Realidade em muitos países, os veículos elétricos também estão ganhando espaço no mercado brasileiro. No primeiro semestre deste ano, foram emplacados 13.889 veículos movidos a eletricidade ou híbridos, segundo dados da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE). O número representa crescimento de 84%, em relação ao mesmo período do ano passado.
O aumento dos automóveis e comerciais leves “limpos” nas ruas também tem impulsionado o crescimento dos pontos de recarga públicos e semipúblicos no País. Levantamento inédito da ABVE revela que o número de eletropostos teve alta de 50,8%, em apenas três meses, passando de 500, em março, para 754, em julho.
“A relação entre eletropostos e quantidade de veículos elétricos está na média mundial no Brasil”, defende Paulo Maisonnave, head de mobilidade elétrica da Enel-X. Para o executivo, a preocupação sobre onde e como carregar o veículo elétrico é fruto da desinformação a respeito da transformação da mobilidade urbana em mobilidade elétrica.
“As pessoas não abastecem seus carros a combustão todas as vezes que saem de casa”, compara Maisonnave. Segundo ele, a maioria das recargas é feita de forma privada e o Brasil, diferentemente da Europa, não precisa de tantos pontos de recarga públicos. “Se alguém compra um carro elétrico em Roma, por exemplo, e não tem garagem, como faz? Isso dificilmente acontece no Brasil”, explica.
Maisonnave acredita que a cultura do uso de garagens privadas no País é uma das vantagens quando o assunto é recarga dos veículos plug-in e híbridos. Dentro desse conceito, a empresa, que tem cerca de 232 mil eletropostos em todo o mundo, criou, em parceria com a Estapar, a primeira rede de carregamentos de veículos elétricos semipública do Brasil.
Batizado de Ecovagas, o projeto, lançado no final do ano passado, quer instalar, inicialmente, uma rede integrada de 250 estações em cerca de 100 pontos, em estacionamentos da Estapar, nas regiões Sul, Sudeste, Nordeste e Distrito Federal. Quatro deles foram inaugurados, no início de agosto, no estacionamento do Hospital Santa Catarina, na Avenida Paulista, em São Paulo (SP).
No local, há quatro ecovagas, com carregadores do tipo JuiceBox e plug universal que garantem o carregamento compatível com todos os modelos de carro híbrido e elétrico à venda no País. Para a recarga completa, por exemplo, o tempo médio varia entre quatro e oito horas, dependendo do modelo do veículo.
A recarga é oferecida de forma gratuita pelos próximos seis meses. Após esse período, o acesso isento de despesas será voltado apenas aos clientes das empresas parceiras – no caso, os clientes que possuem automóveis das marcas da Volvo Car Brasil e do Grupo Stellantis –, mas será cobrado de outros usuários.
O modelo segue a filosofia da Enel-X em viabilizar uma rede de recarga inteligente, na qual as empresas, e não os clientes, pagam por isso. “Na nossa visão, a mobilidade elétrica é uma plataforma para outros benefícios e evoluções”, conclui Maisonnave.
Também de olho nesse mercado, a EDP, empresa que atua em toda a cadeia de valor do setor elétrico, implantou, em julho, mais duas estações de recarga no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. Com a entrega, a empresa totaliza três eletropostos instalados no aeroporto – um em cada terminal.
“Com essa iniciativa, a EDP vai dotar um dos principais hubs de circulação de pessoas, no Brasil, de infraestrutura de recarga de veículos elétricos, dando a maior visibilidade possível à experiência de carregamento descomplicada proporcionada pela EDP Smart”, afirma Carlos Andrade, vice-presidente de clientes da EDP no Brasil.
Com potência de 22 kW e carga semirrápida, cada carregador tem capacidade para abastecer até dois veículos, simultaneamente, em corrente alternada (AC), com o conector Type 2. Dependendo do modelo do carro, é possível garantir autonomia de 100 quilômetros em 40 minutos. Uma vez que o uso das estações de recarga é gratuito, pode-se fazer a recarga pagando apenas pelo tempo de uso de 1 hora do estacionamento. O acesso às estações de recarga estará disponível por meio do aplicativo EDP EV Charge BR ou do cartão Ev.Card, criados pela empresa.
A EDP, em parceria com as fabricantes Audi, Porsche e Volkswagen, também criou a rede Plug&Go, nome escolhido para o projeto aprovado na Chamada Pública da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para o tema Mobilidade Elétrica Eficiente, em conjunto com o Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No final do ano passado, foi inaugurado o primeiro carregador ultrarrápido público, em um shopping de Caraguatatuba, litoral de São Paulo.
Trata-se do primeiro da maior rede de carregadores ultrarrápidos da América do Sul, com a instalação de 30 novas estações de recarga ultrarrápidas ao longo de três anos, cobrindo todo o Estado de São Paulo.
Embora acredite que a quantidade de postos de recarga, no Brasil, ainda seja insuficiente, comparando a atual frota brasileira de elétricos e híbridos semelhante, de cerca de 60 mil veículos, com a de outros países, Davi Bertoncello, diretor de infraestrutura da ABVE e CEO da Tupinambá, também enxerga uma evolução no setor. “As discussões sobre o assunto estão rompendo barreiras invisíveis que existiam”, diz ele, referindo-se a maior atenção do Poder Público à infraestrutura de recarga.
Como exemplo, Bertoncello, que também é embaixador de Mobilidade, do Estadão, cita a adesão do governo paulista ao programa Race to Zero, da ONU, que busca zerar as emissões de carbono no Estado, e também a legislação municipal de São Paulo que determina a instalação de pontos de recarga em empreendimentos imobiliários construídos na cidade, a partir de 2021.
“O Brasil está trilhando um caminho interessante, mas qual é o próximo passo? Pois a mobilidade elétrica já é o presente no País”, defende o empresário.
Para o futuro, Bertoncello acredita que devam ser criados incentivos para que as pessoas tenham carregadores em suas casas, como linhas de crédito e isenções tributárias. “Hoje, quem compra um carro elétrico, de valor elevado, pode financiá-lo em diversas vezes, mas, se quiser instalar um ponto de recarga na sua casa, no seu condomínio, tem que arcar com os custos à vista”, diz ele, afirmando que, em média, um ponto tem custo entre R$ 15 mil e R$ 25 mil.
Consultada pela reportagem, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) afirma que a Resolução Normativa nº 819, de 2018, que regulou os serviços de recarga públicos e semipúblicos, no Brasil, já tratava desse assunto, orientando os interessados a instalar estação de recarga em seu condomínio. Por e-mail, a Aneel afirma que “existem, no mercado, opções de linhas de crédito, no tema Eficiência Energética, que podem ser acoplados aos investimentos em infraestrutura, mas a definição dessas linhas de crédito não é alçada da agência”.