SUM tem diferentes interpretações, uma defende a tarifa zero e outra busca encontrar meios alternativos de custear um sistema único de transporte. Foto: Carlos/Adobe Stock
Em entrevista ao Mobilidade Estadão, o coordenador-geral de Regulação da Mobilidade Urbana dos Ministérios da Cidade, Antonio Espósito, contou o que é o SUM, qual é a situação atual, como o sistema pode ser financiado e uma forma para população opinar.
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“A proposta do SUM começou, na verdade, em 2017, em um congresso da ANTP, que é a Associação Nacional dos Transportes Públicos”, conta Espósito. Desde então, diversas entidades no Brasil se voltaram ao tema e promovem debates e estudos para implementar o Sistema Único de Mobilidade no Brasil.
O SUM retoma o SUS, o Sistema Único de Saúde, reconhecido e celebrado em diversas regiões do mundo como uma política pública de referência. Portanto, a ideia é padronizar o sistema de mobilidade nacionalmente, com apoio do governo feral, aliado aos Estados e municípios.
“O SUS já tem muito tempo, de história e é um sistema muito robusto, para mobilidade teriam que ser feitas adaptações para um setor que é muito diferente do da saúde”, ressalta o coordenador-geral. Para isso, ele e o Ministério das Cidades estão promovendo debates, palestras e encontros em todo o País. Isso tudo é para desenvolver o debate locamente, nas cidades, e regionalmente, nos Estados. Enfim, em outubro de 2025, haverá a Conferência Nacional das Cidades em Brasília.
A mobilização popular, que deu origem a proposta do SUM, deve se unir as propostas que já circulam no poder Legislativo.
“Você tem que melhorar a parte de dados, de sistemas, de governança, de capacidades institucionais e várias outras frentes. Então, é um processo longo. Não é rápido instituir um sistema único”, avalia Espósito.
Desde a retomada o Conselho das Cidades em 2023, parado desde 2017, o SUM voltou ao debate. Apesar de diversas entidades e representantes do poder público defenderem o início da implementação do sistema, há diferentes interpretações sobre como isso pode se dar.
Espósito diz que as diferenças são pontuais e que servem para enriquecer o debate. Por exemplo, na primeira reunião do conselho, os presentes aprovaram uma moção favorável à implementação do SUM.
Em um seminário realizado em Brasília no início deste ano, duas entidades defenderam suas perspectivas, o Instituto do Movimento de Defesa do Transporte (MDT) e a Coalização Triplo Zero. Conforme o coordenador-geral, a proposta da coalização vê a tarifa zero como um elementos indispensável do SUM.
“Enquanto a proposta do MDB, ela se preocupa mais em estruturar o sistema, ah, criar outras fontes de recurso que seu autor, mas não obrigatoriamente com a implementação da tarifa zero”, explica Espósito.
Ele ainda ressalta que o debate do financiamento é central na pauta do SUM, pois atualmente a divisão das competências federativas relacionadas à mobilidade urbana é mais focada no âmbito municipal. Por exemplo, a política tarifária é uma decisão exclusiva do município, a União não tem influência direta.
O coordenador-geral de Regulação da Mobilidade Urbana dos Ministérios da Cidade acredita que a emenda constitucional 90, que incluiu o transporte como direito social constitucional, cria um ambiente jurídico favorável a tramitação de outras duas propostas. Portanto, com o direito ao transporte no mesmo nível de importância de saúde, educação e trabalho, o Estado precisa garantir ao cidadão a mobilidade.
Para isso, tramitam em diferentes velocidades o marco legal da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PL 3278/2021) e a PEC 25/2023. Para Espósito, o caminho que o Ministério das Cidades vê para acelerar a implementação e as discussões sobre o SUM é o PL 3278. Isso porque já foi aprovada no Senado e agora aguarda votação nas comissões da Câmara de Deputados.
A autoria do projeto é do senador Antonio Anastasia (PSD-MG), que visa atualizar o marco legal vigente. De acordo com o representante do Ministério das Cidades, o PL já circulava desde 2021, mas tinha um texto mais fraco. Em conversa com o relator, senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), o ministério convenceu o parlamentar a incluir um substitutivo.
Espósito explica que esse novo texto o Fórum Consultivo de Mobilidade Urbana construiu o novo texto, reunindo as principais entidades do setor, desde os fabricantes de veículos, operadores, municípios, Frente Nacional dos Prefeitos e o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
“A gente entende que ele é um caminho, é um começo do caminho para chegar lá na frente no SUM, que é uma proposta muito mais robusta. Mas o marco legal já começa a subir algumas lacunas, [em comparação com a] que existem na legislação”, explica ele.
A expectativa dele agora é que os deputados coloquem o projeto em pauta para ele ter fôlego para chegar com alguma atualização em outubro, quando acontece a Conferência Nacional das Cidades. Entretanto, o texto segue parado na Comissão de Desenvolvimento Urbano, sem um relator designado.
