se deslocar a pé. “É um modo de transporte com uma infraestrutura menos onerosa, que é barato se comparar com as demais formas de deslocamento.”
O coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo, Jorge Abrahão, aponta que as discussões sobre mobilidade a pé ainda estão se consolidando em relação a outros modais. O resultado da pesquisa divulgada nesta terça será levado para à gestão municipal para discutir propostas de como mudar esse cenário. “Ele é esquecido, tem pouca mobilização em relação ao tema embora seja um meio muito utilizado. Caminhar talvez seja o mais democrático. porque pega a todos nós.”
Embora a calçada seja o principal alvo das reclamações no que tange o bem-estar do pedestre, Abrahão ressalta que são precisas melhorias nas vias públicas como um todo. “O grande desafio não é só a calçada, é criar um ambiente favorável, amigável para que as pessoas consigam se sentir seguras, confortáveis para usar esse modal. Para isso, precisa de calçada, de iluminação, de faixas, de um ambiente agradável, em que entra também a questão do verde.”
O assistente social Jânio Freire, de 43 anos, sofreu um acidente em uma calçada da região central há cerca de três meses. “Tem muito negócio sem tampa (na calçada), machuquei o pé e tinha um ferro dentro. Acabei me cortando e tive até de tomar vacina”, conta. “Precisa melhorar. As calçadas melhoram a cidade, dão sofisticação, mas estão obscuras, feias.”
Já o vendedor Wellington Cambrizzi, de 35 anos, relata que é preciso prestar atenção no percurso para andar pela cidade. “Tem muita calçada com entulho, muito buraco. Eu mesmo já caí, tropecei na calçada. Aqui, no centro, tem muita sujeira, muito lixo”, diz. “Você não consegue andar em linha reta, sempre tem que desviar de alguma coisa, é muito complicado.”
A assistente administrativa Jane Cândido, de 48 anos, considera que a situação piora nos bairros mais afastados das áreas centrais. “Onde moro, perto de São Mateus (zona leste), a calçada é ruinzinha. Quase não tem calçada para andar, tem desnível, buraco, muita sujeira”, aponta. “A pessoa que administra a cidade deveria dar prioridade aos bairros. Quanto mais longe pior as coisas vão ficando.”