Viajar de moto sozinha é perigoso? Mulheres dão dicas para uma viagem segura

Gisele Favaro já rodou mais de 200 mil quilômetros de moto, grande parte deles sozinha. Fotos: Arquivo pessoal

09/03/2024 - Tempo de leitura: 6 minutos, 34 segundos

Recentemente, o caso da motociclista brasileira, que tem cidadania espanhola, Fernanda, vítima de estupro coletivo, na Índia, gerou indignação e revolta em todo o mundo. Ela e o marido Vicente, que viajam o mundo em suas motos, foram atacados por um grupo de homens, quando pararam para acampar. O casal relatou o caso em seu canal de viagem de moto nas redes sociais. Além de comentários misóginos, alguns culpando a vítima pela violência sexual, muitos criticaram Fernanda por viajar de moto. Mas, afinal, viajar de moto sozinha é perigoso?

Para responder essa pergunta, conversamos com mulheres motociclistas que já viajaram bastante de moto pelo Brasil e também no exterior. Afinal, infelizmente, ainda em 2024, muitas mulheres sentem medo de viajar sozinha de moto. E não sem razão.

O medo e o perigo existem

Daiane Gaia, que já viajou na Europa e, no início deste ano, foi até Ushuaia de moto, afirma que é preciso ter cuidado ao viajar sozinha. “Eu sinto medo, porque sei que estou em desvantagem física”, afirma.

Já a jornalista e criadora do site e canal “Acelerada“, Eliana Malizia, é mais radical. “Viajar sozinha é uma viagem ao autoconhecimento e autoestima, porém, nos dias de hoje, com tantas notícias tristes e tragédias acontecendo, pensaria duas vezes antes de optar por uma viagem solo”.

Eliana Malizia já viajou o Brasil todo de moto, mas não aconselha viagens solo hoje em dia

De acordo com a mineira Gisele Favaro, que também mantém um perfil nas redes sociais, contando suas viagens de moto “viajar de moto sozinha é perigoso sim”. Contudo, diz ela, “não deixo de fazer isso porque é perigoso. Afinal, viver é perigoso”.

Entretanto, todas tomam diversos cuidados para evitar se colocar em risco e passar por situações perigosas. Uma das dicas que as três deram diz respeito às redes sociais. Segundo as motociclistas, nunca se deve postar postar nada sobre a viagem em tempo real. “O ideal é postar com dias de atraso”, ensina Eliana.

Antes de partir

Gisele, que se diz muito precavida, recomenda fazer uma revisão na moto antes de viajar. “Também é importante usar equipamento completo de segurança. Além do capacete, jaqueta, calça, luvas e botas de motociclismo são fundamentais”, explica.

Outro item que deve fazer parte da sua bagagem é um kit reparador de pneus para uma urgência. Dessa forma, você não precisa esperar ajuda na estrada sozinha. “Inclusive, já precisei e meu salvou. Onde o pneu furou não havia sinal de celular para chamar socorro”, alerta Malizia.

As motociclistas também recomendam fazer um seguro da moto e um seguro viagem antes de partir. “Anote em um papel e leve no bolso da jaqueta, os telefones 0800 das rodovias por onde vai passar. Não dá para contar com a internet para buscar telefones em momentos de urgência, pois, quase sempre, não há sinal”, reforça Eliana.

Também é importante levar sempre na jaqueta, um cartão com dados pessoais, cartão do convênio médico, se tiver, além do tipo sanguíneo, e o telefone de contatos de sua confiança.

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“Sempre estudo detalhes da rota que pretendo fazer e converso com muita gente que já viajou por ali”, completa a Favaro, que roda o Brasil com sua Honda Africa Twin 1100.

Cuidados na estrada

Com a moto revisada, pilota equipada e a rota traçada, chegou a esperada hora de fazer sua viagem de moto. “Em primeiro lugar, a mulher tem que entender que é preciso praticar a autorresponsabilidade: é você por você. Você precisar estar mais rápida, reflexos rápidos, ter mais malícia”, ensina Eliana Malizia em suas palestras e cursos para mulheres motociclistas.

