Sistemas de monitoramento, também chamados de guardiões ou cercos digitais, têm se popularizado por diversas cidades do Brasil e se tornado aliados da segurança pública. A Gabriel, startup de tecnlogia criada em 2020 no Rio de Janeiro e que agora chega a São Paulo, aposta em uma abordagem um pouco diferente: sistemas proprietários e que podem ser adquiridos ou custeados pelos próprios moradores.
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Lançada neste mês de junho, a empresa desenvolveu um par de câmeras com inteligência artificial para ler e rastrear placas de veículos irregulares, além de um sistema capaz de alertar a polícia sobre a circulação desses carros e motos irregulares na cidade.
Batizado de Camaleão 2, as câmeras irão operar em fachadas de casas, estabelecimentos comerciais e condomínios de forma 100% automatizada e 24h por dia. Acompanhe na entrevista com os fundadores, detalhes do funcionamento do sistema.
Qual a diferença dessas câmeras para os demais sistemas que algumas cidades do Brasil já contam, como Foz do Iguaçu, por exemplo?
Otávio Miranda, cofundador da Gabriel: Hoje existem duas formas de se construir sistemas de inteligência urbana. Existem os públicos, que são feitos por várias cidades Brasil afora – Foz do Iguaçu (PR) é um exemplo, Vitória (ES) e Niterói (RJ) têm os seus cercos eletrônicos, onde buscam-se placas de carro ativamente. Também há gestões estaduais, como o Governo da Bahia, que construiu seu próprio sistema de câmeras. A principal diferença é que construímos um sistema colaborativo, que integra múltiplos moradores uns aos outros.
A empresa constituiu passivamente uma grande rede composta pelo somatório de todo mundo que usa as câmeras. Essa é a primeira diferença porque quem custeia a rede que a Gabriel construiu é o próprio usuário, são os próprios moradores que, em conjunto, compõem essa rede.
Também apostamos muito na densidade. Isso significa que esse sistema que os governos costumam ofertar funcionam na borda dos municípios. Então, em todas as regiões de acesso principal, as câmeras monitoram se entrou na cidade, ou se não está na cidade, um determinado veículo, apostando na densidade e granularidade.
Se em uma cidade como Foz do Iguaçu tem 100 câmeras procurando os carros que estão entrando, com a Gabriel estamos falando de algumas milhares de câmeras, dentro de poucos bairros, em que conseguimos saber qual é a quadra por onde um veículo circulou. Dessa forma temos uma ‘pegada’, um rastro muito grande que a gente captura dos veículos. Isso permite entender em granularidade como um bairro, uma rua, uma quadra ou uma cidade se comporta do micro para o macro.
Uma terceira diferença é que a empresa é baseada na própria construção dos produtos. A Gabriel trabalha com câmeras proprietárias, inteligentes, que têm a capacidade de, em sua própria estrutura, fazer o processamento e a distribuição dessas imagens. Ou seja: uma câmera de um sistema como de Foz do Iguaçu lê uma placa, manda essa placa para nuvem, ela impõe um custo muito alto ao governo, que logo em seguida, vai ter um gasto recorrente para armazenar e processar essas imagens, para ele pegar essas placas todas que foram lidas e poder fazer algo com base nisso.
Erick Coser, CEO da Gabriel: No caso do Gabriel, a gente já vai no sentido contrário. Construímos o chamado sistema de computação distribuído, pegando umsupercomputador e pulverizamos ele em microcomputadores, uma câmera de cada vez. O somatório dessas várias câmeras forma um supercomputador. Em conjunto, elas são capazes de fazer exatamente aquilo para o qual foram programadas. Nesse caso, procurar ativamente, 24 horas por dia, placas de veículos.
A diferença é o custo. Nossa câmera é uma câmera inteligente, ela extrai a placa do carro, ela entende o texto da placa, manda pra gente só o texto e armazena as imagens das placas de veículos nela mesmo, em alta definição, de modo que a polícia possa consultar múltiplas vezes aquela placa, e que a gente transmita as imagens de todas usando 4G.
