Algumas pessoas e classes profissionais têm direito ao uso gratuito do transporte público, mas cabe aos municípios, responsáveis por regular o serviço, conceder ou não o benefício. De maneira geral, idosos, crianças até 6 anos, estudantes dentro de alguns critérios, pessoas com deficiência, além de policiais e carteiros podem desfrutar da gratuidade na cidade de São Paulo. Mas, em outros lugares, as normas podem ser diferentes. O tema gera confusão porque, embora existam leis federais que assegurem o acesso ao transporte – como o Artigo 6º da Constituição, revisado em 2015, que trata o transporte como um direito social, o Estatuto do Idoso, entre outras –, na prática, o que vale é o que cada município definir. E não há regra para isso.
De acordo com Rafael Calabria, coordenador de mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), não há lei ou órgão que centralize as decisões sobre essas gratuidades. “As pessoas ficam perdidas quando precisam buscar e defender seus benefícios. A falta de uma estrutura única é reflexo da maneira complexa como o próprio sistema está estruturado”, afirma.
Na cidade de São Paulo, por exemplo, o transporte público é subsidiado, ou seja, precisa de financiamento público para operar, além do valor que é arrecado pelas tarifas. Por isso, grupos que usufruem das isenções são constantes alvos de ameaças de terem seu benefício retirado devido a essa conta que não fecha, principalmente com a crise que o setor enfrenta no pós-pandemia.
Um exemplo é o que ocorreu, a partir do início deste ano, com os idosos. Hoje, na cidade de São Paulo, apenas pessoas a partir de 65 anos são isentas das tarifas, mudando uma lei estadual, de 2013, que concedeu gratuidade a partir dos 60 anos. Em dezembro de 2020, o governador do Estado de São Paulo, João Doria (PSDB), em parceria com o então prefeito Bruno Covas (PSDB), alteraram a faixa etária, causando muita polêmica.
Segundo o coordenador do Idec, a medida prejudica milhares de pessoas entre 60 e 64 anos que usavam o transporte todos os dias, gratuitamente, muitas delas para trabalhar. “Sabemos que o setor tem problemas, mas não é cortando direitos que eles serão resolvidos”, diz. O Idec recebeu muitas reclamações e entrou em uma ação conjunta pedindo a inconstitucionalidade da lei. “Também estamos tentando ingressar em outra ação municipal. Acreditamos que temos chance de ganhar, pois já vimos casos semelhantes”, explica.
Como cabe ao próprio município regular seu transporte público; na cidade de São Paulo, quem fornece o cartão que dá direito à gratuidade, de porte obrigatório para alguns grupos, é a São Paulo Transportes (SPTrans). Dessa forma, listas de documentos necessários e dúvidas dos usuários devem ser esclarecidas pela empresa.
Com a pandemia, os contatos passaram a ser feitos de forma online, bem como o processo para obter o benefício. Preparamos, a seguir, um guia com todos os públicos que têm direito ao transporte gratuito e, quando necessário, o que fazer para conseguir o chamado Bilhete Único Especial.
Pessoas com deficiência física, visual, auditiva ou mental (intelectual), temporária ou permanente, têm direito também a viajar sem pagar tarifa, mas precisam do Bilhete Único Especial. Por causa da pandemia, os postos estão fechados, mas o atendimento segue, normalmente, online. De maneira geral, é necessário preencher um cadastro, enviar um relatório médico assinado pelo profissional e encaminhar documentos pessoais cuja lista está disponível na página da SPTrans, que é para onde toda a documentação também deve ser encaminhada.
Crianças menores de 6 anos de idade não pagam a tarifa, mas precisam estar acompanhados de um responsável para poder embarcar no transporte público. Nesse caso, não é necessário apresentar o bilhete especial.
Profissionais em serviço Algumas categorias profissionais têm direito à gratuidade durante o exercício da função: policiais militares e guardas civis, desde que estejam fardados, além dos carteiros, que precisam estar uniformizados. Não é necessário ter o Bilhete Único Especial, mas é preciso apresentar seu cartão funcional no embarque.
Idosos a partir de 65 anos Como citado na página anterior, atualmente, a cidade de São Paulo isenta de cobrança no transporte público apenas pessoas a partir de 65 anos, o que passou a valer, a partir deste ano, após alteração da Lei Municipal 17.542/2020. Antes, o benefício era concedido a partir dos 60 anos.
