“O Brasil é o país que paga mais impostos no mundo”, “O pobre é quem mais paga impostos nesse país”. Cresci ouvindo frases como essas, mas nunca entendi quais eram os impostos pagos no Brasil, afinal, quando criança eu nunca havia pagado nenhum boleto de imposto.
Naquela época, mal sabia eu que, na realidade, todo mundo paga imposto no Brasil, mesmo quem não tem nenhum tipo de renda. Isso porque existem os impostos indiretos, que estão embutidos em tudo o que compramos, como é o caso do imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS, e o imposto Sobre Produto Industrializado, o IPI.
Lembro com nostalgia que meses antes da páscoa, meu porquinho de moedas era dedicado exclusivamente à compra dos ovos de chocolate. Mas, hoje, percebo que pelo menos 39% do valor que juntei com as moedas foi parar nos cofres públicos.
Para se ter uma noção, em um ovo de chocolate que custa R$ 30,00, R$ 11,70 são tributos. Isso porque o chocolate é um produto industrializado e por isso, incidem sobre ele impostos como o IPI e ICMS. Além disso, produzir ovos de páscoa exige uma ampla cadeia produtiva, na qual incidem tributos como Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), que são embutidos no preço final do produto e repassados aos consumidores.
É super importante que todas as pessoas conheçam os tributos que são pagos, mas não te julgo se você não souber, afinal, entre os tributos federais, estaduais e municipais, existem mais de 80.
São tantos tributos que muitas vezes pagamos tudo no automático, sem nos questionarmos qual porcentagem da nossa renda está sendo destinada aos impostos, para que eles servem e, principalmente, para onde vai o dinheiro arrecadado.
Para onde vai o dinheiro que pagamos em impostos?
Antes de entender como é investido o dinheiro que pagamos com impostos, é importante saber que tributos e impostos são coisas diferentes. Apesar de todo imposto ser um tributo, nem todo tributo é um imposto. Confuso, né? Mas a gente te explica!
Os tributos são todas as arrecadações feitas pelo Estado para prestar os serviços essenciais para os cidadãos, como: educação, saúde, segurança, infraestrutura, entre outros. Por isso, além dos impostos, taxas e contribuições também são consideradas tributos.
Sabe aquele valor que pagamos pra tirar a segunda via da carteira de identidade? Ele é uma taxa, que é considerada um tributo e está previsto no Código Tributário Nacional.
Já as contribuições estão previstas na Constituição, com o objetivo de aumentar a seguridade social do brasileiro, auxiliando em questões relativas à saúde, educação e aposentadoria, por exemplo. Provavelmente você já deve ter ouvido falar na contribuição para o INSS, não é mesmo?
Por fim, os impostos são os mais populares, e representam a maior parte dos tributos do país. Eles vão desde os mais conhecidos como IPVA, IPTU e Imposto de Renda, até outros que pagamos sem perceber, como é o caso do ICMS e IPI, que podem ser encontrados nas letrinhas miúdas do cupom fiscal do supermercado .
Apesar de todas essas arrecadações serem fundamentais para que o governo possa oferecer os serviços públicos essenciais a toda população, existe uma grande diferença entre elas : a forma como são gastas pelo governo.
No caso das taxas e contribuições, elas já possuem uma contrapartida específica, previamente definida, por isso, raramente as pessoas contestam para onde vai o dinheiro pago nas taxas.
Ao tirar a segunda via de um documento, fica evidente que o valor arrecadado será utilizado durante todo o processo, seja para impressão do documento, salário dos funcionários públicos ou a tecnologia utilizada. Porém, quando falamos em impostos, a lógica é um pouco diferente.
Quem nunca falou, ou ouviu alguém falar a clássica frase “Sempre paguei meu IPVA em dia e as ruas estão todas esburacadas”. Se você já chegou a essa conclusão, compreendo sua revolta, mas não é assim que funciona.
Todos os impostos que pagamos vão para o orçamento geral da união, e só depois é decidido como eles vão ser gastos de acordo com a prioridade que o governo definir, podendo ir para despesas com educação, saúde, segurança pública ou infraestrutura, por exemplo. Assim, não necessariamente o dinheiro de seu IPVA vai ser aplicado para tapar os buracos da sua rua ou das rodovias.
Mas afinal, quem paga mais impostos no Brasil?
Para responder, primeiro é importante entender como os tributos são cobrados no país. Existem dois principais regimes de tributação que influenciam diretamente no valor que pagamos em cada imposto: tributação regressiva e tributação progressiva.
Os tributos regressivos correspondem à maioria dos impostos que pagamos no Brasil. Eles são cobrados sobre o consumo e não sobre a renda. Assim, o governo coloca tributos fixos sobre os produtos e, quando compramos, parte do dinheiro é transferido ao Estado.