“A gente tem uma boa perspectiva de aprovar ainda esse ano”, deseja o coordenador-geral. Enfim, em relação à PEC, Espósito acredita que terá uma tramitação mais longa, pois se trata de uma emenda ao texto constitucional.
Além disso, ele pede que a população acesse a página destinada à votação popular sobre a PEC.
É evidente que a instituição de um Sistema Único de Mobilidade atraia o interesse dos prefeitos. Isso ocorre, pois a responsabilidade maior da maioria dos transportes está no município, que arca financeiramente com subsídios e obras de infraestrutura.
Portanto, o Ministério das Cidades afirma que a aprovação do novo marco legal vai trazer mais segurança jurídica. “Aprovando essa lei, a gente dá mais segurança jurídica e mais respaldo na lei federal para que o prefeito, o secretário municipal, possa modernizar suas leis, seus contratos. Hoje, existem muitas lacunas e muita margem para a interpretação por deficiência da legislação, que acabam deixando os gestores municipais inseguros, ou então travando e punindo alguma coisa, causando o risco deles serem responsabilizados futuramente por não estar completamente respaldado na lei”, explica Espósito.
Ele ainda ressalta que esse projeto é essencial para fazer a transição energética no País, com a implementação de ônibus elétricos. “É um projeto suprapartidário, inter federativo, vai ser bom para o governo federal, estadual, municipal”, defende o coordenador.
O marco legal do transporte público coletivo urbano prevê uma rede única, integrada e intermodal adequada ao desenvolvimento urbano sustentável. Para isso, há necessidade do aperfeiçoamento da gestão pública e maior transparência.
Portanto, o marco deve garantir a conectividade e integração dos transportes de modo a facilitar o uso de modais coletivos e ativos. Para isso, o conjunto dos governos deve determinar novas fontes e mecanismos de financiamento.
Esse marco tem o objetivo de promover inclusão social, redução das emissões de gases de efeito estufa e fomento ao desenvolvimento da indústria nacional de transporte público. Enfim, o texto prevê a integração física, tarifária e operacional dos diferentes modais, nas cidades, regiões e áreas metropolitanas.
Conforme o marco legal em tramitação, a receita seria oriunda dos poderes federais, estaduais, distritais e municipais, com receita direta e indireta. Ou seja, prevê a criação de mecanismos de financiamento como subsídios cruzados de outro setores.
Já a PEC 25, de autoria da então deputada federal Luiza Erundina (Psol-SP), oferece diretrizes para o SUM instituir uma nova política de custeio do transpote público coletivo urbano. No texto, a deputada estabelece que o acesso a um sistema único deve ser universal, gratuito, descentralizado, planejado em conjunto com a população e buscando a sustentabilidade.
Para isso, a PEC 25 acrescenta um capítulo à Constituição Federal em que coloca a obrigação da União, Estados e Municípios como responsáveis por arcar os custos do SUM. Isso seria definido por meio de um percentual do produto da arrecadação dos impostos. Além disso, o texto ainda prevê o uso de outros recursos, como a receita de estacionamento públicos.
Somado a isso, a PEC defende o repasse dos custos de um transporte coletivo para todos. Conforme o texto, a justificativa se dá quando a melhora do transporte se reflete no trânsito, meio ambiente e mobilidade. Portanto, proprietários de veículos próprios e empregadores devem entrar na conta.
“Hoje, com o Vale Transporte é descontado um valor de 6% do salário do empregado. Então, na verdade, o vale-transporte, compensa [para o empregado] até um valor de salário, talvez R$ 2.500, R$ 2.000”, diz o coordenador. “Para quem recebe mais do que isso, já não compensa pedir o vale-transporte.”
Por isso, a PEC quer mudar essa regra de forma a fazer com que as empresas contribuam com a mobilidade, proporcionalmente ao número de empregados.
De acordo com Espósito, essa proposta se baseia no sistema utilizado na França.
“Os franceses fizeram isso, porque, na verdade, mesmo quem não usa o transporte coletivo acaba se beneficiando dele”, defende Espósito. Ele explica que as principais externalidades positivas, sentidas por todos, são a ampliação do espaço para os automóveis e a redução da poluição.
“Essa lógica enxerga a mobilidade como uma política que é de todos, mesmo de quem não usa”, diz ele. Entretanto, o coordenador ressalta que, para isso ocorrer, precisa de um alinhamento entre as áreas econômicas em todas as esferas.
“Porque a gente tem recursos limitados e tem outras prioridades mais importantes no Brasil, e você já tem uma carga tributária relativamente elevada e tem dificuldade de criar nossos tributos”, explica ele.
Portanto, Espósito defende a criatividade na hora de aplicar e captar recursos. Isso incluir direcionar melhor o que já existem. “Hoje, por exemplo, a gente, o Brasil, né, ele investe muito dinheiro em obras de pavimentação, inclusive com emendas parlamentares. Uma parte desse recurso poderia ir para o transporte coletivo, não só para pavimentação”, afirma.
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