A nova regra tem sido questionada por meio de diversas ações públicas – como a do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos, a do Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas, além da do próprio Idec, entre outras. Com novas decisões da Justiça, o assunto sempre retorna: a última foi em 7 de maio, quando a Justiça de São Paulo restabeleceu a gratuidade a partir dos 60 anos. Mas, na prática, nada muda, pois a volta da gratuidade para esse público não é imediata, e ainda cabe recurso do governo.
“A justificativa para o corte seria a economia com idosos pagando pela tarifa, mas isso não se comprova: sabemos que, ao retirar a gratuidade, as pessoas deixam de usar o sistema. E o público que utiliza o benefício é o que mais precisa dele, o que faz com que a medida seja socialmente injusta”, explica Rafael Calabria, coordenador de mobilidade urbana do Idec. Outro fator apontado pela prefeitura para alterar a faixa etária é o aumento da expectativa de vida das pessoas, um fenômeno mundial. “Sabemos que esse é um dado concreto, mas é importante reforçar que, em um terço dos municípios da capital, as pessoas não chegam aos 60 anos. Mais uma vez, a desigualdade deve ser observada”, diz. Um aspecto muito importante é que as pessoas a partir dos 65 anos não precisam ter o Bilhete Único Especial Idoso para embarcar nos ônibus municipais
, basta apresentar um documento pessoal, com foto, que comprove a idade. “Embarcando dessa forma, o idoso não poderá ir para a parte traseira do ônibus. Mas, se a pessoa não se incomodar de ficar na frente do veículo e descer pela porta dianteira, o Estatuto do Idoso, de 2003, garante o embarque dessa forma”, diz. Se fizerem questão do cartão, que permite passar pela catraca e desembarcar pela porta traseira, é preciso solicitar pelo site da SP Trans ou enviar os documentos pelos Correios (Caixa Postal 77075, CEP 01014-970). Veja a relação completa dos documentos no site https://sptrans.com.br/idosos.
Estudantes Têm direito à gratuidade os alunos que residem a uma distância de pelo menos 1 quilômetros da escola que frequentam e desde que exista ligação por transporte público coletivo entre esses dois pontos. Na pandemia, a SPTrans adequou os critérios por causa do comparecimento não obrigatório às escolas, de maneira que alguns cursos não precisam de comprovação de renda, enquanto outros precisam. A solicitação do Bilhete Único de Estudantes pode ser feita pelo site http://estudante.sptrans.com.br. A empresa reforça que as cotas mensais estão sendo disponibilizadas, exclusivamente, aos estudantes das unidades de ensino que confirmarem o retorno das aulas presenciais.
De maneira geral, alunos da rede pública dos ensinos fundamental e médio, além dos cursos técnicos profissionalizantes, têm gratuidade automática, sem necessidade de comprovação de renda para obter o bilhete. Alunos do ensino superior e de tecnólogos precisam comprovar renda de até 1,5 salário mínimo per capta familiar. Quem estuda na rede privada, no ensino superior (como beneficiários do Prouni, Fies, Bolsa Universidade e Cotas Sociais), não necessita comprovar renda, sendo a gratuidade automática. Precisa comprovar renda (até 1,5 salário mínimo per capta familiar) alunos de cursos técnicos e profissionalizantes.
Já ouviu falar da tarifa zero no transporte público para todos os usuários? A prática, com cases em vários países do mundo, já tem exemplos brasileiros em São Paulo e no Rio de Janeiro. Um deles vem de Vargem Grande Paulista, na região metropolitana paulista, que começou, no final de 2019, a operar a isenção da tarifa nos ônibus municipais. O programa recebe o nome de Tarifa Zero e é resultado de uma parceria entre o poder executivo municipal de Vargem Grande Paulista e a iniciativa privada.
Outro exemplo é Pirapora do Bom Jesus, a quilômetros de São Paulo, que começou a operar com a gratuidade, em 2 de janeiro do ano passado. O serviço, operado pela prefeitura, teve todos os ônibus cedidos pela iniciativa privada e recebeu o nome de Expresso Social Piraporano. O objetivo da medida é diminuir o custo de vida da população, aquecer o mercado de trabalho local e fomentar o comércio da região.
No Rio de Janeiro, a cidade de Volta Redonda opera, desde 2017, a chamada Tarifa Comercial Zero. Começou como um projeto piloto para estimular o uso do transporte público no centro, funcionando das 8h às 18h, nos dias úteis, e até as 14h, nos sábados. Hoje, são três veículos interligando os bairros da região central, todos elétricos, com carroceria Caio e chassi BYD, além de ar-condicionado, wi-fi e entradas USB para recarregar aparelhos.