O problema desse regime de tributação é que na prática, as pessoas mais pobres acabam pagando uma porcentagem maior da sua renda ao governo, e as mais ricas pagando menos.
Para entender melhor, imagine que uma pessoa da classe E, que recebe R$ 1.212, decidiu fazer uma compra de biscoito recheado, café, carne, creme dental, shampoo e refrigerante, no mesmo mercado que uma pessoa da classe B, que tem renda de R$ 12.120.
Considerando que as duas pessoas compraram a mesma quantidade de produtos da mesma marca, se o preço final da compra ficar em R$ 89, cerca de R$ 30 serão apenas de tributos embutidos no valor da compra.
Dessa forma, em uma única ida ao mercado, uma pessoa da classe E paga 2,5% da sua renda
mensal em impostos, enquanto uma pessoa da classe B paga apenas 0,25% de tributo na mesma compra.
Com essa comparação, fica evidente como a cobrança de tributos de forma regressiva contribui para o aumento da desigualdade social, visto que mesmo que uma pessoa ganhe 10 vezes mais que a outra, as duas contribuem com a mesma quantia em impostos.
Já no regime progressivo, os tributos incidem principalmente sobre a renda dos trabalhadores. O termo “progressivo” se refere ao fato de que, quanto mais uma pessoa ganha, mais tributos ela deve pagar. O Imposto de Renda é um dos poucos tributos progressivos no sistema tributário brasileiro, já que o valor da arrecadação é relativo à declaração dos ganhos do ano anterior.
O Brasil é realmente o país que paga mais impostos no mundo?
Não! O Brasil não é o país que paga mais imposto no mundo. Inclusive, nosso país nem está no top 10. Para fazer essa constatação, analisamos os dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), uma organização composta por 35 países, que levanta e compara dados entre as nações para ajudar na promoção do desenvolvimento econômico, social e sustentável.
Países com altos Índices de Desenvolvimento Humano, como Dinamarca, Finlândia e Suécia, fazem parte da OCDE, e possuem uma média de tributos pagos por pessoa que varia entre 34% e 35% sobre a renda da população. Já a brasileira oscila em torno de 32% a 33%.
Sendo assim, em números, os cidadãos brasileiros pagam até menos tributos que boa parte dos países considerados desenvolvidos. Porém, é comum ouvir de pessoas que viajam para a Dinamarca, por exemplo, onde a arrecadação de tributos é a mais alta do mundo, que a qualidade de vida e dos serviços públicos que são oferecidos para a população é altíssima.
Esse é um dos indícios de que os mais de 48% de arrecadação de tributos que são cobrados dos dinamarqueses estão sendo retribuídos como serviços à população.
No Brasil, essa não é a percepção da maioria das pessoas, visto que 80% dos brasileiros estão preocupados com o acesso à saúde, educação de qualidade e segurança pública.
Existem vários fatores que podem ser responsáveis por essa sensação de que pagamos muitos tributos por poucos serviços, mas podemos destacar 3 principais: a própria regressividade da tributação, a má distribuição dos recursos e também a corrupção.
Como falamos anteriormente, o valor arrecadado com a grande maioria dos tributos fica nas mãos do Governo Federal, porém, esse valor nem sempre é repassado para os municípios, que é onde as políticas públicas realmente acontecem.
Além disso, não podemos negar que a corrupção em nosso país faz com que milhões de reais sejam desviados dos cofres públicos todos os dias, impedindo que nosso dinheiro retorne à população em diversos serviços essenciais, que nos foram garantidos pela Constituição.
Como podemos fiscalizar o destino da arrecadação dos impostos que pagamos?
Por mais problemas que possa ter a cobrança de impostos no Brasil, essa arrecadação tem um importante papel de custear o acesso da população a um sistema público de saúde, educação, segurança e outros serviços oferecidos pelo Estado.
Apesar de toda a sociedade ser beneficiada com o pagamento dos impostos, as pessoas em situação de vulnerabilidade social são as mais favorecidas por uma estrutura que tem como objetivo oferecer condições dignas de vida a todos.
Para garantir que o sistema tributário brasileiro seja justo, é nosso dever fiscalizar e questionar, tanto a maneira como esses recursos são arrecadados quanto a forma como são distribuídos.
Qualquer cidadão interessado pode e deve participar da votação das leis que determinam com quais despesas os impostos podem ser utilizados, como é o caso da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Além disso, também é essencial cobrar dos candidatos eleitos que as promessas de campanha sejam cumpridas e o valor arrecadado com os impostos chegue até quem mais precisa.