Gisele, como boa mineira, diz “não dou bola pra conversa fiada”

Em relação às estradas, as viajantes aconselham optar por rodovias maiores e mais bem estruturadas. Evitando, assim, estradas vicinais e alternativas que, geralmente, não têm sinal de internet e pouco movimento.

Outro cuidado importante enquanto estiver viajando de moto sozinha é saber escolher as paradas. “Sempre procuro parar em postos onde há bastante gente. Me sinto mais segura”, diz Daiane.

Gisele, inclusive, já enfrentou uma situação temorosa durante suas viagens de moto por Minas Gerais. “Parei em um posto, onde havia dois homens visivelmente bêbados que vieram conversar comigo, fazendo muitas perguntas. Nem tirei o capacete e, depois de não dar muito papo, parti para procurar outro lugar”, relembra.

Rota secreta

Aliás, uma dica de ouro, que todas as motociclistas deram foi sobre as conversas nas paradas de abastecimento ou para fazer refeições. “Quando viajamos sozinha as pessoas se aproximam, perguntam muito, inclusive, sobre seu destino e onde será a próxima parada. Jamais conte a verdade”, diz Eliana.

Daiane Gaia aconselha compartilhar a rota da viagem somente com familiares

Gisele, como boa mineira, diz que nunca fala para onde está indo. “A gente dá aquela enganada, né? Diz que vai para uma cidade, enquanto, na verdade, está indo para outra”, brinca. De acordo com elas, o ideal é não revelar nem mesmo qual sentido está indo.

A rota, segundo elas, só deve ser compartilhada com seus familiares e amigos. “Sempre falo para alguém onde estou ou para onde vou”, diz Daiane, que costuma enviar mensagens para a mãe em toda parada, atualizando sobre o andamento da viagem.

Em viagens para locais mais ermos ou para o exterior, a motociclista costuma usar os serviços do “Spot”. Trata-se de um aparelho de GPS, que mostra sua localização em tempo real, com seus contatos de sua confiança. “O aparelho custa cerca de R$ 800. Antigamente, era preciso fazer uma assinatura anual, mas, atualmente, já existem têm planos mensais”, explica Daiane.

Por fim, todas são unânimes e recomendam nunca rodar à noite. “Prefira acordar cedo para fazer uma viagem com calma, sem pressa e ansiedade. Além disso, você chega antes de escurecer ao seu destino”, sugere Eliana.

Prefira cidades maiores e hotéis de rede

Quando for planejar sua viagem, além da rota, também escolha com cuidado as cidades para pernoitar. “Por exemplo, quando fui ao Ushuaia, sempre parei em cidades maiores, onde os motociclistas costumam passar”, ensina Daiane.

Já em relação aos locais de hospedagem todas aconselham a não acampar sozinha. “Se for acampar, use aplicativos de campistas que trazem informações sobre a segurança e higiene do local. Jamais acampe sozinha em camping selvagem. Escolha um acampamento com portaria, vigilância”, recomenda Eliana.

Já Gisele e Daiane não recomendam acampar de jeito nenhum quando estiver viajando sozinha. Ambas preferem hotéis. “Costumo usar o Google Street View, inclusive, para dar uma olhada na região onde fica o hotel”, diz Daiane.

Já Gisele opta por hotéis de redes mais conhecidas. “Ainda assim, quando entro no quarto, olho embaixo da cama, no banheiro, na varanda… Parece coisa de louca, mas fico ressabiada”, diz Gisele.

Na hora do jantar ou quando sair para passear na cidade, as motociclistas recomendam discrição. “Quando conhecer pessoas nas cidades visitadas, nunca diga que está sozinha. Fala que está viajando com amigos e que eles só não estão com você ali no momento”, ensina Eliana.

Gisele ainda recomenda evitar a ingestão de bebidas alcóolicas, uma vez que isso pode deixá-la ainda mais vulnerável. “Se quiser beber, só se for no quarto do hotel com a porta trancada”, alerta.

Por fim, Eliana Malizia diz que “as mulheres claro, são mais vulneráveis, porém acredito que todos os cuidados que mencionei servem também para homens e casais” Contudo, para a motociclista, viajar de moto em grupo, com três ou quatro pessoas, os riscos são bem menores.