A receita lembra a utilizada nos SUVs, segmento que liderou o ranking de vendas de automóveis em 2020. A recém-lançada Honda ADV mistura a praticidade das scooters com o visual aventureiro das motos trail para tentar repetir o sucesso dos veículos esportivos utilitários, mas em duas rodas.
Sua inspiração, entretanto, veio da maxiscooter X-ADV, de 750 cc, também da Honda, porém mais potente, sofisticada e cara. Apesar do visual semelhante à sua irmã maior, a pequena ADV aposta no econômico motor de 150 cc, o mesmo da PCX, líder de vendas entre as scooters.
O objetivo é ser uma opção acessível para quem procura um veículo de duas rodas prático no trânsito urbano, mas também versátil para encarar nossas mal pavimentadas ruas e a extensa malha viária brasileira, em sua maioria formada por estradas de terra.
Criada no Sudeste Asiático, mais especificamente na Tailândia, país com trânsito e infraestrutura viária semelhante à brasileira, a Honda ADV tem tudo para fazer o mesmo sucesso em nosso mercado. Não à toa, Alexandre Cury, diretor comercial da Honda Motos no Brasil, considera o modelo “o principal lançamento da marca no ano”.
A Honda deu grande importância, assim como nos SUVs, ao design e à lista de equipamentos da nova ADV. O objetivo foi aumentar a percepção de qualidade e sofisticação da pequena scooter de 150 cc.
Com linhas angulosas e agressivas para uma scooter desse porte, a ADV tem conjunto óptico duplo com iluminação de LED, presente também na lanterna e nas luzes de direção. O painel totalmente digital com fundo preto também remete às motos de maior capacidade cúbica da marca japonesa. A scooter ainda traz sistema ABS no freio dianteiro, chave de presença (Smart Key) e carregador 12 V no porta-luvas.
A nova Honda ADV não tem a pretensão de tomar a liderança de vendas do segmento scooter da PCX, e nem poderia. Seu preço sugerido de R$ 17.797, no Estado de São Paulo, é maior que o da sua versão mais urbana, a PCX 150 ABS, cotada em R$ 14.236. A previsão da Honda é comercializar 10 mil unidades/ano do modelo, praticamente a metade do que vende a PCX.
Com a mesma base mecânica da PCX, a Honda ADV traz características típicas de scooters urbanas, mas adiciona versatilidade para enfrentar as ruas da cidade e até uma estrada de terra à receita que já faz sucesso em todo o mundo.
O novo modelo poderia ser resumido como uma versão mais aventureira da PCX, mas as mudanças vão além do visual. A ADV tem melhorias no motor e na ciclística para enfrentar com mais desenvoltura e segurança as estradas de terra.
A começar pelo motor. Apesar de ser o mesmo da PCX, com um cilindro, 150 cc, sofreu alterações no sistema de alimentação e exaustão, que melhoraram a entrega de torque e a potência em baixos e médios regimes
. A transmissão é do tipo CVT, ou seja, automática, sem embreagem ou pedal de câmbio. Portanto, basta acelerar que o sistema faz o resto, variando a transmissão conforme os giros do motor.
Na prática, a sensação é de que a ADV tem mais força e vigor nas arrancadas e o motor responde mais rapidamente aos comandos do acelerador. Essa característica se encaixa na proposta do modelo: o torque do motor ajuda a enfrentar uma estrada de terra com mais controle da scooter. Na cidade, também fica claro que a ADV é esperta no “para e anda” entre os semáforos.
Já na estrada, sua limitação aparece: a velocidade máxima fica em torno dos 110 quilômetros por hora e até cai para cerca de 90 quilômetros por hora em subidas mais íngremes. Vale lembrar que a ADV não pretende competir em desempenho com motocicletas convencionais.
Embora tenha havido outras scooters com essa proposta aventureira, a ADV parece ter encontrado a receita ideal entre agilidade na cidade e disposição para rodar na terra. Para isso, adota suspensões com maior curso: na dianteira, o garfo telescópico tem 130 mm de curso (contra os 100 mm da PCX); e, na traseira, os dois amortecedores têm reservatório externo de gás e curso de 120 mm (100 mm na PCX)
.
Em mais de 130 quilômetros percorridos na região paulista de São José dos Campos, mesclando ruas e avenidas com rodovias e estradas de terra, o conjunto mostrou-se macio o suficiente para absorver as ondulações do asfalto e firme o bastante para não chegar ao fim de curso nos buracos de uma via rural, com piso de terra e cascalho.
Além das suspensões, outra característica ajudou a rodar por vias não asfaltadas: os pneus de uso misto. Com desenho em blocos, melhora a aderência e transmite segurança fora da estrada. As rodas são de 14 polegadas na dianteira e 13 na traseira. Uma configuração inusitada nas scooters, mas comum nas motos trail, de uso misto.
A posição de pilotagem também se diferencia da PCX. O guidão mais reto e largo faz com que o piloto fique mais ereto e com os braços abertos, e os cotovelos, flexionados. Com isso, tem mais controle e agilidade para desviar de buracos e encontrar a melhor trajetória até mesmo em uma estrada esburacada. O assento, embora confortável, é mais firme que na PCX.
A frenagem fica a cargo de dois discos de freio, mas o sistema ABS (antitravamento) funciona apenas na dianteira. São suficientes para parar os 127 quilos (a seco) da ADV. Além de reduzir o custo, a falta de ABS na traseira se justifica pela sua proposta: uma das técnicas de contornar curvas mais fechadas na terra é “derrapar” a roda traseira para alinhar a moto.
Claro que não se trata de uma motocicleta off-road, mas admito que a Honda ADV surpreende pelo seu desempenho nos trechos não pavimentados, mas também encara bem valetas e lombadas das nossas cidades. E com a facilidade do câmbio CVT e a economia do motor de 150 cc – em 130 quilômetros, o consumo médio foi de 50,8 quilômetros/litro.
Não é um modelo aventureiro para fazer uma longa viagem, mas vai melhor que a maioria das scooters em uma estrada de chão. Se pensarmos que apenas 12,5% da malha rodoviária brasileira é asfaltada, a Honda ADV deve, sim, repetir o sucesso dos SUVs, uma vez que muitos consumidores moram em áreas periféricas e rurais, em que o asfalto é ruim ou nem mesmo existe.