Que vacina é essa?
Uma vacina personalizada contra o câncer, produzida a partir do DNA do próprio paciente, alcançou resultados iniciais esperançosos em estudos clínicos do Clatterbridge Cancer Center, um dos principais centros de estudos médicos da Inglaterra. O estudo ainda é preliminar, com poucos participantes, e os resultados ainda não foram publicados em revista científica. Trata-se de um medicamento para ser usado em imunoterapia (tratamento e profilaxia).
Para qual tipo de câncer o medicamento foi desenvolvido?
A vacina foi aplicada como tratamento complementar em cânceres de cabeça e pescoço, aqueles que acometem as regiões da boca, faringe (garganta), laringe e cavidade nasal, bem como a pele, glândulas salivares, vasos sanguíneos, músculos e nervos da região, além da glândula tireoide.
O Clatterbridge Cancer Center foi o primeiro hospital inglês a oferecer o tratamento. Um pequeno ensaio clínico com doentes com câncer nos ovários na França e nos EUA também vem mostrando resultados promissores.
Quais resultados foram apresentados no estudo da Inglaterra?
Os participantes do estudo fizeram um tratamento tradicional completo (cirurgia, quimioterapia e radioterapia), porém que apresentavam alto risco de recorrência da doença. Os resultados foram apresentados no Congresso americano de Oncologia Clínica, em junho.
Os resultados obtidos pela vacina contra o câncer foram promissores?
Christian Ottensmeier, consultor médico oncologista e diretor de pesquisa do Clatterbridge Cancer Center, mostrou certa dose de cautela, mas otimismo para as próximas fases da pesquisa. “Estou realmente esperançoso”, disse. “Todos os dados estão apontando na direção certa”, acrescentou.
“Estamos empolgados com esses resultados iniciais, embora seja preciso manter os pés no chão e ter cautela. Vamos precisar ver os dados a longo prazo e analisar mais pacientes para afirmar que é uma tecnologia que veio para ficar no nosso arsenal no tratamento contra o câncer” (Thiago Bueno, oncologista e vice-líder do Centro de Referência de Tumores de Cabeça e Pescoço do A.C.Camargo Cancer Center)
“Esse estudo aumenta o nosso conhecimento ao mostrar que o sistema imunológico foi capaz de ser treinado para reconhecer as moléculas introduzidas como tratamento. [Os dados] estão apontando na direção correta, mas precisamos de mais pacientes e de acompanhamento mais longo para ter certeza (William Nassib William Júnior, diretor médico do Centro de Oncologia e Hematologia da BP – Beneficência Portuguesa)
Qual o diferencial desse medicamento??
Para o oncologista Thiago Bueno, o grande avanço é a personalização. “Cada tumor de cabeça e pescoço é único e a personalização abre uma nova perspectiva. Nós ainda não temos tecnologias de indução de resposta imune de maneira tão personalizada, como um tratamento para cada paciente”, explica.
A imunoterapia, tipo de tratamento onde se enquadra o estudo inglês, representa uma das mais recentes inovações no tratamento da doença metastática do câncer de cabeça e pescoço. A terapia estimula o próprio sistema imunológico do paciente a controlar o tumor. São medicações injetadas na corrente sanguínea do paciente que podem produzir bons resultados de acordo com a resposta do paciente.
O médico oncologista William Nassib William Júnior, conta que a Beneficência Portuguesa estuda atualmente a combinação da imunoterapia com a quimioterapia ou com radioterapia para potencializar o efeito benéfico das duas medicações. Outra linha de pesquisa combina quimioterapia e imunoterapia para eliminar o câncer de laringe (garganta e corda vocal) sem a necessidade de cirurgia.
Quais são os desafios para o desenvolvimento da técnica testada na Inglaterra?
Especialistas afirmam que as vacinas podem representar o futuro do tratamento contra o câncer, aproveitando o poder natural do sistema imunológico. As novas abordagens incluem imunizantes preventivos e terapêuticas capazes de diferenciar células tumorais das normais. Mas ainda existem grandes desafios para a criação e produção de vacinas contra o câncer.
Um deles é a variabilidade genética entre os tumores, inclusive de um mesmo sítio primário, ou seja, o local de origem do câncer, como explica Thiago Bueno. “Por esse motivo, uma vacina personalizada para cada tumor individualmente poderia vencer essa barreira”, exemplifica.
Outros desafios envolvem a própria identificação das células anormais. Para que uma vacina seja criada, é preciso encontrar uma molécula que seja estranha ao organismo. “Uma segunda dificuldade é encontrar as moléculas alteradas contras as quais o sistema imunológico possa desenvolver uma resposta robusta para eliminá-las”, avalia William Nassib William Junior.