Habitação e mobilidade conflitam no Projeto de Lei do Plano Diretor Estratégico (PDE) da cidade de São Paulo. Os pontos mais críticos são habitações de interesse social, verticalização excessiva, compensação de construtoras e eixos do transporte público.
De acordo com o Mapa da Desigualdade de 2022, o deslocamento de casa para o trabalho consome mais de 1 hora nos extremos da cidade. Por sua vez, nos bairros do centro expandido, as viagens podem durar menos de meia hora. O estudo é da Rede Nossa São Paulo.
Assim, mobilidade e habitação se relacionam diretamente. Portanto, os temas relacionados à moradia afetam diretamente o transporte. Assim, segundo a coordenadora do Instituto Pólis, Margareth Uemura, à Agência Brasil, alguns pontos do plano são críticos.
“Quando o PDE de 2014 deu como diretriz aproximar o morador dos meios de transporte, era justamente para melhorar a mobilidade urbana e diminuir a quantidade de carros circulando pela cidade, já que quem mora perto de transporte, como o metrô, não utiliza o carro para o deslocamento principal. Com essa verticalização excessiva, piora o trânsito, porque se o morador que está nesse imóvel não utiliza o transporte coletivo, e sim o carro, ele sobrecarrega o sistema viário e promove o trânsito onde não é necessário”, avalia.
Além disso, a arquiteta e urbanista Paula Santoro reforça a importância da habitação para a mobilidade. “A produção de moradia para as faixas mais altas tira o espaço de moradia das classes médias e baixas que vão morar mais longe, o que piora a nossa situação de mobilidade. Sem falar no fato de que a gente segue fazendo urbanismo para os carros, em uma cidade onde a gente tem um drama, uma mobilidade imóvel. A gente quase não consegue se mover nessa cidade”, disse.
Por sua vez, o urbanista e conselheiro do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Fernando Túlio, relembra que o PDE original não ampliou os corredores de ônibus na maior capital do país. “O Plano Diretor de 2014 previa a construção de 150 quilômetros de corredores de ônibus até 2016, mas menos de 5% deles foram construídos até hoje. Isso impacta fortemente o dia a dia da população. São horas a mais no trânsito, mais poluição e mais acidentes”.
Outro ponto do PDE que é alvo de críticas de especialistas são as zonas de concessão. Isso porque o relator do texto, o vereador Rodrigo Goulart, disse que esses pontos sairiam do projeto.
Em suma, as zonas de concessão consistem em territórios públicos que passaram para a iniciativa privada. Por exemplo, as rodoviárias. Assim, na versão aprovada na primeira votação, poderiam ter regras específicas para construções diferentes da vizinhança.
“Quando se cria uma zona de concessão, o Poder Público abre mão de controlar o uso e a ocupação daquele espaço, o que é o contrário do que a Constituição determina, que municípios devem regrar sobre o uso e aplicação do solo. Espero que [as zonas de concessão] não sejam nem permitidas”, considera a coordenadora do Instituto Pólis, Margareth Uemura.
Em nota enviada à Agência Brasil, a Câmara de Vereadores de São Paulo se posicionou. Informou que, desde a chegada do projeto de lei da prefeitura, deu ampla transparência ao processo de revisão. “Foi criado um site exclusivo e feitas mais de 50 audiências públicas para ouvir a população. O texto substitutivo, quando foi apresentado, também foi lido em plenário, publicado e está sendo debatido em outra série de audiências. Portanto, não há como negar que a Câmara está sendo extremamente transparente. Fato que corroborou com a decisão da Justiça de não paralisar o andamento dos trabalhos”, diz a nota.
Quanto às críticas de urbanistas e entidades civis de que o texto atende aos interesses das corporações imobiliárias, a Câmara disse que ouviu vários setores. “A Câmara e a Comissão de Política Urbana entendem que o setor imobiliário é parte da sociedade e, portanto, também pode ser ouvido no processo de revisão. Inúmeras colaborações ao texto substitutivo vieram das audiências públicas e da sociedade, como a expansão do Parque Burle Marx, demanda popular de cerca de dez anos”.
Além disso, diz a nota, “novidades como o Plano Municipal de Praças, a criação de dois Territórios de Interesse Cultural e da Paisagem, para preservação do bairro do Bexiga e também das nossas represas, e os incentivos para a Habitação de Interesse Social para famílias de baixa renda demonstram as muitas vozes que foram ouvidas durante o processo”.