A Foton prepara várias novidades para o Brasil. Entre elas, está um caminhão elétrico e uma linha de semipesados. De acordo com o CEO da empresa no País, Márcio Vita, os testes com o elétrico começam em breve. Em entrevista exclusiva ao Estradão, o executivo diz que a marca pretende ocupar o espaço deixado pela Ford.
Nesse sentido, a Foton estreará nos segmentos de 17 toneladas e 24 t. Para isso, conta com 38 concessionárias no Brasil. Desse total, 28 eram da Ford Caminhões. Além disso, a marca promete ter 50 pontos de atendimento até o fim de 2021.
A Foton Caminhões chegou ao Brasil em 2010. Nesses dez anos no País, não faltaram dificuldades, segundo Vita. Ele cita, por exemplo, o Inovar-Auto. O programa do governo frustrou os planos da marca de importar caminhões da China.
Junto com investidores brasileiros, a empresa iniciou a construção de uma planta em Guaíba, na região metropolitana da capital gaúcha. No entanto, uma crise política seguida por outra na economia interromperam os planos.
Em 2020, a Foton anunciou o lançamento de seu primeiro caminhão feito no Brasil. Porém, como a fábrica não está pronta, a produção ficou a cargo da Gefco Indústria.
A linha de montagem fica ao lado da área onde a Foton promete erguer sua fábrica no País. Segundo a empresa, a planta deve entrar em operação em 2024 ou 2025.
Lançado em 2020, o caminhão faz parte da gama Citytruck. Segundo a Foto, o Peso Bruto Total (PBT) é de 3,5 t. A gama conta ainda com versões de 6,5 t e 11 t. A dupla também foi lançada no ano passado. Porém, é importada da China.
Com isso, 2020 foi o ano em que a Foton alcançou a maior representatividade no Brasil. Nesse sentido, colabora a expansão da rede de concessionárias. Além disso, a empresa iniciou testes com caminhões a gás.
Segundo Vita, 2020 também foi o melhor ano para a Foton na China. Aliás, a marca tem 24 anos. Assim, apesar da pandemia da covid-19, a empresa produziu 680 mil caminhões em 2020.
“Contudo, o mercado chinês de caminhões enfrenta uma certa estagnação”, diz Vita. Segundo ele, houve até dois anos seguidos de leve queda. “Por isso, as empresas passaram a valorizar ainda mais o mercado internacional. Para a Foton, o Brasil está em primeiro lugar.”
Como o senhor avalia a atuação da Foton Brasil nesses 10 anos de operação?
Foram muitos os desafios. Como o Inovar-Auto, crise econômica, impeachment (presidencial) e pandemia. Costumo dizer que nesses dez anos a Foton venceu desafios que uma empresa pequena não encararia. Tivemos muito o suporte da matriz. Mesmo porque o Brasil é um mercado importante para a empresa em diversos aspectos.
Os chineses usam o mercado de caminhões do Brasil para se espelhar. Ou seja, tudo o que demandamos com relação à segurança e emissões, por exemplo, eles incorporam nas linhas de produtos. Além disso, as leis brasileiras são exemplos para eles. É o caso do Código de Defesa do Consumidor e da Lei Ferrari, que regula o setor de concessionárias.
Nesse sentido, o mercado brasileiro está mais próximo dos chineses que o europeu ou americano, por exemplo. Até por isso, só conseguimos homologar os primeiros caminhões para o Brasil em 2011.
E foi quando fomos pegos de surpresa pelo Inovar-Auto. A ideia era importar os caminhões. O acordo que tínhamos previa criar uma demanda no Brasil por cerca de três anos. Só depois disso partiríamos para a montagem local.
Quando o Inovar-Auto chegou a Foton já havia importado veículos?
Sim, foi uma reviravolta. Tínhamos embarcado um lote grande de caminhões. Eram quase 300 unidades. Mas tivemos de rever todo o plano. Levamos quase um ano e meio estudando o projeto. Isso para nos adaptar às demandas do programa.
Uma das dificuldades foi viabilizar o investimento na fábrica. Essa era uma imposição do governo federal para termos direito a uma cota de importação de dois anos. Foi quando decidimos pelo Rio Grande do Sul.
Foi por isso que o início das vendas demorou a ocorrer?
