Os caminhões respondem pela maior parte do transporte de mercadorias do Brasil, um segmento que move grande parte da economia nacional. As mercadorias viajam pelo Brasil através de mais de 1,7 milhão de quilômetros de estradas e rodovias, de acordo com dados recentes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Para ter uma ideia da magnitude desse segmento, 99% dos produtos do Brasil passam por um caminhão em algum momento da cadeia de produção e consumo, de acordo com A Voz Delas, pesquisa da Mercedes-Benz Caminhões feita em 2019.
São mais de 3 milhões de caminhões e 4,5 milhões de motoristas cadastrados na categoria, mas apenas 6,5% desse total é composto por mulheres. No País, são 182.376 habilitadas para dirigir caminhão, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), que enfrentam, diariamente, o assédio e o machismo nas estradas. A motorista de Santa Catarina Joelma dos Santos, 46 anos, conta que a situação do preconceito já colocou em risco sua vida. “Algum tempo atrás, um motorista tentou me jogar para fora da estrada simplesmente porque sou mulher. Ele se sentiu ofendido e achou que podia fazer isso comigo. Já perdi empregos porque o chefe da frota não gostava de trabalhar com o público feminino. Se reclamamos ou falamos algo, já ouvimos:‘Tinha que ser mulher, sabia que não iria dar certo’.
As preocupações delas são as mais diversas. “Muitas vezes, evitei me maquiar ou andar bem vestida nas viagens com meu marido para não ser confundida com prostituta, tanto nos postos de gasolina quanto nas empresas. Ter que provar que sou esposa passou a ser rotineiro, principalmente, quando viajamos sem os filhos”, diz Mary Fontoura, 32 anos, secretária escolar e “cristal” – nome dado às mulheres dos caminhoneiros – há 12 anos.
Ao escolherem esse estilo de vida para poderem ficar ao lado de seus companheiros, passaram a enfrentar as dificuldades da vida na estrada. “Algumas mulheres não se posicionam e se privam de ficar com seus maridos por medo; essa é uma questão muito delicada. Desde quando me casei, nunca abri mão de ficar com meu marido. Já me impus muito, virei motivo de piada e fui muito criticada”, diz Mara Campos Pereira, 44 anos e que há 21 anos viaja como “cristal”.
Ela conta que o preconceito melhorou um pouco, mas ainda é difícil quebrar essa barreira. “Temos que nos resguardar até com nossas roupas. Sempre visto minha filha, que, às vezes, viaja com a gente, com calça e roupas mais largas. É a realidade. E eu tento não abaixar a cabeça e encarar com educação e respeito”, completa.
A realidade das motoristas e de acompanhantes é bem diferente da dos homens. Para elas, há dificuldade como falta de estrutura em pontos de parada – seja pela inexistência de uma área exclusiva, seja pela precariedade em que se encontram –, insegurança física ou preconceito e até saudades da família. O tratamento que recebem das empresas também merece registro: enquanto o motorista fica esperando pelas operações de carga e descarga de seus caminhões, as acompanhantes são obrigadas a esperar do lado de fora, sem nenhum suporte.
Mara conta que já passou por situações difíceis com sua filha pequena, nos pontos de parada. “Fiquei, muitas vezes, na rua, sem ter onde comprar algo, sem comida e sem água, debaixo de chuva, frio e calor intenso, até terminar de descarregar o caminhão, altas horas da noite”, relata. A solução que muitas encontram é o apoio mútuo. “As empresas, simplesmente, proíbem acompanhantes e filhos de entrarem. Ficamos juntas em um posto de combustível ou restaurante, mas sempre há risco. Não custa nada para uma empresa ter uma área coberta, com vestiário e banheiro limpo”, afirma. Falta o básico nas paradas. “Uma minoria desses locais tem banheiro feminino, mas não há, por exemplo, papel higiênico, tranca nas portas ou, em alguns, nem mesmo porta”, finaliza Joelma dos Santos.
No Brasil, há 4,5 milhões de motoristas habilitados para dirigir caminhão.
182.376 são mulheres, o que representa apenas 6,5% da categoria
Fonte: Denatran