Para se fazer um sistema como o de Foz do Iguaçu são necessários muitos meses. Ao passo em que, para a Gabriel, precisamos de um dia para instalar um bom volume de câmeras, uma vez que a instalação de um equipamento leva em torno de 40 minutos para já estar funcionando.
É importante lembrar que a Gabriel é dona de ponta a ponta de toda a arquitetura do produto. A câmera, o software, o processamento, a transmissão, a internet, tudo isso é da Gabriel. Enquanto que, um sistema público como a gente usa, ele é uma junção de várias empresas para entregar a mesma coisa. Na Gabriel, a gente verticaliza tudo.
Qual é o público final que adquire esses equipamentos? Já há algum contrato à vista?
Otávio Miranda: Hoje, a gente tem em torno de 100 clientes que são usuários do Camaleão 2, que aderiram ao produto logo no começo da distribuição dele. São condomínios residenciais, lojas e casas, já clientes da Gabriel, que passam a utilizar o Camaleão 2 para ajudar a construir essa rede.
Se São Paulo já tem algumas centenas de radares espalhados por município, a Gabriel implanta milhares da noite para o dia, em que cada câmera se torna um pequeno “pardal” em busca de veículos de interesse. Isso cria um cerco muito fechado, que garante que, caso um crime envolvendo um veículo aconteça no ponto A, a gente consiga buscar por esse veículo nos pontos B, C, D, E…
Erick Coser: Entendemos que há duas formas de distribuir esse produto. Uma delas é ofertar para clientes privados, que são condomínios, casas e lojas, e outra é oferecer a solução para administrações públicas, que são as prefeituras, o que faz parte do nosso foco para 2024.
Qual a diferença do uso de duas câmeras no lugar de uma?
Erick Coser:Com duas câmeras, conseguimos entregar a imagem de um determinado local em 180º. Quando se pensa em uma fachada (uma parede ou grade) em que se tem dois lados para olhar, nosso trabalho é enxergar 180º graus. Não é muito comum ver uma única câmera que enxerga 180º que não entregue uma imagem altamente distorcida e redução da sua capacidade de ler placas como um todo.
Há alguns motivos para usarmos duas câmeras. O primeiro é que esta é a forma mais eficiente de enxergarmos 180º, isso também em termos de custo-benefício. Segundo: é a melhor forma de evitar que a gente deturpe a qualidade da imagem. Terceiro: porque cada câmera pode ser eventualmente ativada para rodar um algoritmo diferente. Hoje, nossa entrega é a leitura de placas de veículos.
Futuramente, uma opção é entregar também a capacidade de ler placas e contar quantidades de pessoas e duas câmeras fazem isso melhor que uma. Ou seja: duas câmeras equivalem a dois pequenos computadores que têm duas capacidades de processar coisas diferentes.
Qual o caminho da informação a partir da identificação de uma placa de veículo roubado?
Otávio Miranda: A Gabriel pode ser notificada pelas autoridades, mediante apresentação de ofício via plataforma Gabriel para Autoridades; e pode alertar as autoridades via GabrielOS, que é o software da Gabriel.
Além de identificar placas de veículos roubados que passaram pela nossa Área de Proteção (como chamamos nossa área de cobertura no Rio de Janeiro e em São Paulo) e alertar as autoridades, o software GabrielOS também faz outras coisas. Por exemplo: conhecer o trajeto feito por um determinado veículo dentro da Área de Proteção, buscar quais placas de veículos passaram por um local em um determinado horário, e identificar coincidências, ou seja, verificar se uma mesma placa de veículo apareceu em mais de uma ocorrência relatada à Gabriel.
Essas funcionalidades servem para a gente crie um filtro de carros roubados, placas clonadas ou algo do tipo, que é um tipo de problema. E, também, para identificar se um carro que circulou pela Área de Proteção foi envolvido em uma situação de crime que não consta em nenhuma base, por exemplo. Essas placas são reportadas às autoridades pelo canal Gabriel Autoridades e pelo GabrielOS.
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