Sim. Em 2013, conseguimos vender o primeiro caminhão no País. Nesse sentido, podemos considerar que há sete, quase oito anos, estamos no mercado brasileiro com experiência de vender caminhões de até 11 toneladas. E continuamos enfrentado uma série de dificuldades.
Ou seja, crises, pandemia, alta do dólar, que sobe 20%, 30% em um período muito curto. Para, de repente, cair. Isso cria uma série de incertezas para todas as marcas. Mesmo assim, nunca pensamos em desistir. A Foton acredita no Brasil.
Somos diferentes de outras marcas que estiveram no Brasil e acabaram indo embora. Passamos e continuamos passando por inúmeras dificuldades. Mas em nenhum momento tivemos dúvidas sobre o potencial da Foton no Brasil.
Dá para dizer que essa é uma trajetória marcada pela resiliência…
Com toda certeza. O fato de iniciarmos a produção no Brasil é uma prova disso. Ou seja, mesmo nos momentos difíceis a gente queria acelerar a produção. Nesse sentido, começamos a montar os primeiros caminhões em 2017 e não paramos mais. Além disso, ampliamos o leque de opções com a importação de caminhões.
Os chineses nos apoiam com tecnologia, engenharia e equipamentos. Ou seja, os caminhões lançados em outubro de 2020 no Brasil já saem com tecnologias que serão exigidas no Brasil apenas em 2025.
Além de lançar a linha Citytruck, a Foton iniciou testes com caminhões a gás. O que a marca trará de novidade?
Do segmento de semileves, temos uma geração completa. Os caminhões têm Cummins, câmbio ZF e freios Wabco produzidos no Brasil e exportados para a China. Também temos o caminhão a gás. Além disso, estamos estudando a possibilidade de trazer a tecnologia elétrica ao País.
Há planos de trazer caminhões elétricos e ter oferta ampla de veículos a gás no Brasil?
A Foton está na vanguarda das tecnologias alternativas ao diesel. Em 2010, a marca já vendia na China uma série de veículos elétricos, inclusive ônibus. Além disso, o desenvolvimento de caminhões autônomos está em fase avançada. Assim, é possível constatar o quanto a Foton é inovadora. Por isso vamos, sem dúvida, introduzir as duas tecnologias aqui.
Qual opção é melhor para o Brasil: gás, elétricos ou as duas?
Vejo o gás como uma tecnologia imediata. E acredito que o gás será a transição para a eletromobilidade ou outras tecnologias menos poluentes que o uso de diesel. No caso do elétrico, há entraves como o custo maior na hora da compra, a autonomia relativamente reduzida, valor de revenda e durabilidade das baterias, por exemplo. Porém, essa tecnologia é uma realidade e há muitos clientes interessados. O GNL (gás líquido) também está no nosso radar, sobretudo no segmento de caminhões maiores.
Quando essas tecnologias chegarão ao Brasil?
Em 2020, nos dedicamos bastante ao desenvolvimento de tecnologias alternativas ao diesel. E, no momento correto, quando a demanda estiver adequada, vamos lançá-las no Brasil A Foton tem grande capacidade de produção desse tipo de veículo. No caso do caminhão a gás, estamos na etapa de avaliação ainda. Não podemos cometer erros. Por isso, o lançamento ocorrerá no momento certo. Com relação ao elétrico, vamos importar um lote para iniciar os testes no País.
Os testes com os elétricos começam neste ano?
Muito provavelmente, sim. Com o caminhão a gás, os testes são mais demorados. No caso do elétrico, estudando com muito cuidado quais versões seriam mais adequadas ao Brasil. Agora, estamos avaliando possíveis parceiros locais. Dessa forma, acredito que teremos novidades até o fim deste ano.
A Foton está preparada para a P8, que deve entrar em vigor no Brasil em 2022?
Sim. Estamos e temos produtos adequados para atender a lei, quando ela entrar em vigor.
Existe uma forte pressão para postergar o início do P8 (Euro 6). Como o senhor avalia isso?
O Brasil planeja, as fabricantes desenvolvem e gastam dinheiro. Aí, chega a hora de a lei entrar em vigor e isso não ocorre. Ou seja, fico com a impressão de que jogamos dinheiro fora. Adiar representa custo e cria frustração. Entendo que o certo seria manter a data prevista inicialmente.
