Há cerca de 30 anos, as Linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda são a segunda casa de Elisabeth Quintiliano da Silva, 58. A supervisora de tráfego da ViaMobilidade iniciou a carreira na ferrovia como uma das primeiras mulheres maquinistas do Estado de São Paulo.
Já Jaqueline de Oliveira Calixto, 35, começou a trabalhar na CPTM em 2009, quando prestou o concurso para Aluno Aprendiz pelo Senai James Stewart. Na época, ela se interessou pelo curso de manutenção na área de ferrovia pela novidade. Ninguém da sua família era ferroviário.
Carolina Mitsiru Miashiro, 39, é engenheira especializada em engenharia de segurança do trabalho e há três anos se tornou a primeira mulher chefe do departamento de circulação de trens da CPTM, área que concentra a equipe de 420 maquinistas das linhas 7 e 10.
As três mulheres construíram sua carreira no mercado ferroviário e contam a seguir como é ser uma líder em um contexto onde a tradição masculina ainda prevalece.
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Em 1993, Elisabeth ingressou em uma turma composta por 15 maquinistas, sendo 12 homens e 3 mulheres, pioneiras na função naquele momento. Quando se inscreveu para a vaga, tinha o desafio de sustentar sozinha sua filha de 20 dias.
“Mesmo com as dificuldades do puerpério e a recuperação do parto, decidi fazer a inscrição. Foi uma oportunidade para eu ter um bom trabalho e criar minha filha sozinha”, relembra ela.
Na época, o processo seletivo incluía triagem por altura, teste de força, prova de raciocínio lógico, conhecimentos gerais e um exame psicotécnico. Elisabeth passou em todas as etapas e conciliou o período de treinamento com a rotina de cuidados da filha recém-nascida, com a ajuda da mãe.
Quando iniciou a atuação como maquinista, deixava a filha na creche, na Estação Júlio Prestes, e seguia para sua rotina. Vencendo o cansaço diário, criou sua filha, que hoje está com 30 anos, colhendo os frutos do trabalho na ferrovia.
Em um universo com quase 400 homens, Elisabeth ouvia comentários sexistas, dos pares e passageiros: “Quando tinha alguma falha, mandavam a gente ir pilotar fogão ou lavar louça. Eram coisas que aconteciam na operação e poderiam acontecer com qualquer um, mas falavam essas coisas para mim porque sou mulher. Só que eu nunca me abalei com isso.”
Com o passar dos anos, Elisabeth se tornou supervisora de tráfego e viu cada vez mais mulheres entrarem na ferrovia, uma consequência de ações afirmativas da empresa, como a criação de uma campanha permanente para aumentar a contratação de mulheres e a formação de uma turma exclusiva de operadoras de trem.
“A ferrovia foi um presente para mim. Tudo o que eu tenho veio daqui e me sinto muito realizada, tanto como pessoa quanto financeiramente. Quando alguém me pergunta o que eu sei fazer de melhor em minha vida, a resposta é clara: uma é cozinhar e outra é ser ferroviária”, finaliza ela.
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Carolina (foto acima) ingressou na CPTM como analista no departamento de circulação de trens, em 2012. A área concentra a equipe de 420 maquinistas das linhas 7 e 10 da CPTM. “Atuar em um ambiente majoritariamente masculino exige jogo de cintura e firmeza. Em alguns momentos ouvimos falas preconceituosas, muitas vezes a pessoa não chega a ter consciência de que a fala é machista. Porém, com o aumento da presença feminina esse pensamento vai perdendo a força. As pessoas vão assimilando a mudança”, diz.
Há três anos, após um processo seletivo, foi nomeada chefe do departamento, a primeira mulher a assumir o cargo. “Quando assumi o cargo recebi muitas felicitações, principalmente de outras mulheres. Isso mostra o quanto é importante termos representatividade feminina e o quanto torcemos umas pelas outras. Cada vez que uma mulher conquista uma promoção, ela está abrindo caminho para que haja mais mulheres neste espaço”, diz.
A profissional defende que uma equipe diversa entrega mais resultados. “Às vezes ouço, dentro e fora da empresa, que ‘as mulheres vão tomar os lugares dos homens’. Ainda somos, proporcionalmente, minoria nos cargos de liderança. Não se trata de tomar posições, mas de aumentar a nossa participação. Quanto maior a diversidade, melhores são os resultados globais. Trabalhamos de forma complementar e não de forma competitiva.”
Jaqueline (acima) está há 15 anos na CPTM. Foi estagiária, técnica de manutenção e atualmente é supervisora de manutenção. Sua equipe é majoritariamente masculina. “Tive a sorte, se essa pode ser a expressão utilizada, de ser recebida por pessoas incríveis. É lógico, que existem aqueles que olham para mulher naquele ambiente e julgam. Muitos falam que aquele não é o lugar para mulheres, mas eles são a minoria”, diz.
Ela conta que ainda existem pessoas que veem diferença entre os profissionais homens e mulheres. “Mas já é muito melhor e a conscientização é a forma de mitigar esse tipo de pensamento. O profissional não é definido pelo sexo, mas sim pelo empenho, dedicação, respeito e pelo conhecimento”, fala.
De acordo com o presidente da CPTM, Pedro Tegon Moro, a companhia possui cerca de 6 mil funcionários, sendo que 20% são mulheres.
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