Davi Bertoncello

Diretor de relações institucionais e cofundador da Tupi Mobilidade

Protecionismo lá, oportunidade cá: o Brasil como epicentro da mobilidade elétrica

Com o aumento das barreiras nos Estados Unidos, montadoras europeias e chinesas buscam mercados mais abertos, especialmente para veículos elétricos. Foto: Adobe Stock

Há 2 dias - Tempo de leitura: 3 minutos, 26 segundos

A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos e seu pacote protecionista podem, à primeira vista, sinalizar incertezas globais. Para o Brasil, esse movimento abre um horizonte de oportunidades. No universo da mobilidade elétrica, o País não apenas mantém sua posição estratégica, como também desponta como um dos principais destinos para novos investimentos globais.

O retorno de Trump à Casa Branca reacendeu o manual clássico do protecionismo: tarifas sobre produtos chineses e restrições às importações de veículos elétricos europeus. O mercado americano, outrora símbolo de oportunidades, agora se fecha, forçando empresas globais a buscarem alternativas. É aqui que o Brasil entra em cena, conectando interesses estratégicos entre Ocidente e Oriente.

Com o aumento das barreiras nos Estados Unidos, montadoras europeias e chinesas buscam mercados mais abertos, especialmente para veículos elétricos. Nesse cenário, o Brasil surge como a escolha natural, oferecendo condições únicas para expansão e consolidação do setor.

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Por que o Brasil?

O País reúne fatores únicos: um mercado consumidor robusto e crescente, abundância de energia renovável que reduz custos e reforça a sustentabilidade, recursos naturais estratégicos, como o lítio, e uma infraestrutura elétrica apta para a transição. Além disso, a matriz elétrica brasileira, mais do que 90% renovável e com forte participação de hidrelétricas, energia solar e eólica, cria um ambiente ideal para a eletrificação da frota.

Esses elementos explicam o protagonismo atual de marcas como BYD, GWM e JAC, que já consolidaram o Brasil como seu maior mercado fora da China. Marcas emergentes, como Neta, Omoda, Jaleco e Zeekr, reforçam o avanço chinês por aqui, trazendo modelos cada vez mais competitivos em preço e tecnologia.

Do lado europeu, o acordo Mercosul-União Europeia, firmado em dezembro de 2024 após 25 anos de negociações, destrava novas possibilidades. Esse tratado pode transformar o Brasil em um refúgio estratégico para montadoras europeias diante do cerco protecionista nos Estados Unidos. Empresas como Volkswagen e Renault já demonstraram interesse em fortalecer suas operações no País, aproveitando o potencial de exportar para toda a América Latina.

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Oportunidades e desafios para o Brasil

O protecionismo americano já levou marcas como Tesla a explorar mercados emergentes, enquanto a crescente presença de marcas chinesas e europeias no Brasil promete uma competição saudável. O resultado é claro: mais modelos de veículos elétricos, preços mais competitivos e avanços em tecnologias de recarga.

Entretanto, a oportunidade vem com desafios. Recentes decisões do governo de São Paulo, por exemplo, levantaram preocupações no setor. A elevação do IPVA para veículos elétricos, que antes eram isentos, e a revisão de isenções fiscais para empresas do segmento enviam sinais negativos ao mercado. Essas políticas criam um ambiente de incerteza para investidores e consumidores em um momento crítico de transição global para a mobilidade elétrica.

Para consolidar sua posição como protagonista da nova economia elétrica, o Brasil precisa de políticas públicas que privilegiem a inovação e a sustentabilidade. Isso inclui a ampliação da infraestrutura de recarga, o incentivo à produção local de baterias e componentes, além de uma regulamentação clara para fomentar o uso de veículos elétricos em larga escala.

Se o País não enfrentar essas questões de maneira estruturada, corre o risco de comprometer seu avanço e perder espaço para outros mercados emergentes.

Em 2025, o Brasil tem uma escolha clara: ser um dos líderes da transformação global da mobilidade elétrica ou ficar preso a políticas que não refletem as demandas do futuro. Enquanto os Estados Unidos erguem muros, devemos construir redes — de recarga, de inovação e de sustentabilidade.