Entre os dias 5 e 10 de setembro, aconteceu a última edição do principal evento mundial da indústria automobilística, o Salão da Alemanha. Se outrora valia a máxima do Salão do Automóvel para o mundo, a edição de 2023 marcou o começo de uma nova era: a do mundo para o Salão do Automóvel. Anteriormente conhecido como Salão Internacional do Automóvel de Frankfurt, o evento foi rebatizado, em 2021, e realocado para Munique, passando a se chamar IAA Mobility.
A mudança, não apenas conceitual, reflete o desejo da indústria em mostrar seu compromisso com a mobilidade sustentável, destacando o ecossistema que existe por trás de cada carro elétrico, ao mesmo tempo que aproveita a oportunidade de mostrar seus mais recentes desenvolvimentos e inovações no sentido da crescente preocupação com as mudanças climáticas, atendendo às demandas do consumidor por veículos mais ecológicos e eficientes.
Tive a oportunidade de conferir de perto o aclamado evento, e divido aqui algumas impressões. Foi nítido que a indústria automobilística mundial está investindo pesadamente na eletrificação em suas mais variadas formas.
Dentre as estratégias das montadoras, algumas são mais inclinadas aos veículos puramente elétricos; outras, ancoradas na proposta dos híbridos plug-in. Seja qual for o caso, a busca da redução das emissões de CO2 está no centro da discussão mundo afora.
A tônica dessa edição do IAA Mobility foi a consolidação do discurso pró-agenda sustentável e, para tanto, as montadoras deram demonstrações concretas de como vão explorar soluções verdes de forma horizontalizada. São muitas as novas aplicações: de veículos compartilhados a carros autônomos. Tudo partindo do compromisso em reduzir as emissões em todas as etapas da cadeia produtiva, com práticas mais ecológicas desde a fabricação.
E o que era exercício de futurologia agora é o presente inexorável. Se, antes, o ponto alto do evento se concentrava nos protótipos futuristas, e no que iria acontecer daqui a 20 anos, a discussão posta foi sobre o que está nas ruas ou em vias de sair do forno.
Europeus e americanos, que sempre ditaram o ritmo da indústria, viram de perto a globalização do setor e a ascensão dos chineses, vistos agora como protagonistas. Dois dos maiores e mais concorridos espaços foram da BYD e da novata Seres. Das montadoras tradicionais europeias, destaque aos modelos da BMW, do Grupo VW e da Renault, que correram atrás do prejuízo e exibiram projetos sólidos.
Já as americanas, como previsto, não apareceram. Única exceção foi a Tesla, que, mesmo de forma tímida e com apenas dois modelos, fez a festa de muitos aficionados pelos bólidos do senhor Elon Musk.
Indústria e representantes de governos europeus foram unânimes em ratificar as medidas na luta contra as alterações climáticas. Um contingente enorme de países e cidades detalhou suas metas e datas de eliminação progressiva dos motores a combustão.
Montadoras reafirmaram suas propostas de paridade imediata de preços dos veículos elétricos, em relação aos a combustão, além de se comprometerem massivamente em acelerar os programas de P&D dos eletrificados, em detrimento dos antigos e poluentes veículos a combustão.
O evento mostrou que tudo pode ser elétrico em uma cidade inteligente. Não se trata mais apenas de carros. Pelo contrário. Foram apresentadas inúmeras aplicações nos setores de logística, agronegócio, micromobilidade e até design. A eletrificação é um mar de oportunidades.
Houve uma pulverização muito grande com a entrada de novos players que reforçam a relevância e a importância dessa transição e da oferta de novas soluções e de uma nova geração de veículos e modelos de negócio de mobilidade (mobility as a service). O que antes era principalmente baseado em hardware passa a se caracterizar como veículo definido por software (software defined vehicles). Ou seja, um dispositivo eletrônico sobre rodas, repleto de interatividade e tecnologia. Esse novo formato dá margem a diversas possibilidades.
Nascem aplicativos de todas as naturezas: EMSPs, CPOs, sistemas de pagamento eletrônico, gerenciamento de tráfego inteligente e até gadgets que integram seu carro à sua casa. Consequentemente, observamos o desenvolvimento do que chamamos de competição colaborativa, ou coopetição. Em vez das empresas guerrearem entre sim, cada uma entrega aquilo que tem de melhor em parcerias que podem unir empresas clássicas do setor com grandes players de tecnologia, como Google e AWS, que, por lá, fizeram sucesso.
Um exemplo de aplicação disruptiva dos veículos elétricos apresentada foi o que chamamos de vehicle-to-grid, ou V2G. Trata-se de um sistema pelo qual veículos elétricos se comunicam com a rede elétrica, permitindo que os carros transacionem energia por meio da oferta de serviços auxiliares, tais como resposta à demanda ou estabelecimento de contratos inteligentes.
Outra questão amplamente discutida foi a de que as cidades devem ser projetadas para permitir o acesso fácil e combinado entre os meios de transporte, sendo a mobilidade essencial para promover a qualidade de vida e reduzir as desigualdades.
Mais do que elétrico, o futuro da mobilidade é inteligente, democrático e inclusivo.
Saiba o que pensam outros embaixadores da Mobilidade Estadão