“Temos a meta crescer 24% em 2022”

Presidente do Grupo Rodonaves, fundado em Ribeirão Preto há 41 anos, que hoje inclui concessionárias, corretora e locadoras. Foto: Divulgação Grupo Rodonaves
Tião Oliveira
27/01/2022 - Tempo de leitura: 11 minutos, 13 segundos

Em 1980, o paulista João Braz Naves abriu uma pequena empresa de entregas na rodoviária de Ribeirão Preto (SP), onde trabalhou por dez anos vendendo bilhetes de ônibus.

As encomendas eram levadas na “charmosinha”, apelido que ele deu ao primeiro veículo da Rodonaves – uma bicicleta guardada com carinho até hoje. Pouco mais de 40 anos depois, o Grupo Rodonaves continua atuando fortemente no transporte de cargas, que representa 85% do faturamento.

Também é dono de seis concessionárias de caminhões Iveco, corretora de seguros e locadora de veículos, entre outros negócios. Em 2021, o faturamento cresceu 20%, para R$ 1,7 bilhão. Em entrevista ao Estadão, “seu” João, como o fundador e presidente do grupo é conhecido, falou de investimentos, veículos elétricos, parcerias e do plano de expansão para 2022.

Como foi o desempenho da Rodonaves em 2021?

João Braz Naves: Não esperávamos que seria um ano com pandemia. A gente sempre trabalhou acreditando nas pessoas, no comércio, buscando o melhor resultado. Porém, nossos números foram muito bons.

Crescemos e fizemos investimentos. A gente sente muito quando perde alguém, No grupo, que tem mais de 5 mil colaboradores, perdemos cinco pessoas. Na comparação com 2020, crescemos 20%, para R$ 1,3 bilhão de faturamento. Fizemos investimentos e entramos no modal de transporte aéreo.

Abrimos a Rodonaves Express, que são pontos de apoio para cliente menores. Foram dez unidades na capital e na Grande São Paulo. Um ponto negativo foi o atraso na entrega de veículos que a gente comprou . Mas conseguimos dar conta com a estrutura que a gente tinha.

Quais são as metas para 2022?

Naves: O ano de 2021 serviu como aprendizado e para a gente entender as dificuldades das montadoras e dos fornecedores. Pneu, por exemplo, foi um problema muito sério. Mas nós não paramos, entendemos os fornecedores e eles também entenderam a gente. Deram prazos maiores para pagamento e, mesmo quando não entregavam tudo que a gente tinha comprado, tentavam resolver o problema daquele momento.

Não foi fácil receber caminhão sem pneu, mas isso aconteceu com todo mundo e não abalou a nossa estrutura. Temos uma boa gestão e isso foi muito importante para administrar a situação. Seja como for, recebemos 260 caminhões no ano passado. Alguns segmentos sofreram mais, mas a gente entrou em outros para buscar maior rentabilidade. Não dispensamos ninguém e, em 2022, vamos continuar no mesmo ritmo.

Na primeira quinzena de janeiro sentimos uma queda nos negócios, mas na segunda metade do mês o ritmo voltou a crescer. O grupo tem como meta crescer 24% e abrir 28 novos pontos de atendimento em 2022. Acredito muito no País e nas pessoas. Temos bom relacionamento com nossos clientes e fornecedores e vamos em frente. Tudo vai dar certo.

Como a digitalização impactou os negócios da empresa?

Naves: Nós temos duas situações. O meu maior volume de negócios, uns 70%, é operacional. Ou seja, é mão de obra presencial, que faz o carregamento do caminhão, é o motorista… Então, isso não tem como mudar. Nós tivemos a felicidade de ter pouco afastamento. Mas a digitalização facilitou muita coisa, como as reuniões, por exemplo.

Muita gente trabalhou normalmente de casa. Hoje, estamos 100% de volta. Há mais segurança porque o pessoal está vacinado. Procuramos fazer com que todos fossem vacinados. Aconselhamos todo mundo a tomar a vacina. Não importa se a proteção é de 70%, 80% ou 90%. E as coisas foram melhorando.

Mas muitos setores ainda não voltaram totalmente. De qualquer modo, vamos continuar com esse trabalho. Entendemos que a digitalização é muito boa e só pode melhorar. E estamos acompanhado essa evolução. A digitalização ajudou bastante a melhorar nosso negócio e vai continuar ajudando.

