Rios e represas estarão integrados ao transporte da Grande São Paulo

Em Londres, várias linhas de barcos de passageiros navegam pelo Rio Tâmisa. Em São Paulo, o primeiro trecho está previsto para 2024. Foto: Getty Images

30/06/2022 - Tempo de leitura: 4 minutos, 14 segundos

A região metropolitana de São Paulo guarda o projeto de um hidroanel com 170 quilômetros de extensão. A obra permitirá o transporte pelos Rios Pinheiros, Tietê e as Represas Billings, Taiaçupeba e Guarapiranga. Para quem só vê carros, ônibus e asfalto, a possibilidade de trocar a monotonia de um congestionamento pela visão de barcos, marolas e as margens refletidas num espelho d’água é bem animadora.

Um projeto piloto começa a operar em 2024 a partir do transporte de passageiros entre os bairros Cocaia e Pedreira, ambos na zona sul da capital paulista. A travessia é curta, 3,4 quilômetros, com tempo estimado de 15 minutos. Ir de um bairro a outro por terra levaria um tempo cinco vezes maior, já que não existem ruas ou avenidas contínuas por toda a orla. Outra vantagem: o barco aproximará a Pedreira da estação de trem Grajaú, pertencente à Linha 9  Esmeralda da CPTM.

Haverá integração de tarifa dos barcos com os ônibus que partirão das margens. “Estão previstas embarcações com ar-condicionado e capacidade para 220 passageiros sentados. Nos momentos de pico eles poderão transportar em média 900 passageiros por hora”, afirma o professor Alexandre Delijaicov, coordenador do Laboratório de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). A navegação não será interrompida em períodos de estiagem.

A concepção do hidroanel, no entanto, é bem mais complexa. Beneficiará diretamente 15 municípios e prevê, além do transporte, a criação de parques nas margens, estruturas de combate a enchentes e até mesmo turismo hidroviário integrado a teatros e bibliotecas flutuantes. O custo atualizado da obra estaria próximo a R$ 8 bilhões.

O transporte de passageiros contará com seis trechos: Billings, Guarapiranga, Pinheiros Superior, Pinheiros Inferior, Tietê Centro e Tietê Leste. “Estes seis trechos são comparáveis a seis linhas de metrô”, recorda o professor da FAU. Estão previstos 24 portos de passageiros.

O futuro transporte pela Represa Guarapiranga também será bem-vindo para quem hoje tem de se deslocar de carro ou ônibus da margem esquerda para a direita, por exemplo, já que as avenidas do entorno estão saturadas. Há previsão de dois portos no bairro Cidade Dutra, um no Jardim Ângela (perto da Estrada do M’Boi-Mirim) e outro no Socorro (próximo às estações Jurubatuba e Socorro do trem). 

Navegar para despoluir

Mas como usar barcos em rios tão poluídos como o Tietê e o Pinheiros? A resposta vem da concepção do projeto. “Não é preciso esperar despoluir para navegar. Ao contrário, a navegação é para despoluir”, diz o professor. O material dragado será encaminhado para três grandes estruturas batizadas triportos, que funcionarão como plantas industriais, transformando resíduos em insumos. O nome triporto vem da capacidade de triagem, processamento e destinação final dos materiais.

O lodo será transformado em adubo e em biogás, aproveitado no funcionamento dos triportos. O vidro e o plástico serão moídos e derretidos. Os metais também serão fundidos. Tudo isso será vendido. O entulho também, depois de fragmentado.

A concepção do hidroanel considerou conceitos como logística reversa, ecologia industrial, economia circular, aterro zero e mobilidade urbana com redução de emissões de poluentes a partir do transporte por embarcações elétricas ou híbridas. Também haverá geração de energia por turbinas instaladas em eclusas e barragens.

As embarcações estarão integradas a ônibus em todos os trechos. Está previsto ainda o incentivo ao plantio de hortaliças nas margens das represas, com venda desses produtos em portos próximos.

Eclusas e transporte de cargas

A viabilidade do hidroanel passa pelo transporte de cargas, sobretudo o material dragado, e por isso prevê a utilização de 20 eclusas. Uma delas foi entregue em 2016 ao lado da barragem móvel da Penha, no Rio Tietê. Eclusas funcionam como elevadores para embarcações, mas o sobe-desce ocorre pelo bombeamento e escoamento de água em grandes tanques em que o barco aguarda ser erguido ou baixado até o próximo lago ou curso d’água. Como se trata de uma operação demorada, será utilizada para cargas apenas.

Os passageiros contarão com escadas rolantes e elevadores para vencer esses desníveis. Vale dizer que o Rio Tietê já tem um bom trecho urbano que não dependerá de dragagem em toda a extensão. Ele fica entre a divisa de São Paulo com Osasco e o limite entre São Paulo e Guarulhos. Precisará, porém, de limpeza constante a fim de manter sua profundidade.

A totalidade do hidroanel metropolitano também se divide em seis partes. As duas primeiras são trechos distintos do Tietê. A terceira é o Pinheiros. A quarta corresponde à represa Billings. A quinta é o canal entre a foz do Taiaçupeba-Açu e a foz do Taiaçupeba-Mirim. A sexta será um canal artificial ligando a Billings à Taiaçupeba. A conclusão do projeto está prevista para 2040.