A primeira vez que ouvi falar sobre investimentos foi quando eu tinha 16 anos. Uma professora pediu que eu desse uma olhada em um livro do Gustavo Cerbasi chamado Pais Inteligentes Enriquecem seus Filhos. Achei as lições do livro muito interessantes, mas o que essa experiência teve de cômica — para não dizer trágica — é que eu nunca tive meu pai biológico presente. Com uma risadinha de quem sempre aprendeu a usar o humor para lidar com os problemas da vida, olhava para a capa do livro e pensava: “Onde compra esse tal de pai inteligente? Eu vou querer dois pra viagem, moço”.
Essa foi a primeira, mas não a última, vez em que me deparei com lições de educação financeira que não se adequaram à minha realidade. Na verdade, posso dizer que, mesmo tendo mais de dez anos de experiência no assunto, poucas vezes me senti verdadeiramente contemplado pelas lições de educação financeira que vi em livros e na internet. E isso inclui os direcionamentos sobre começar a investir.
Por isso, esse texto — que estou escrevendo do fundo do coração — é uma tentativa de compartilhar com você alguns aprendizados sobre investimentos que eu gostaria de ter tido dez anos atrás. Com pequenos “conselhos de irmão”, tenho a esperança de te mostrar como entrar no mercado financeiro respeitando as características da sua realidade e do seu momento de vida.
Vamos começar!
Falar abertamente sobre sua vida financeira gera sentimentos ruins em você? Se sim, saiba que não está sozinho(a). Olhando para a realidade brasileira como um todo, bastaria dizer que metade da população vive com menos de R$500 por mês para justificar esse mal-estar. Porém, a baixa autoestima em relação a grana vai além da renda: quase todos os brasileiros sentem dificuldade em lidar com o próprio dinheiro e metade evita até mesmo pensar para não ficar triste.
Ainda assim, basta pesquisar 15 minutos na internet sobre educação financeira e investimentos e você perceberá que parece ser “simples e fácil” começar a investir. Nesse momento, recai sobre nossos ombros um misto de culpa e vergonha. Culpa por não estar fazendo isso ainda, ou por ainda ter desafios para poupar algum dinheiro. E vergonha de admitir que não sabemos o suficiente, e que nos matamos de trabalhar enquanto há pessoas por aí aparentemente ganhando rios de dinheiro por minuto.
Fica difícil não olhar a própria vida financeira com desdém depois disso. Olhamos o que os outros mostram e comparamos com o que passamos na pele. Uma comparação totalmente injusta. Como uma relação de proximidade e compaixão com nosso dinheiro vai se construir em um contexto assim?
Então, lembre-se: mesmo a pessoa que está te ensinando educação financeira tem problemas com dinheiro. Eu tenho. Esqueça a ideia de que aprender a organizar as finanças e investir é uma questão simples de matemática. A vida não é simples e nem exata.
Ter educação financeira não é simplesmente separar 10% da renda por mês e investir na bolsa de valores. Na maior parte do tempo, é sobre lidar com mudanças, como reagimos emocionalmente a elas e as consequências financeiras disso.
Você pode estar juntando dinheiro para dar entrada na sua casa própria e, de repente, precisar pagar um tratamento médico caro para a sua mãe. Pode ter estudado anos para uma determinada profissão e ter que ir para outra área devido a mudanças no mercado de trabalho. Ninguém está completamente imune a essas e outras turbulências da vida.
Portanto, meu primeiro conselho de irmão é este: não aceite receitas prontas sobre finanças que dispensem as características da sua realidade e do seu momento. Não tome diretamente para si aquilo que você está enxergando superficialmente em alguém.
Meu primeiro conselho de irmão é: não aceite receitas prontas sobre finanças que dispensem a sua realidade e o seu momento. Não tome para si o que você enxerga superficialmente em alguém
Logo acima, citei algumas das mudanças que ocorrem em nossa vida e que nos obrigam a ter “jogo de cintura”. Essa é a deixa perfeita para falar sobre um dos pontos mais importantes da educação financeira: a nossa reserva de emergências.
Em teoria, a reserva de emergências é uma quantidade de dinheiro que devemos ter guardado em algum lugar seguro e que possa ser resgatado rapidamente em caso de gastos inesperados.
É normal encontrar nos livros que você deve ter acumulado um valor entre 3 e 12 meses do seu custo de vida em forma de reserva, dependendo das condições da sua vida. Se você é jovem e/ou pode contar com uma rede de apoio (como os pais) em uma situação de crise, sua necessidade pessoal de reserva de emergências é menor. Agora, se o mais comum é você ser essa rede de apoio para outros (como quando temos filhos ou sustentamos nossos pais), passa a ser mais recomendado ter uma reserva maior.
Mas essa é a teoria. Vamos para a prática? Por exemplo, Maria Lúcia tem um custo de vida de R$ 2.500 para honrar os compromissos básicos da família e percebeu que deveria ter 6 meses de custo de vida para emergências. Isso equivale a R$ 15 mil.
O problema é que, com uma renda de R$ 2.500, Maria Lúcia só conseguiria poupar R$200 por mês na melhor das hipóteses. Ou seja, dando tudo certo, ela levaria mais de 6 anos para completar o valor da reserva. Surreal, não?