Os caminhões têm cada vez mais tecnologias eletrônicas, o que exige motoristas mais capacitados. Está faltando motorista?

Naves: No mercado está faltando motorista. Acompanho o noticiário e vejo que muitas empresas estão com dificuldade. Hoje o caminhão tem câmbio automático, o banco se ajusta sozinho e tem várias outras facilidades. A gente procura oferecer isso para os nossos motoristas, para melhorar a vida deles, dar mais conforto.

Ficou melhor para trabalhar e é o que os motoristas merecem. Graças a Deus, nosso quadro está completo. E quando aparece alguém bom a gente segura, mesmo não tendo vaga aberta. Ele vai treinando e se preparando para pegar um caminhão assim que surgir a oportunidade. Temos um curso de formação de motoristas criado em 2020 que ajudou a acelerar esse processo.

A nossa escola treina desde o ajudante, o motorista do caminhão pequeno, do maior. Se ele tem o sonho de dirigir uma carreta, nós ajudamos. Pagamos a documentação para que ele seja habilitado e realize esse sonho. Estamos muito felizes por dar essas oportunidades às pessoas. E o mesmo cuidado e respeito que a gente tem com os colaboradores, eles têm com a gente.

Todos procuram fazer um trabalho cada vez melhor, dar mais retorno, evitar manutenção desnecessária. Então, entre nossas metas está cuidar bem do nosso pessoal.

O sr. acredita que haverá caminhão sem motorista rodando no Brasil?

Naves: No futuro, o motorista de caminhão vai ser igual ao piloto de avião. O piloto fica lá na cabine, mas o avião faz quase tudo sozinho. A atual infraestrutura do País não permite receber esse tipo de veículo.

Não dá para virar a página de uma hora para outra. Mas acredito que o Brasil tem de acompanhar a evolução do outros países para a gente ficar ao menos nivelado. E se for esse o caminho, a gente vai seguir em frente e acompanhar.

Não tem como deixar de lado qualquer coisa que a gente perceba que veio para melhorar.

O que é preciso para fomentar o setor no País?

Naves: Naves: No Brasil, o volume de transporte rodoviário de carga só tende a crescer. Apesar de haver novos projetos para ferrovias, parece que o governo está planejando novas rodovias. Em relação à infraestrutura, posso dizer que o Estado de São Paulo é um dos melhores.

A gente viaja muito e conhece lugares bons, mas São Paulo é o mais bem cuidado. Mas a infraestrutura tem de melhorar mais. Acredito na terceirização das rodovias. Apesar de o pedágio ser caro, os veículos ganham velocidade e há mais segurança. Então, se forem feitas melhorias, o setor vai crescer ainda mais.

O preço do diesel e de outros produtos, como pneus, subiu muito. Como lidar a pressão dos custos?

Naves: Se o preço não parar de subir – porque baixar, esquece –, vamos ter problema. Não vamos conseguir repassar a alta dos custos. Há quatro anos, o diesel representava de 33% a 35% do custo da operação.

Agora, passou a ser de 52%, 55% dos custos. É muito e isso está corroendo a rentabilidade. E não é só a nossa, mas do funcionário, do agregado e de todas as pessoas que trabalham no segmento.

A eletrificação e uma solução para reduzir as emissões e os custos. Há clientes procurando caminhões elétricos ou a gás?

Naves: Não existe ainda. Eles sabem que ainda não tem produto nem rede de recarga disponíveis. No caso do gás, isso é menos complicado, porque o combustível está disponível em um bom número de postos. Os clientes, principalmente de multinacionais, procuram por frotas mais novas, que poluem menos.

É assustadora a diferença de preço de um caminhão a diesel para o elétrico. Isso sem contar o custo da instalação dos pontos de recarga. Seja como for, temos alguns caminhões elétricos (da JAC Motors) em testes. Eles estão indo bem, mas não é um caminhão com o qual você possa contar o tempo todo, porque a recarga das baterias leva 22 horas. Estamos trabalhado 7, 8 horas por dia com esses caminhões.

Nossa frota é nova e tem, em média, quatro anos de uso. E a idade já foi de três anos. Tomamos todos os cuidados para que nossos caminhões poluam o mínimo possível. Todo mundo tem de fazer a sua parte para ajudar o País a reduzir as emissões.

Então, com o caminhão elétrico a conta não fecha?