Por outro lado, é preciso entender o País como um todo e os impactos que a nova tecnologia vai trazer. Um deles é o aumento do preço dos produtos, assim como ocorreu quando migramos do P5 para a P7. E nem todas as empresas naquele momento, em que o mercado estava aquecido, conseguiram diluir o custo.
Alguns setores argumentam que renovar a frota seria mais eficaz do que o P8. O que o senhor acha disso?
Quanto de benefício trará a mais o movimento de P7 para P8 comparado à renovação da frota? Se eu tivesse que defender algo, seria a renovação da frota. Primeiro porque isso é mais eficaz. Além disso, migrar de P7 para P8 em um momento como o atual, repleto de incertezas, não me parece ser adequado.
Em 2020, a Foton lançou modelos leves e médios no País. Qual é a importância desses produtos para a marca?, Acreditamos muito nesses produtos. Mesmo porque, esse segmento ficou carente de novidades. Temos condições de atender o segmento da mesma forma como a Ford fazia. Nossos preços são competitivos e os caminhões são superiores em tecnologia e capacidade de carga. Além desses, temos a versões de 3,5 t de PBT, produzida em Guaíba.
É verdade que a Foton trará a opção de 9 t dessa família ainda em 2020?
Sim. Esse caminhão está sendo homologado. E deverá chegar ao mercado no segundo semestre de 2021. Trata-se de um produto bastante avançado. Ou seja, ele traz tecnologias de ponta, assim como os demais modelos da família Citytruck.
Em 2020, a Foton anunciou que terá caminhões semipesados no Brasil. Em que pé está isso?
Sim, é verdade. Nossa expectativa é lançar caminhos de 17 t e 24 t no mercado brasileiro em 2022.
Nesse caso, haverá opções vocacionais para cobrir o espaço deixado pela Ford?
Sem dúvida. Estamos estudando isso com a rede. Não queremos tomar essa decisão sozinhos. O Brasil tem grandes parceiros que podem adequar os produtos. Do mesmo modo, torná-los vocacionais e nos ajudar nesse processo.
Na China, a Foton tem caminhões em todos os segmentos. A marca pretende vender pesados no Brasil?
É um objetivo dos chineses introduzir toda a gama de produtos no Brasil. Fomos nós que invertemos a estratégia de como os caminhões chegariam ao País. Os chineses queriam começar pelos pesados. Mas. como na China a Foton é mais forte em leves, resolvemos começar por esse caminho.
Seja como for, a Foton nunca desistiu de trazer os pesados ao Brasil. Em algum momento, isso vai ocorrer. Precisamos nos consolidar no mercado. Até por isso a Foton se espelha tanto no mercado brasileiro de caminhões. Então, quando vier o novo caminhão deve ter um bom preço e não deixar dúvida em relação à qualidade. O mercado brasileiro é muito bem preparado e bastante profissional.
Como está o andamento do projeto da fábrica de Guaíba?
O projeto e as partes civil e ambiental estão prontos. A fábrica deverá estar pronta até 2025. E a melhor decisão foi optar pelo Rio Grande do Sul. Me refiro aos benefícios fiscais, qualidade da mão de obra, localização e utilização do porto. Mas o maior investimento será em engenharia. O objetivo é desenvolver produtos locais e testar protótipos.
Além disso, precisamos entender como o equipamento funciona na operação do cliente. E também conversar com nossos fornecedores. Isso demanda mais do que ter uma planta. Também precisamos ter um volume de vendas consolidado.
Assim, vamos criar a demanda e ter mais segurança. Nesse sentido, os caminhões de 6,5 t e de 11 t, que atualmente são importados, devem ser nacionalizados. Isso está em fase de estudo.
Quando esses caminhões devem ser produzidos aqui?
Em breve. Isso vai abrir espaço para importarmos outros modelos. Assim, seguiremos a mesma receita. Ou seja, havendo demanda, os novos modelos importados também vão ser nacionalizados. Logo, a importação é importante porque vai permitir avaliar a aceitação dos produtos.
Depois disso, vamos criar uma demanda mínima para depois nacionalizar. Esse é o processo. Mas no atual momento temos de ser cautelosos. Há seis meses estamos operando intensamente com a rede de concessionárias. E devemos lembrar que isso ocorre em meio a uma pandemia. Não temos pressa.
