Os reflexos da pandemia da covid-19 são percebidos em todas as esferas da sociedade e no setor de mobilidade não é diferente. Levantamento da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), divulgado ao final de março, mostra que a redução de 1,6 bilhão de passageiros dos trens urbanos e metrôs no Brasil em 2020 gerou queda de receita de R$ 8 bilhões. É uma situação que deve piorar com o agravamento da pandemia.
Pode parecer estranho falar da redução no número de passageiros no transporte público enquanto vemos trens, metrôs e ônibus lotados. Apesar de a aglomeração ser um agravante na propagação da covid-19, a solução do problema da superlotação exige uma série de medidas, com três frentes preponderantes: subsídio para o transporte público; recuperação da confiança dos usuários; e medidas de longo prazo para gerar um sistema mais eficiente.
O subsídio é um ponto emergencial para manter o transporte público operando. Com um modelo gerido, na maior parte, por concessões privadas, as despesas (e o lucro) das empresas do setor, geralmente, são remuneradas pelas passagens vendidas. Essa queda no número de passageiros gera uma situação extremamente difícil para essas empresas, com os altos custos de infraestrutura necessária (principalmente, no caso do Metrô).
Ao falar de subsídio, é preciso entender que essa é uma questão mais profunda que o momento emergencial e considerar que existem várias realidades no Brasil. Em São Paulo, parte da tarifa é subsidiada, mas há grandes cidades que não têm nenhum incentivo do Poder Público e o transporte passa a ser um custo, totalmente, dos usuários, na contramão do que acontece na maior parte dos países desenvolvidos, como os Estados Unidos e a Europa, em que a média do subsídio da tarifa é de, pelo menos, 50%.
A segunda questão é recuperar a confiança do usuário por meio de soluções inovadoras. Apesar de haver uma série de medidas que vêm sendo adotadas, como álcool em gel e a obrigatoriedade do uso de máscaras, já existem algumas soluções que melhoram a saúde das pessoas, como filtros dos equipamentos de ar-condicionado dos trens, metrôs, VLTs e ônibus, que captam e eliminam 99% das bactérias e dos vírus (inclusive o coronavírus). Algumas cidades do mundo já começaram a avançar como Londres (Inglaterra), que está implementando esse tipo de filtro em todo o transporte público.
O terceiro ponto é mais complexo e de longo prazo, pois o transporte público no Brasil já tinha uma série de problemas mesmo antes da pandemia. E essa situação deve ser enfrentada. Nas regiões metropolitanas, por exemplo, a gestão do transporte público deveria ser conjunta entre as cidades para incentivar o uso de forma integrada e atender os usuários com mais eficiência, facilidade e ganho de tempo no deslocamento. Tudo isso somado a investimentos para expandir a malha metro-ferroviária. A cidade de São Paulo, que se destaca em termos de mobilidade diante de outras capitais do país, tem entre 3 e 4 quilômetros de metrô para cada 1 milhão de habitantes, enquanto a Cidade do México possui 10, Barcelona, 25, e algumas cidades chinesas contam com mais de 30 quilômetros. Ou seja, apesar da pandemia, temos muito espaço para desenvolver e melhorar o transporte público. Como ponto positivo, o Brasil conta com um parque industrial moderno e empresas dispostas a construir parcerias sólidas com o Poder Público para avançar em infraestrutura, transporte e mobilidade.