Enquanto milhares de veículos transitavam na pista expressa da Marginal Tietê, bem ao lado do complexo do Sambódromo do Anhembi, na zona norte de São Paulo, a poucos metros dali, do outro lado dos muros, 22 carros disputavam uma corrida silenciosa, a São Paulo E-Prix, nos dias 24 e 25 de março, sexta e sábado, respectivamente.
Foi a primeira vez que uma etapa da Fórmula E – categoria realizada somente por monopostos elétricos – aconteceu no Brasil. A prova foi vencida pelo neozelandês Mitch Evans, da Jaguar, uma das fabricantes que mantêm equipe na categoria, ao lado de Nissan, McLaren, Maserati, Porsche, Mahindra e a chinesa Nio. “São Paulo tem uma pista muito seletiva, que colabora no desenvolvimento dos carros. Vencer aqui é uma demonstração de força da equipe e espero que o traçado continue assim nos próximos anos”, diz James Barclay, diretor da equipe Jaguar.
Mais do que uma competição, o campeonato organizado pela Federação Internacional de Automobilismo (FIA) é um laboratório para o desenvolvimento de novas tecnologias e soluções aos automóveis movidos a bateria e que já circulam nas ruas.
De um ano para outro, essa evolução vem acontecendo a passos largos. “Hoje, os carros da Fórmula E têm dois motores, um em cada eixo, o que ajuda a melhorar o equilíbrio, a aderência no solo e, consequentemente, a segurança. Com um motor só, o comportamento do carro era mais limitado”, afirma Francisco Medina, gerente de veículos elétricos da Nissan América do Sul. “Mas um dos maiores desafios da Fórmula E é explorar ao máximo o aumento de autonomia da bateria. Cabe ao piloto saber administrar essa questão.”
Medina conta que a indústria automotiva vem investindo fortemente no desenvolvimento de baterias em estado sólido, que podem acumular três vezes mais energia e reduzem o tempo da recarga. “É possível que esse tipo de bateria seja inserido nos automóveis de rua a partir de 2028, com testes sendo feitos na Fórmula E”, revela.
Os carros elétricos já possuem o sistema de regeneração de energia na frenagem. Ou seja, a energia consumida quando o motorista pisa no freio não é desperdiçada, convertendo-se em carga para a bateria. Essa tecnologia evoluiu demais na Fórmula E, desde a sua primeira temporada, em 2014.
Os carros da primeira geração da categoria conseguiam regenerar até 100 kW, enquanto os da terceira geração (GEN3) alcançam 600 kW. Na prática, significa dizer que 40% da energia consumida durante cada etapa é proveniente da frenagem regenerativa.
Os pontos de maior potencial de regeneração são as freadas nas curvas. Nesse sentido, as 11 curvas da pista desenhada no sambódromo foram valiosas para os pilotos recarregarem seus carros. Algumas exigiam freadas bruscas, que fornecem mais carga à bateria.
Mesmo assim, os fórmulas terminam as corridas no limiar da bateria. No São Paulo E-Prix, o Jaguar de Evans completou as 35 voltas com apenas 0,1% de carga disponível. Como o traçado tinha 2.933 metros, a autonomia da bateria foi de 102 quilômetros.
É claro que um carro de Fórmula E é conduzido ao limite para alcançar 320 km de velocidade máxima em muitos trechos da pista. Mas, como curiosidade, o Nissan Leaf, que pesa 1.500 quilos, consegue rodar quase 200 quilômetros com a carga completa. “Não há como negar: a maior barreira do veículo elétrico ainda é a bateria”, admite Medina.
O alcance na Fórmula E seria menor se os carros não tivessem perdido peso ao longo de seu aperfeiçoamento. São 49 quilos a menos no modelo da geração 3, em relação à 2. “O chassi e a bateria são iguais para todas as equipes. Nossa tarefa é usar da melhor maneira possível os outros materiais para deixar o carro mais ágil e poluir menos”, destaca Tommaso Volpe, gerente-geral da equipe Nissan.
Embora a categoria pregue a sustentabilidade, usando componente e peças descartáveis, Volpe reconhece que alguns materiais utilizados nos carros são poluentes, como o ferro e o alumínio. De toda forma, a FIA garante que as emissões estão em queda.
Na temporada de 2021, a categoria foi responsável pela emissão de 20.000 toneladas de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. No ano passado, esse número baixou para 19.600 toneladas em todas as operações da Fórmula E, incluindo o transporte de 415 toneladas de carga de uma etapa a outra.
Tommaso Volpe acrescenta que existem dois pilares fundamentais para as marcas participarem da Fórmula E. “Elas querem se transformar em empresas de tecnologia que produzem carros elétricos, e a categoria ajuda a promover isso. E as fabricantes buscam a neutralidade de carbono em todas as suas operações. No caso da Nissan, a meta é 2050. A Fórmula E possui conexão direta com esse objetivo. Afinal, temos mais a aprender com carros elétricos do que com os de motor a combustão”, conclui.
Durante a cerimônia do pódio, as equipes aproveitaram para celebrar a estreia da Fórmula E em São Paulo, cujo contrato é de cinco anos. A julgar pelo andamento da categoria, a tendência é que, em 2024, existam novidades nos carros e na estrutura da prova.
“É estimulante saber que as tecnologias dos carros de corrida movidos a bateria estejam em constante aprimoramento”, ressalta Francisco Medina. “Por isso, os automóveis de rua elétricos vão replicar essas mudanças, ficando cada vez mais equipados, equilibrados e seguros.”
Geração 2 Geração 3
Comprimento 5.200 mm 5.016 mm
Altura 1.063 mm 1.023 mm
Largura 1.800 mm 1.700 mm
Entre eixos 3.100 mm` 2.970 mm
Peso 903 kg 854 kg
Potência 250 kW 350 kW
Vel. máxima 280 km/h 320 km/h
Regeneração
de energia 25% 40%
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