No momento em que você estiver lendo esta reportagem, a família Frediani poderá estar rodando pelo interior de São Paulo. Talvez esteja em Socorro, pequena cidade encravada na Serra da Mantiqueira, quase na divisa com Minas Gerais. Talvez em São João da Boa Vista, um pouco mais adiante, também em São Paulo, porém mais perto de Poços de Caldas (MG). Esses eram alguns dos planos que a empresária Fatima e o engenheiro sanitarista Eduardo Frediani faziam em meados de julho, após retornarem de Gramado (RS) e Santa Catarina. Em abril, o casal recebeu as chaves de sua nova casa, e agora vai com ela para todos os lugares. O Nordeste também está no radar.
A residência, no caso, é um trailer, para seis pessoas, que o casal comprou, por R$ 290 mil, após estudar, por quatro anos, que tipo de “casa” gostaria de levar nas viagens. Trailer e motorhome têm algumas diferenças fundamentais, e ambos apresentam vantagens e desvantagens. Como são veículos que, em muitos casos, podem custar até mais do que imóveis de alvenaria, recomenda-se avaliar os prós e contras de cada modalidade, antes de fechar negócio, para evitar arrependimentos. Ao contrário de uma casa ou um apartamento, não é preciso estudar previamente o bairro, por exemplo, já que, nesse caso, o endereço do momento o viajante é quem escolhe.
Mas, como ocorre no caso de um imóvel, é importante prestar atenção a aspectos como tamanho e tipo de utilização. O motorhome é uma casa e um carro ao mesmo tempo. Tanto que, tecnicamente, é designado no documento como “motorcasa”. Já o trailer precisa ser puxado por um automóvel. De acordo com o empresário Leônidas Fleith, que fabrica motorhomes e trailers em Timbó (SC), o carro a ser utilizado para puxar trailer deve ter motor, “no mínimo, 2.0”.
Na dúvida, é recomendável alugar para ter uma experiência. Foi o que fez o casal Juliana e Marcos Shimazu, empresários de Lorena (SP), que, recentemente, realizou sua primeira viagem, um roteiro de 14 dias pelo Sul do Brasil, com um motorhome alugado, e já planeja outra. Juliana diz que achou o veículo pequeno, mas pretende repetir a dose no ano que vem. “Se não der para comprar um até lá, vamos alugar novamente.”
Famílias como os Frediani e os Shimazu engrossam as estatísticas de um tipo de turismo que tem crescido bastante. São pessoas que trocaram hotéis e viagens aéreas internacionais por destinos nacionais, normalmente perto da natureza, em lugares abertos e mais isolados.
O movimento, que já vinha crescendo antes da pandemia, aumentou com a crise sanitária e o isolamento. “Amo viajar”, resume Fatima Frediani. Ela e o marido adquiriram um trailer, no ano passado, após estudarem a compra por quatro anos. “Pensamos em um motorhome, mas, como já tínhamos caminhonete, decidimos pelo trailer.”
Após a primeira experiência de viajar com motorhome alugado em um roteiro pela região Sul, Juliana Shimazu e o marido já pretendem repetir a dose no ano que vem. A locação custou R$ 10.106, por 14 dias.
A primeira diferença básica entre eles (e que pode ser determinante na escolha) é o preço. De acordo com o empresário Leônidas Fleith, diretor do Grupo Fun, empresa de Santa Catarina que vende e aluga trailers e motorhomes da marca Legend, os trailers são mais baratos. Os preços variam muito, dependendo de fatores como tamanho e equipamentos. Na Legend, um trailer custa a partir de R$ 150 mil, enquanto um motorhome começa em R$ 490 mil.
Fleith chama a atenção também ao fato de o trailer ter manutenção mais simples, por possuir menos acessórios, como ar-condicionado.
Fatima Frediani lembra que o seguro também é mais barato, comparável ao de uma “casa pequena”. Além disso, ao contrário de motorhome, trailer é isento de IPVA.
Outra vantagem é a questão da locomoção. Como ele é puxado por um veículo, para explorar a região visitada, basta desengatar o carro e sair. Pelas dimensões, o motorhome tem movimentos limitados em áreas urbanas, e estacionar é um desafio. A alternativa, nesse caso, é utilizar transporte público, alugar um veículo ou chamar táxi ou carro por aplicativo, o que aumenta os custos.
O diretor da Legend também lembra que dirigir um carro de passeio costuma ser mais confortável do que conduzir um trailer, por causa de itens como câmbio automático, presente na maioria dos automóveis. Motorhomes são feitos sobre a base de veículos comerciais, como Fiat Ducato e Mercedes Sprinter, com transmissão manual.
Como o motorhome é, ao mesmo tempo, carro e casa (ou motorcasa), a dirigibilidade é melhor. “Ele é mais estável”, diz Fleith. Além disso, durante os deslocamentos na estrada, os ocupantes podem usufruir do conforto do “lar”, como assistir tevê no sofá e pegar algo na geladeira. A lei proíbe a permanência de pessoas em trailer em movimento.
O empresário acrescenta que motorhomes tendem a ser mais sofisticados do que trailers, geralmente mais “espartanos”. Como comparação, enquanto um trailer para seis pessoas, bem equipado, como o do casal Fatima e Eduardo Frediani, saiu por R$ 290 mil, o motorhome Legend LD9, para o mesmo número de ocupantes, custa R$ 850 mil, e inclui espaço até para levar duas motos.
A vontade de ter o mundo como quintal de casa nunca esteve tão em alta, e trouxe um novo público ao segmento. De acordo com o empresário Leônidas Fleith, que produz a linha Legend de trailers e motorhomes, 70% de seus clientes estão comprando esse tipo de veículo pela primeira vez.
Diante disso, quem pretende possuir ou alugar trailer ou motorhome precisa, literalmente, entrar na fila. Apesar de ter elevado a produção em relação ao ano passado, Fleith viu a demanda crescer mais do que a oferta.
Das seis unidades produzidas, mensalmente, no ano passado (dois motorhomes e quatro trailers), ele saltou para dez (três motorhomes e sete trailers), atualmente. Mesmo assim, o tempo de espera é de três meses para trailer e de 10 a 12 meses para motorhome, informa o empresário.
A escassez de veículos novos tem provocado aquecimento no mercado de usados. Segundo Fleith, modelos de segunda mão são negociados pelo mesmo preço do equivalente novo, e a venda é rápida. O executivo afirma que um motorhome usado não demora mais do que 30 dias para trocar de dono, prazo que cai para “uma ou duas semanas” para trailers.
Para atender o público crescente, neste ano, a empresa decidiu entrar também no ramo da locação, com quatro motorhomes e dois trailers, e garante que todas as unidades estão alugadas.
É a mesma situação verificada na Vandão, empresa de Salto (SP) especializada em locação de motorhomes. Ali, todas as oito unidades estão alugadas pelos próximos quatro meses, e a fila de espera tem 140 nomes. A empresa está finalizando a montagem de mais duas unidades, que devem entrar em operação ainda neste ano. Além disso, estuda a aquisição de outros dois motorhomes para o ano que vem.