Naves: Não fecha porque para ser rentável o caminhão tem de rodar de dia e de noite. Mas o elétrico fica muito tempo recarregando (as baterias). Como a autonomia é de mais ou menos 200 km, é um caminhão para uso na cidade ou numa região menor.

No caso de um modelo a diesel, a segurança de pegar uma rota diferente ou um desvio é maior. Já com o elétrico, se isso acontecer você corre o risco de não conseguir voltar. De qualquer forma, ele tem vantagens, como não poluir nem fazer barulho. Também não é tão bonito como os outros (risos).

É um caminhão interessante. Pena que ainda não ofereça rentabilidade.

O sr. acredita que o caminhão a diesel para entrega urbana vai deixar de existir?

Naves: Não tem como mudar o mercado em, digamos, os próximos dez anos. Nossa frota em São Paulo tem 215 veículos elétricos. Ou seja, 90% são modelos a diesel. Se os preços não mudarem, o consumidor não vai ter condições de investir.

Tomara que isso melhore e haja mais espaço para a gente negociar e fechar compras. Não sou negativo, sou realista.

O sr. fez parceira com a TAM para o transporte de cargas. Como está essa operação?

Naves: É um trabalho árduo. E, logo depois de começarmos essa operação, em 2020, veio a pandemia e o número de voos despencou. Além disso, o custo do serviço variou muito. Mas estamos fazendo um bom trabalho. Começamos pelas capitais, onde há maior volume de carga e demanda.

No fim de 2021, as contas começaram a ter equilíbrio. Mas trata-se de um investimento pesado, porque garantimos a entrega em até 24 horas. Acreditamos que em 2022 os resultados serão muito bons.

O Grupo inclui concessionárias de caminhões Iveco, corretora de seguros, locadora e transportadora, por exemplo. Qual delas tem maior participação nos negócios?

Naves: Ainda é o transporte. O segundo maior negócio nosso é a corretora de seguros, que tem 25 anos. No caso das concessionárias Iveco, começamos com duas há dez anos e hoje temos seis.

Meu filho fez um trabalho muito forte e estamos colhendo os resultados. Um exemplo é a inteligência no estoque, para nunca deixar o cliente sem assistência.

O agronegócio é outra área em que vamos investir pesado na oferta de caminhões e carretas. Também vêm surgindo boas oportunidades de transporte de carga no Nordeste.

O senhor também oferece locação. Como está esse setor?
 

Naves: Nós temos um grupo muito grande de clientes. O contrato pode ser de 24, 36 ou 48 meses. Não é um consórcio ou um financiamento, mas é uma parceria que permite que o cliente tenha sempre uma frota nova.

Também oferecemos caminhões. A gente não divulga isso no mercado, mas se alguém nos procura, nós atendemos. Trata-se de um bom negócio, que deve evoluir muito neste ano.

A mais empresas buscando por locação em vez de compra?

Naves: Sim, bastante. A procura vem crescendo porque possibilita que o cliente tenha um veículo novo sem precisar desembolsar muito para isso. Assim, ele consegue um veículo para trabalhar, digamos, por cinco anos, com baixa manutenção. É a bola da vez.

O que haverá de novidade em 2022?

Naves: Vamos expandir nosso crescimento e as áreas de atuação, como o Nordeste. Há muita oportunidade no Brasil. Também estamos atuando na área de construção civil.

Temos prédios para uso próprio e também para locação. No caso do Express, vamos aumentar o número de filiais para atender áreas num raio de até 80 km, 100 km. Acreditamos muito no aquecimento do mercado.
 
A Rodonaves tem 41 anos. O sr. começou vendendo bilhete na rodoviária, depois percebeu uma oportunidade na área de transporte, comprou uma bicicleta e começou a fazer entregas. Se pudesse mandar uma mensagem para aquele João de 40 anos atrás, qual seria?

Naves: Eu faço algumas palestras em faculdades. Tem muita gente que acha que tendo um diploma já começa a ganhar dinheiro. Mas não é por aí. A minha mensagem é a mesma de sempre. Tudo o que você fizer com amor, boa vontade e disposição, vai da certo.

Então a mensagem que eu deixo é que o País oferece muitas oportunidades. E quando você investe no seu próprio negócio e tem uma caixinha, começa a acreditar mais. Isso possibilita que você faça o negócio melhorar. Se você está começando, minha dica é “Faça o que gosta.”. 

Pode ser uma vendinha, uma lojinha ou um negócio grande. Tem de encarar e não desistir.