A frota automotiva no Brasil já ultrapassa os 103 milhões de veículos cadastrados, de acordo com as estatísticas do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) em agosto de 2019. Desse total, 14,3% (14,8 milhões) se dividem entre veículos de cargas dos mais variados tipos – os caminhões de pequeno, médio e grande portes.
O estudo Logística Urbana: Restrições aos Caminhões, divulgado em 2018 pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), mostrou que circulavam pelos grandes centros urbanos brasileiros aproximadamente 96,7 milhões de veículos. E é aí que está também a grande maioria da população (84%).
Em contrapartida, os investimentos em infraestrutura urbana não acompanharam o ritmo acelerado de adensamento populacional nesses locais. Um estudo do BNDES e da Corporação Financeira Internacional, do Banco Mundial, mostrou que, entre 2000 e 2016, o país investiu 2,1% do PIB em infraestrutura. Em resumo: há mais carros e caminhões circulando nas cidades, mas a estrutura viária é praticamente a mesma há anos.
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) deixa sob a responsabilidade dos municípios regular o fluxo dos veículos de carga dentro das cidades. Na maioria dos grandes centros urbanos brasileiros, os caminhões são impedidos de circular durante o dia, mesmo que para fazer o abastecimento de produtos para o consumo da população.
O vice-presidente Extraordinário de Relações Internacionais da Associação Nacional dos Transportadores de Cargas e Logística (NTC Logística), Ademir Pozzani, critica a falta de uma política pública adequada e eficiente para regular esse fluxo e criar alternativas viáveis para circulação de cargas.
Pozzani defende que a entrega de cargas nos grandes centros urbanos ocorra no período noturno. Assim, reduz os congestionamentos no trânsito e a emissão de poluentes no meio ambiente.
“Numa cidade como São Paulo, um caminhão leva até três horas para transpor os 20 quilômetros da Marginal Tietê durante o dia. Se esse trajeto fosse feito durante a noite, o tempo baixaria para 20 minutos, no máximo.
É menos trânsito, menos poluição, além de impactar diretamente na produtividade e no preço do frete”, aponta. No caso da Marginal Tietê, os caminhões estão proibidos de circular entre 5h e 9h e das 17h às 22h, de segunda a sexta-feira, e das 10h às 14h aos sábados.
O engenheiro ambiental Ivo Reck Neto, especialista em Transportes Terrestres, destaca a necessidade de se recorrer a veículos menores para fazer o transporte dessas cargas. E, dessa forma, evitar alterações na dinâmica das cidades.
O arquiteto e urbanista Ricardo Côrrea da Silva, da TC Urbes, consultoria especializada em mobilidade e planejamento de espaços públicos, defende o uso novos tipos de veículos pedaláveis com estrutura para fazer o transporte de carga – conhecidas como cargo bikes – no lugar dos VUCs (veículos urbanos de carga).
“Essas bicicletas conseguem entregar 85% das cargas, porque a maioria são produtos de pequeno porte. E a bicicleta tem a vantagem de fazer um número de viagens muito maior que o caminhão e não causar impacto ambiental”, argumenta.
Para as cargas maiores, Côrrea defende a construção de um hidroanel interligado a outros meios de transporte, entre eles a bicicleta. “A infraestrutura urbana precisa ser alterada e adaptada aos novos modais. Hoje o espaço das cidades ainda é destinado principalmente aos carros”, reforça