A periferia no centro do mundo

Vista parcial da favela de Paraisópolis, zona sul da capital paulista. Foto: Evelson de Freitas/Estadão Conteúdo

27/06/2021 - Tempo de leitura: 5 minutos, 43 segundos

“Minha filha, que bênção a gente morar no Capão Redondo”, foi a reação de Terezinha de Jesus ao saber que a repórter Riviane Lucena estava mais perto do que imaginava, ali mesmo, pela sua vizinhança na zona sul de São Paulo. A identificação imediata foi o empurrãozinho que faltava para quebrar qualquer resistência. Terezinha topou conversar sobre sua participação em um projeto liderado por mulheres do bairro, a fim de apoiar famílias vulneráveis durante a pandemia. “Naquele dia, completavam-se nove anos que ela tinha perdido o filho mais velho para a violência policial”, diz Riviane, do coletivo Embarque no Direito. “Acordou triste, mas disse que ficou muito animada com a nossa conversa.”

Ouvir pessoas como a dona Terezinha e contar suas histórias pelo olhar de quem vive realidades muito parecidas é o objetivo do Expresso Na Perifa, um canal de jornalismo focado nas periferias e nos bairros fora do centro expandido não só de São Paulo, mas de todo o País.

O conteúdo é produzido em colaboração com coletivos de jornalistas e comunicadores desses territórios. Além do Embarque no Direito (SP), participam Favela em Pauta e PerifaConnection (RJ), Lá da Favelinha (MG) e Periferia em Foco (PA). Completam o time, e ampliam a voz do Na Perifa, o jornalista Juca Guimarães, um nome importante na cobertura dos temas sociais, e colunistas convidados.

“Existe um histórico na grande imprensa de invisibilizar essas narrativas”, diz Helaine Martins, uma das editoras. “Falta representatividade nas redações e, consequentemente, nas pautas.” O desafio gigante e estimulante do Na Perifa é, justamente, romper essas barreiras.

Construir pontes

Parceria entre 99, empresa de mobilidade e conveniência, Estadão e coletivos periféricos, o Na Perifa é atualizado diariamente. Por meio de reportagens e análises publicadas em vários formatos – texto, podcast e vídeo –, informa e debate diversos temas, a exemplo de diversidade, empreendedorismo, educação, finanças, emprego e segurança pública – bem como direitos humanos, cultura, lazer, gastronomia, esporte e tecnologia. Para acessar, não precisa ser assinante. Completa o portfólio do veículo uma edição mensal impressa e gratuita distribuída na cidade de São Paulo.

Em todas as mídias, existe uma atenção especial à mobilidade urbana e ao acesso à cidade, temas caros à 99. “Sabemos que somos parte da rotina de milhões de pessoas que se deslocam e geram renda pela plataforma todos os dias”, afirma Pedro Henrique Oliveira, gerente sênior de Comunicação da 99. “Contribuir também na promoção do bom jornalismo nos deixa muito orgulhosos e cientes dessa responsabilidade.”

A colaboração com uma das maiores e mais importantes empresas de informação e comunicação do Brasil leva o Expresso Na Perifa para além das comunidades e faz com que as discussões sociais levantadas pelos moradores dessas regiões sejam ouvidas e divulgadas em larga escala. “O Na Perifa é uma excelente oportunidade para ampliar a penetração do jornalismo de qualidade promovido pelo Estadão, ainda mais em um momento em que o avanço das fake news preocupa tanto”, diz Luis Fernando Bovo, diretor de conteúdo e operações do Estadão Blue Studio. “Como a produção é feita por coletivos atuantes, reconhecidos e selecionados, os moradores das regiões periféricas vão poder se ver nos textos, fotos e vídeos. É um jornalismo de inclusão e representatividade.”


Quem faz o conteúdo do Na Perifa

Embarque no Direito (SP)

Fortalecer a democracia e combater o deserto de notícias sobre a periferia são princípios do Embarque no Direito, que atua na zona sul de São Paulo desde 2018. “Acreditamos na democratização da informação como forma de aproximar o público da notícia”, diz Riviane Lucena. Além de produzir conteúdo para site e redes sociais, o grupo distribui um jornal impresso bimestral em terminais de ônibus, estações do metrô e organizações sociais presentes nesses territórios.

Favela em Pauta (RJ)

A cobertura de moradores da periferia para os Jogos Olímpicos de 2016 foi o embrião do coletivo que hoje atua nas cinco regiões do Brasil, multiplicando o jornalismo conectado à realidade da quebrada. “A favela sempre esteve em pauta, mas a posição da câmera, de fora para dentro, limita-se a registrar o olhar de quem entra. Quem olha nem sempre enxerga suas complexidades e valores”, afirma Ariel Freitas, que é do Rio Grande do Sul e defende a ampliação do debate e a disputa de narrativa sobre as periferias.

Juca Guimarães (SP)

Juca Guimarães morou em diversos bairros da periferia de São Paulo. Jornalista há mais de vinte anos, Juca tem um olhar atento e crítico para as franjas da cidade, onde vive a maioria da população. “O humor da periferia indica, geralmente, para que lado está indo todo o caldo cultural e social do País. Se a renda per capita é menor na periferia, por outro lado, em volume de negócios e geração de informação é lá que são construídas as maiores cifras”, diz.

Lá da Favelinha (MG)

As atividades são voltadas para o cotidiano do Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, e têm a participação efetiva dos moradores . “São pessoas faveladas que produzem arte, cultura e educação a partir das suas vivências”, conta Danny Mendes, colaboradora do Na Perifa ao lado de Kdu e Negona Dance. Suas pautas traçam um panorama intenso do território ao falar de funk, luta das mulheres negras, geração de renda, moda, juventude e a comunidade LGBTQI+.

Periferia em Foco (PA)

O que move as engrenagens do coletivo é a realidade da região metropolitana de Belém (PA), em especial o bairro da Cabanagem, onde moram os fundadores. “Mostramos as histórias dos heróis da periferia e as principais reportagens são as de valorização do território e de suas potencialidades ”, diz um dos coordenadores, Wellington Frazão, ao lado do educador social Carlos Gouvêa e do jornalista Cássio Miranda. Além de site e redes sociais, o Periferia em Foco faz webséries e reportagens em vídeo.

PerifaConnection (RJ)

Quando começou, em 2019, o PerifaConnection era um grupo de cinco jovens ativistas da periferia do Rio de Janeiro dispostos produzir conteúdo com a visão de dentro dos territórios, que não fosse atravessada por um viés elitista. Além de Jefferson Barbosa, Raull Santiago, Salvino Oliveira, Thuane Nascimento (Thux) e Wesley Teixeira, há uma rede de colaboradores em diversas regiões do Brasil. “Vemos que o trabalho está dando certo quando conseguimos disputar novos espaços que são negados à periferia”, afirma Thux.