Summit Mobilidade: Especialistas debatem os desafios do transporte público
Tarifas altas, falta de infraestrutura e até mesmo ruas com calçadas quebradas são alguns dos problemas que usuários enfrentam, confira a opinião de especialistas
Como tornar o transporte público atraente à população? Foi essa a pergunta que permeou o painel “Desafios do transporte público”, dentro do Summit Mobilidade. Clarisse Cunha Linke, mestre em Políticas Sociais, ONGs e Desenvolvimento pela London School of Economics and Political Science (LSE) e diretora executiva do Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento (ITDP Brasil), entende que a chave é a integração.
No entanto, essa integração deve ocorrer em três frentes: a tarifária, para que os usuários, especialmente os que vivem longe do Centro, não sejam onerados além de suas condições; a operacional, para que o processo de baldeação, por exemplo, não gere uma falta de encadeamento da viagem; e a de infraestrutura, pensando em viagens não apenas de trabalhos produtivos, mas também nos trabalhos e viagens não remunerados, de ida ao médico, de visitas a parentes, de busca pelo lazer.
Para tanto, ela propõe que todas essas variáveis fossem interligadas de forma única, nos moldes das cidades europeias, em que as pessoas se transportam de um modal para o outro como um feixe contínuo. É um cenário no qual, no final das contas, ninguém sabe quem detém ou não aquela concessão e não há tabu, por exemplo, para se rever os contratos, caso as empresas não estejam entregando de fato o que prometeram. ”Precisamos de uma integração institucional”, diz, “à revelia de políticas e interesses intocáveis”.
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Para Sérgio Avelleda, consultor em Mobilidade Urbana e ex-secretário municipal de Mobilidade e Transportes de São Paulo entre 2017 e 2018, há que se prestar atenção à micromobilidade, que trate de soluções que atendam aos deslocamentos curtos. “Costumo dizer que o usuário do transporte público não começa a ser esse usuário quando chega ao ponto de ônibus ou quando embarca na estação de metrô ou trem, mas quando amarra o tênis em casa e decide pegar um transporte público”, afirma.
O cuidado com a rede que conecta casas e empregos lhe parece fundamental para o funcionamento e a atratividade do transporte público. Nesse contexto, calçadas malfeitas, negligenciadas, lhe causam indignação. “Temos 17 mil km de vias em São Paulo e 90% desse espaço é reservado para o automóvel”, diz. “Dedicamos muito mais atenção à infraestrutura do carro do que à das calçadas, apesar de termos muito mais gente usando calçadas do que vias e avenidas”. No seu entender, criar um ambiente de micromobilidade com calçadas atrativas e ruas acolhedoras contribui não só para o maior uso do transporte público como também para uma maior segurança pública.
Manoel Marcos Botelho, secretário executivo de Transportes Metropolitanos do Governo do Estado de São Paulo, entende que a perda considerável de passageiros no pós-pandemia (de 10 milhões de passageiros por dia para 8 milhões diários), e a inflação de custos também nesse período implicaram sérios efeitos econômicos nas empresas que operam com o transporte público, que não foram repassados para a tarifa.
A fim de tentar debelar essa questão econômica, Botelho lembra que o governo constituiu uma secretaria para cuidar especificamente das concessões de parcerias, sabendo da escassez do orçamento do Estado e da perspectiva de trazer o setor privado para acelerar o processo de expansão da malha. “Várias propostas estão em estudo no sentido de oferecer uma ampla carteira de investimentos em mobilidade e transporte por meio de projetos bem estruturados economicamente, rentáveis, para conseguir essa atratividade num tempo menor”, afirma.
Joubert Fortes Flores Filho, presidente do Conselho Administrativo da Associação Nacional dos Transportadores e Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), entidade civil sem fins lucrativos criada em 1977, lembra que o transporte ferroviário, um dos modais mais requisitados nesse processo de integração, já teve destaque na cultura do transporte nacional.
“A gente acreditou que o carro seria mais rápido, mas não tem carro para todo mundo.”
Joubert Fortes Flores Filho, presidente do Conselho Administrativo da ANPTrilhos
Flores Filho recuperou os tempos áureos dos bondes e dos trens intercidades. “A gente acreditou que o carro seria mais rápido, mas não tem carro para todo mundo”, diz. Sem saudosismo, entende que o momento é positivo para esse sistema secular: “O governo federal tem interesse e está voltando a pensar outra vez no sistema ferroviário”, afirma. “Apesar de ser mais demorado, se for pensar quanto custa um passageiro transportado dessa forma, vai ser possível perceber que vale o investimento.”
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