Transporte público em São Paulo é injusto, diz a pesquisa de Pedro Logiodice sobre comparação entre zonas centrais e periféricas
Os meios de transporte público em São Paulo são injustos e propagam uma desigualdade econômica e racial da cidade. É isso o que diz a pesquisa de mestrado de Pedro Logiodice, com orientação de Mariana Giannotti, ambos da USP, apresentada como artigo publicado na Urban Studies deste ano.
A pesquisa envolveu a cidade de SP e seus milhões de usuários do bilhete único, que possui o registro das transações feitas pelos passageiros, como base de dados. Como metodologia, Logiodice utilizou uma matriz baseando-se nas zonas de origem e destino dos passageiros, nos picos da manhã e da tarde para entender o padrão de deslocamento para cada grupo social e a racial desses trabalhadores, pois estas informações não existiam em São Paulo.
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Utilizando esses deslocamentos e comparando com o censo disponível da época da pesquisa que era o Censo 2010, Pedro conseguiu definir que as pessoas de zonas mais afastadas eram de classe baixa e majoritariamente da negras, pegando o transporte em locais com menor oferta de ônibus e outros modais, com maiores taxas de superlotação nos veículos.
Outro ponto encontrado foi a diferença no preço médio pago por passageiros de zonas mais centrais, que, segundo resultados da pesquisa, eram na sua maioria, pessoas brancas de alta e média renda, e variavam de R$ 6,00 a R$ 9,00. Ao comparar com o custo para a população negra mais afastada, percebeu-se uma dobra no valor, chegando a R$ 18,00 diários. Como resultado, a pesquisa definiu regimes de mobilidade privilegiados e precários.
“Há na verdade um legado colonial nos sistemas de transporte, na sua organização e regime. Enquanto alguns afirmam que é apenas uma desigualdade, os resultados mostram na verdade que é uma injustiça”, afirmou Pedro.
Para ele, a pesquisa mostra que para o transporte ser privilegiado em alguns locais, ele tem que ser precário em outros, aumentando ainda mais a distorção.
A Tarifa Zero está sendo pesquisada pelo Governo Federal a fim de ser um plano nacional. Questionados sobre se essa seria uma solução possível para acabar com essa desigualdade social no transporte público, Pedro e Mariana afirmaram que a medida deve ser introduzida com cautela.
Para Logiodice, o autor do artigo, a primeira questão que deve ser resolvida é a superlotação no transporte público. Isso passa por uma realocação e incremento de frota na periferia. A médio e longo prazo, governantes devem chegar com mais opções de transporte público nessas regiões, como o metrô. Ele menciona a política de tarifa zero como um política pública que deve ser testada após resolver o primeiro problema da superlotação.
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Mariana Giannotti, orientadora do artigo que foi o tema de mestrado de Pedro, afirma que deve-se pensar com muito cuidado a política de tarifa zero, porque primeiro é importante garantir uma frota que ofereça serviço de qualidade, evitando superlotação e deixando a viagem mais confortável para os passageiros. “O problema da tarifa zero, para mim, se compara com o do ensino público, em que todo mundo pode entrar mas o uso e a precarização do serviço vai deteriorando o sistema”, afirmou.
Para ambos, o problema de realocação e aumento das frotas envolve muitas questões como concessionárias, governos, projetos e política. “Alguns municípios como São Paulo até têm transparência nos contratos com as empresas de ônibus, mas em cidades menores, isso é uma ‘caixa-preta'”, disse Giannotti.
Outra questão levantada na conversa foi o custo que esses deslocamentos causam ao Governo: “Além de tudo isso, as pessoas que perdem 4 a 5 horas no trânsito por conta do transporte público estão deixando de gerar riqueza. Seria um ponto para o Estado colocar na ponta do papel quanto dinheiro ele perde por conta deste sistema desigual”, finalizou Mariana. O estudo não tinha essa conta na publicação, mas seria um novo olhar econômico da pesquisa.