Na vida real e concreta que nós vivemos, a verdade é que conquistar uma reserva para emergências é um baita desafio. Até porque, sabemos que, mesmo que Maria Lúcia conseguisse poupar R$ 200 disciplinadamente todo mês, provavelmente ela vai precisar dessa reserva antes mesmo de completar o valor de R$ 15 mil. A vida é assim, né?
Então, o que fazer? Esquecer a reserva e começar a investir no mercado financeiro para tentar multiplicar os valores economizados? Não funciona assim. Caso aconteça algum problema e seu dinheiro esteja todo comprometido com investimentos, você vai acabar pedindo um empréstimo a alguém, o que vai sair muito mais caro. Isso sem contar o risco de perder esse dinheiro em investimentos mais arriscados.
Que tal lidar com emergências usando o cartão de crédito? Acaba sendo a realidade de milhões de brasileiros, mas também não é o ideal. Isso deixa a gente dependente demais de crédito e, no Brasil, uma decisão ruim já é suficiente para ficarmos “à perder de vista” comprometendo dinheiro do nosso futuro com juros para bancos.
Portanto, meu caro (ou minha cara) leitor(a), a saída continua a mesma: aos pouquinhos, vá juntando o que der para a sua reserva. Respeite o seu ritmo e foque em crescer no seu trabalho, que é onde há a verdadeira fonte de renda.
Investimentos são importantes para a vida financeira? Sim. Mas este é o meu segundo conselho de irmão: se você não tem uma renda que permita o mínimo fôlego e ainda não conquistou uma reserva de emergência que permita ter segurança em caso de crise, é nisso que você deve focar.
Este é o meu segundo conselho de irmão: se você não tem uma renda de fôlego e uma reserva de emergência que permita ter segurança em caso de crise, é nisso que você deve focar
Se você chegou até aqui e sentiu que é o seu momento de começar a investir no mercado financeiro, provavelmente é porque já tem uma reserva e, em caso de algum grande gasto inesperado, você não estará completamente vulnerável aos empréstimos com juros altos que vemos por aí. Nesse caso, quero oferecer três regrinhas de bolso, que gosto de ver como “mantras”, sabe? Por mais simples que elas possam parecer, vão te apoiar em uma melhor tomada de decisão nesse início (e talvez o último mantra te lembre da sua infância).
Mantra 1: O que aconteceu no passado não necessariamente acontecerá no futuro.
Nosso cérebro, frequentemente, precisa ser lembrado mesmo das coisas mais óbvias. Se pensarmos racionalmente, não é tão difícil concluir que o futuro é incerto, mas, mesmo assim, continuamos a basear nossas decisões de investimento com base no passado. “O Marcelo me disse que o fundo de investimento que ele aplicou o dinheiro dele foi muito bem no ano passado”, por exemplo, não é uma boa justificativa para você colocar seu dinheiro ali.
Mas, então… O que fazer? A resposta é… estudar. Eu sei, não é a resposta mais legal do mundo e, no fundo, o que seria mais gostosinho seria haver um baralho de tarô só para saber se um investimento irá bem ou mal. Porém, não temos essa opção, família. Com isso, o que resta é estudar sobre o tipo de investimento que está te chamando a atenção e investigar se ele realmente atende seus objetivos e necessidades.
Mantra 2: Você não escolhe o quanto vai ganhar, e sim o quanto aceita arriscar.
Todo investimento, sem exceção, tem algum risco. Ou seja, a possibilidade de perder dinheiro. Existem investimentos que esse risco se aproxima de zero? Claro. Porém, existem outros que vão te seduzir pela chance de um ganho explosivo. Cuidado com isso. Seria uma pena se você acabasse perdendo dinheiro logo no início e isso causasse traumas.
Então, leve para o coração: antes de decidir onde investir com base no que pode ganhar, escolha com base no que você estaria disposto a perder. Ou seja, se você não está disposto a perder nenhum centavo, provavelmente não vai, logo de cara, comprar ações na bolsa de valores, por exemplo.
Mantra 3: Você não é todo mundo.
Eu diria que esse mantra, que gosto de chamar de “mantra das mães”, está pelo texto inteiro, mas, especificamente no mundo dos investimentos, essa máxima continua.
Mil contarão que lucraram com bitcoin ao teu lado, outros dez mil falarão de algum investimento milagroso à tua direita, mas tu não serás atingido. Afinal, você não é todo mundo.
As pessoas não gostam de perder, e gostam menos ainda de admitir que perderam. Isso faz com que a gente saiba mais dos casos de sucesso do que dos casos de fracasso, e – consequentemente – ache que o sucesso é mais provável, quando nem sempre é.
Portanto, este é o meu último conselho de irmão: foque em você. Sua realidade, seus objetivos, o que você sabe, o que quer aprender e no seu trabalho… Tudo isso é valioso demais
Espero ter contribuído, de coração! Acredito em uma educação financeira mais humana e que abraça as individualidades. Que você tenha se sentido abraçado(a) e, a partir de hoje, dê passos mais assertivos em direção aos seus objetivos. 💙
Até a próxima!