Desde janeiro, quando se tornou mais nítido o poder devastador do novo coronavírus, o mundo vem passando por constantes sobressaltos. Primeiro, o vírus abalou de forma significativa a China. Depois, seu poder destruidor chegou à Europa, sobretudo Itália e Espanha.
Mais recentemente, as consequências da pandemia desembarcaram no continente americano. Junto com milhares de óbitos – até o momento são quase 200 mil mortes registradas em todo o mundo –, o coronavírus trouxe outros enormes impactos indesejados, sobretudo na cadeia produtiva, o que tem provocado estragos econômicos imensos.
Além de vários setores atingidos diretamente, ele também está minando tecnologias emergentes das cadeias de suprimentos globais – o que inclui os carros elétricos.
As vendas de veículos na China, o maior mercado de automóveis do mundo, por exemplo, caíram 79% em fevereiro em relação ao ano anterior, quando os clientes ficaram em casa e se afastaram das concessionárias devido à epidemia de coronavírus.
Naquele mês, a queda de vendas foi comum a praticamente todos os fabricantes. A Shenzhen BYD, que produz carros elétricos, vendeu apenas 5.501 carros naquela mês – queda de 79,5%. A Chongqing Changan Automobile, de Chongqing, que tem joint ventures com Ford e Mazda, registrou um tombo de 73,7%.
O Dongfeng Motor Group, com sede em Wuhan, epicentro da pandemia, vendeu 80,7% menos que em 2019. O GAC, com sede em Guangzhou, que possui joint ventures com Toyota, Honda, Mitsubishi e FCA, apontou queda de 81,1%.
A joint venture da General Motors, em Xangai, com a Saic Motor, menos 92,2%. A Honda Motor, que possui joint ventures com a GAC e a Dongfeng, sediada em Hubei, anotou queda de 85,1%.
Como se não bastasse, a incerteza sobre o coronavírus levou a um tombo mundial no preço do petróleo. Nesta semana, por exemplo, o preço do barril chegou a registrar menos de US$ 20, com recuo de 25% em relação a cotações anteriores.
Qual a consequência? É simples. Em geral, óleo e gás mais baratos nas bombas significa declínio de interesse por veículos elétricos. Não à toa que alguns analistas, neste mês de abril, tenham apontado esse fato como um dos principais motivos de queda das ações da Tesla.
Outro prejuízo que podemos colocar na conta da disseminação do vírus foi o cancelamento de diversos de salões de automóveis que estavam previstos para 2020 – inclusive o de São Paulo, agendado para novembro –, em que a próxima geração de veículos elétricos seria lançada.
Uma das exceções foi a Fiat, que, apesar das dificuldades, lançou, no início de março, em Milão, o novo 500e totalmente elétrico.
Outras montadoras foram mais comedidas e preferiram fazer apenas apresentações pela internet. A General Motors, por sua vez, adiou o lançamento do Cadillac Lyriq, veículo totalmente elétrico, que estava agendado para ocorrer em maio.
Como se tudo isso não bastasse, nos Estados Unidos ainda houve o impacto das tarifas decretadas pelo governo Trump sobre diversos produtos importados da China, incluindo uma taxa de 25% imposta sobre bicicletas, motocicletas, scooters e skates elétricos. Essa pressão fez com que a Boosted Board, localizada na Califórnia (EUA), uma das principais fabricantes de skates elétricos dos Estados Unidos, demitisse a maioria de seus funcionários.
Por fim, mas não menos importante, a cadeia de suprimentos dos veículos elétricos também foi afetada. Muitas montadoras mundo afora têm tido enorme dificuldade para encontrar insumos essenciais que compõem as baterias usadas em carros elétricos.
A China, por exemplo, é a líder mundial no refino de cobalto, item largamente utilizado nessas baterias, o que faz com que impactos nas instalações de processamento de cobalto podem afetar, de forma significativa, os custos dos veículos elétricos.
De certa forma, isso já aconteceu. A maior parte do lítio mundial, outro metal fundamental na produção de baterias, vem da China. Recentemente, devido a alguns impactos provocados pelo coronavírus, a Ganfeng Lithium, que fornece o produto para a Tesla e para a Volkswagen, majorou o preço do produto em cerca de 10%.
Com certeza, todo este cenário trará mudanças significativas na produção dos carros elétricos ao redor do mundo. Por enquanto, só nos resta torcer por dias melhores que, com certeza, virão.