O direito de ir e vir em meio à pandemia

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07/04/2020 - Tempo de leitura: 4 minutos, 21 segundos

A pandemia causada pela covid-19 vem exigindo dos governos e cidadãos ao redor do mundo ações fortes e coordenadas, muitas vezes próximas aos esforços de guerra. Uma das consequências do estabelecimento de quarentena e isolamento é a restrição ao direito de ir e vir: dos deslocamentos cotidianos e rotineiros ao fluxo de turismo, passando inclusive pelo transporte de insumos.

Partindo sempre do pressuposto de que a nossa maior prioridade neste momento é combater a proliferação do novo vírus e manter a nossa saúde, a dos nossos familiares e a de toda a sociedade, podemos também ver, nesse cenário, uma série de reflexões sobre mobilidade.

A primeira delas é sobre como a liberdade de locomoção é algo valioso. Das pessoas que estão em casa, quem ainda não sentiu uma vontade enorme em dar uma volta nem que seja pelo quarteirão?

Em momentos como estes, percebemos que não valorizamos a relação que temos com nossas cidades. Não se trata apenas de sair do ponto A e ir ao ponto B, mas também sobre a importância de se vivenciar o espaço público e a comunidade em nossa qualidade de vida.

Falta de convivência comunitária

E isso não é algo que conseguimos vivenciar totalmente mesmo em situações de normalidade. Seja porque os congestionamentos nas grandes cidades cerceiam nosso direito de ir e vir, seja porque vivemos em cidades que não foram construídas para a convivência comunitária e não colaboram para o nosso bem-estar quando estamos em público.

Desde a falta de parques e espaços públicos de lazer, passando pela ausência de ciclovias e a falta de transportes alternativos, além do grande volume de asfalto e concreto e das grandes velocidades nas vias públicas para carros.

Uma segunda reflexão importante e inevitável é sobre os desafios ambientais que enfrentamos globalmente. A qualidade do ar das cidades em quarentena tem melhorado, alguns países conseguiram atingir a meta de redução de carbono no ano, e quem não viu as fotos dos canais de Veneza claros e transparentes, sem o alto fluxo de embarcações circulando todos os dias?

Quando as cidades começarem a se mover – e todos torcemos para que seja logo –, não podemos perder de vista o impacto negativo que as decisões de infraestrutura que tomamos no passado têm até hoje, tanto para o meio ambiente como para a saúde dos cidadãos de grandes cidades.

A busca por soluções eficazes e sustentáveis de transporte é fundamental e urgente – a Organização Mundial da Saúde calcula que morrem cerca de 7 milhões de pessoas por ano de problemas causados pela poluição do ar, sem falar no aquecimento global, com as consequentes queimadas, ondas de calor, deslocamentos de cidades inteiras e uma série de outras questões ainda imprevisíveis.

Transformando as cidades

A terceira reflexão, e uma das mais importantes, é o poder que temos quando agimos pelo bem do coletivo. Uma coisa que aprendemos ao longo dos nossos dez anos de existência da Tembici é que, quando uma pessoa começa a pedalar, ela transforma sua própria vida. Quando muitas pessoas começam a pedalar, elas transformam cidades inteiras.

Buscar as pautas comuns diante de uma sociedade muitas vezes polarizada é fundamental. No caso específico da pandemia da covid-19, isso significa tanto proteger nossa saúde como encontrar alternativas para a nossa economia – e para as pessoas mais fragilizadas por ela.

Na Tembici, optamos por não perder nenhum desses pontos de vista. Nossas bicicletas estão servindo tanto como uma opção de transporte individual quanto para as pessoas que estão na linha de frente, como especialistas da área da saúde e funcionários de supermercados, como também para a ciclologística, uma das principais alternativas para consumidores e comerciantes durante o período de quarentena pelo novo coronavírus.

Limpeza das bikes

Claro que temos a saúde dos nossos usuários e colaboradores como prioridade (colocamos mais de 200 pessoas em regime de home office, inclusive nossa central de atendimento). Desde o começo da pandemia, também reforçamos os procedimentos de higienização das bicicletas e estações em todas as cidades que atuamos na América Latina.

Além da rotina de limpeza padrão, todos os dias, ainda no galpão, todas são lavadas com cloro diluído em água e, nas estações, cada bicicleta é limpa com álcool 70%. Mesmo assim, estamos fazendo um apelo aos nossos usuários para que fiquem em casa e deixem as bicicletas e as cidades para aqueles que mais precisam.

Ainda é cedo para dizer o quanto conseguimos aprender de verdade com esse doloroso processo pelo qual estamos passando e quais impactos isso terá na forma como as pessoas se locomovem.

Espero que este momento contribua para um retorno à vida normal com o desejo da real liberdade de ir e vir, em que as pessoas se incomodem com o tempo perdido no trânsito, e optem por formas mais eficientes de deslocamento.