‘SP paga R$ 42 milhões por estudo da Linha 16-Violeta que poderia ser feito sem custo’
Presidente da Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô (Aeamesp) denuncia falta de transparência no processo de implementação da Linha 16 Violeta, que ligará os Jardins ao extremo leste de SP

No dia 8 de janeiro, foi divulgada no Diário Oficial a autorização dada pelo Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Parcerias e Investimentos (SPI), para o aprofundamento dos estudos para a construção, manutenção e operação da Linha 16-Violeta do metrô pela Acciona. O projeto prevê que a linha faça a ligação da zona leste da capital paulista com a região dos Jardins. O traçado, por ora, prevê 16 km e 16 estações, entre as estações Oscar Freire e Abel Ferreira.
O investimento inicial para o trabalho é de R$ 42,3 milhões, destinados, conforme informado pelo governo, para a realização de estudos de viabilidade técnica, jurídica e econômico-financeira para a estruturação de uma Parceria Público-Privada (PPP).
Luis Kolle, presidente da Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô de São Paulo (Aeamesp), questiona a decisão. Para ele, entregar o trabalho da Linha 16-Violeta para uma empresa estrangeira retira o planejamento das mãos do governo. “E transfere a responsabilidade para uma empresa privada que visa o lucro, e não tem o viés de se preocupar com a população”, afirma. Entenda esse e outros pontos na entrevista a seguir que o Mobilidade Estadão fez com o executivo.

O que a Aeamesp questiona em relação ao estudo para implementação da linha 16-Violeta?
Luis Kolle: Antes de mais nada, acho importante fazer uma contextualização. Nós temos a Linha 6-Laranja do metrô, que já existe [chamada de LinhaUni, ela está em sua primeira fase e ligará a estação São Joaquim, zona central, ao bairro da Brasilândia, na zona norte]. Inclusive, na semana passada, o Tatuzão da Linha 6 chegou à Estação Brasilândia e teve uma cerimônia com o governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Ocorre é que foi cedida para a LinhaUni uma extensão, que vai até o Ipiranga, na Mooca, na verdade até o Parque da Mooca. Só que esse trecho iria coincidir com a Linha 16-Violeta [projeto do Metrô que irá interligar a estação Oscar Freire, nos Jardins, à futura estação Cidade Tiradentes, na zona leste].
Diante disso, a partir de 2023, acredito, o Metrô fez um estudo para planejar um outro traçado, com o objetivo de desviar a rota e não ter coincidência com a Linha 16-Violeta.
Depois disso veio uma manifestação de interesse privado da Acciona [empresa que está construindo e vai operar a Linha 6] para fazer esse estudo, ou de refazer, não sabemos se a manifestação foi aceita. E é sobre esse e outros pontos que estamos pedindo esclarecimentos.

Já aconteceu antes de o projeto para uma nova linha de Metrô ser feito por empresa privada?
Kolle: Essa fase do trabalho, que é o planejamento, nunca foi feita por uma empresa privada. Portanto, é a primeira vez no Estado de São Paulo que isso será conduzido por outra empresa que não o próprio Metrô. Depois da manifestação de interesse privado, o governo do Estado de São Paulo cedeu e a Acciona ficou como responsável pelo trabalho.
Assim, o poder público está pagando mais de R$ 42 milhões por esse estudo, ou o reestudo do planejamento. E o que mais chama nossa atenção é que esse tipo de trabalho sempre foi feito pelo Metrô, e, mais importante, dentro das custas da empresa. Ou seja, é uma atividade que já é prevista para a companhia.
Não temos nada contra a Acciona, ou qualquer outra empresa. Contudo, fazemos a ressalva de que esse tipo de estudo sempre foi feito pelo Metrô.
Existe alguma vantagem em terceirizar essa etapa do trabalho?
Kolle: Na minha visão não existe nenhum problema em terceirizar. Se o governo considera interessante fazer isso, tudo bem. Mas tem que ter transparência, tem que mostrar qual é o interesse de passar para outra empresa fazer o planejamento e, principalmente, o que será oferecido como contrapartida.
E falo isso não por ser a Acciona, mas por ser uma empresa que faz parte do consórcio de uma linha que está gerando conflito com essa mesma linha, entende?
Então, precisamos saber se vai diminuir a quantidade de estações, se essa linha vai continuar até Cidade Tiradentes, na zona leste, que é onde as pessoas precisam que ela chegue.
E qual o interesse da empresa, se ela vai fazer essa parte social do transporte, de chegar a bairros periféricos. O Metrô considera todos esses pontos em seus planejamentos.
Temos uma empresa com mais de 50 anos de experiência em planejamento urbano, que é o Metrô, que conhece tudo sobre o transporte público da cidade.
Há anos a empresa faz a pesquisa Origem e Destino, que mostra como a população se desloca e onde há necessidade de novas linhas. Precisamos, então, saber se outra empresa também terá esse tipo de cuidado.
Leia também: 7 resultados da Pesquisa Origem e Destino, do metrô, que você precisa saber
Na sua visão, falta transparência no processo?
Kolle: Sim, vemos falta de transparência no que se refere à questão da escolha da empresa. Entendemos que foi uma manifestação de interesse privado, que a Acciona se manifestou. Mas não está muito claro porque o governo não chamou o Metrô para fazer esse trabalho ou porque o próprio Metrô não se manifestou para fazer.
Quais providências a associação está tomando?
Kolle: Estamos conversando com outras associações, associações de funcionários, de empresas e até mesmo de moradores para entender seus interesses. Também vamos nos encontrar com vereadores para entender como eles vêem essa situação. Nesse primeiro momento não vamos entrar com ação popular, por enquanto ainda não.
Então, nesse momento, estamos avaliando e entendendo com outras pessoas e entidades o quanto isso pode ser prejudicial ou mesmo benéfico para a sociedade.
Qual é o status do planejamento? Já está sendo feito?
Kolle: Sim, já está sendo feito e provavelmente será entregue em breve. Até onde sabemos, o prazo de entrega era no final de janeiro. Desde então, estamos tentando obter informações. Mas ainda não conseguimos.
Quais dúvidas ainda estão sem esclarecimentos e precisam ser respondidas?
Kolle: A principal delas é o que ja mencionamos: por que o Metrô não foi chamado para fazer essa “revisão do planejamento”, já que ele próprio começou esse trabalho? Essa é a primeira e mais importante questão. Porque, dessa forma, o governo não teria o custo de R$ 42 milhões.
Outro ponto que queremos esclarecer é quais alterações foram encomendadas pelo governo para essa linha. Vai reduzir o traçado? E o número de estações, vai aumentar ou diminuir? Enfim, não temos respostas.
Leia também: Conheça a Linha 16-Violeta do metrô, que vai ligar a região dos Jardins à zona leste de SP
Quer uma navegação personalizada?
Cadastre-se aqui
0 Comentários