A produção local facilita essa consolidação? Os importados, sobretudo pesados, sofrem preconceito?
Acredito que nossos produtos já venceram a barreira do preconceito. Ou seja, os caminhões da Foton têm muita tecnologia embarcada. Muitas delas são de grandes marcas internacionais. Logo, não dá para dizer se o modelo é alemão, italiano ou chinês. Trata-se de um produto globalizado.
Aliás, como eu já citei, o freio é brasileiro e o câmbio é feito na Hungria. Além disso, nossos clientes estão satisfeitos. Tanto com os produtos quanto com os serviços. Mas isso não muda a necessidade de termos produção nacional. As vantagens em fabricar aqui e ter produtos focados no consumidor local são enormes.
Como dá para ser competitivo na hora de importar um veículo com o dólar nas alturas, como agora?
O dólar não afeta muito a Foton. Temos proteções contra a alta do dólar e uma série de ferramentas financeiras para tratar disso. É óbvio que quando o patamar do dólar muda de forma permanente, temos de nos adequar à nova realidade. Mas esses altos e baixos das últimas semanas não nos afetam tanto.
No momento, o maior desafio está no custo do frete. Saímos de um valor de US$ 1 mil a US$ 1,5 mil para um container de 40 pés, para US$ 10 mil. Estamos falando de um aumento de dez vezes. É muito. Porém, não dá para repassar esse aumento de custo para o mercado.
Como a Foton tem lidado com a questão da alta do frete?
Estamos buscando um conjunto de soluções. A Foton exporta de 70 a 90 mil veículos por ano a partir da China. Logo, a empresa tem bons acordos com as companhia marítimas. Mesmo assim tivemos de reduzir as margens de lucro e repassar alguma coisa da alta do custo para o mercado.
Todavia, a questão do frete deve ser temporária. Com a pandemia houve um desbalanceamento global. Assim, houve mudanças de rotas. Além disso, em algumas o volume transportado chegou a triplicar. Ao mesmo tempo, em outras houve redução. Tudo isso impacta o preço do frete.
Há cerca de dois mil caminhões Foton rodando no Brasil. Como está a fidelização dos clientes?
Esse número é bem expressivo. Ainda mais se a gente considerar que os modelos feitos no País estão concentrados nos centros urbanos. Sobre recompra, não tenho dados exatos. Mas posso afirmar que a maioria dos clientes compra nossos modelos novamente. O caminhão é robusto e confortável. Além disso, o custo de operação é baixo e o preço, competitivo. Além, disso, graças à parceria com o banco Santander oferecemos planos de financiamento muito competitivos. Tudo isso ajuda a acelerar o crescimento de participação.
A Foton tem 38 concessionárias, das quais 28 eram da Ford. Logo, essa rede ajuda a chegar mais perto do cliente? Com certeza. A rede foi uma das grandes responsáveis pelo sucesso da Ford Caminhões no Brasil. Essa experiência de tantos anos é muito importante. Sobretudo no serviço vocacional. Além disso, temos o vigor dos concessionários que acreditaram na Foton desde o início. Eles estão conosco há muitos anos e conhecem bem os produtos. Para fortalecer esses laços, no fim de 202 criamos a Abrafoton. Ou seja, a associação de concessionários da Foton.
Quais são os planos da Foton para expandir a rede de concessionárias no Brasil?
Nosso objetivo é ter 50 pontos de venda até o fim de 2021. Nos próximos meses, vamos inaugurar três lojas, somando 41 concessionárias. Há praças que ainda não atendemos, sobretudo no Nordeste. E há áreas em que só temos uma rede.
Dessa forma, o concessionário que já está conosco tem opção de ampliar sua atuação. Também estamos abertos a novos investidores. Porque há muito espaço para crescer no País. Ter produção local também nos ajudará a chegar aos 50 pontos de atendimento ainda neste ano.
As vendas de caminhões estão em alta no Brasil. Como está o mercado para a Foton?
O mercado de caminhões no Brasil é muito importante. Afinal, quase 80% de todos os produtos movimentados no País são transportados pelo modal rodoviário. E o mercado continua em expansão. Além disso, há uma demanda reprimida por causa das crises econômica e sanitária. Nesse cenário, há muito espaço para crescer. Acredito que a alta em 2021 vai ser de uns 15%. Ou talvez até um pouco mais do que isso.