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Monotrilhos: como e por que os sistemas de seguranças falham

Por: Daniela Saragiotto . 05/04/2023
Mobilidade com segurança

Monotrilhos: como e por que os sistemas de seguranças falham

Joubert Flores é engenheiro eletricista, formado pela UFRJ, e, atualmente, presidente do Conselho de Administração da ANPTrilhos. Atuou por 20 anos no Metrô Rio, ocupando cargos como gerente de manutenção e diretor de engenharia

6 minutos, 28 segundos de leitura

05/04/2023

Por: Daniela Saragiotto

choque entre os trens do monotrilho da linha 15-Prata
Dois trens da Linha 15-Prata se chocaram na madrugada de 8 de março, entre as estações Sapopemba e Jardim Planalto. Foto: Taba Banedicto/Estadão

Nas últimas semanas, os passageiros que utilizam o transporte sobre trilhos de São Paulo só tiveram notícias ruins. Desde o início de março, ocorreram diversos acidentes em várias linhas do sistema metroviário, que causaram paralisação ou lentidão dos trens, em geral, nas primeiras horas da manhã, prejudicando o deslocamento de milhares de passageiros. Um desses acidentes, infelizmente, foi fatal.

No dia 14 de março, o vigilante Carlos Eduardo dos Santos, de uma empresa terceirizada da Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos (CPTM), morreu após ser atingido por um trem entre as estações Tatuapé e Engenheiro Goulart, da Linha 12-Safira. Carlos estava acompanhado de outro vigilante, que também foi atropelado, mas sobreviveu.

Alguns dias antes, na madrugada de 8 de março, no monotrilho da Linha 15-Prata, do Metrô de São Paulo, dois trens sem passageiro se chocaram frontalmente entre as estações Sapopemba e Jardim Planalto, na zona leste da capital paulista – felizmente sem feridos graves.

Saiba mais: Condutor do Monotrilho da Linha 15-Prata que se chocou com outro trem estava ao celular

No dia seguinte, quando os técnicos trabalhavam para separar as ferragens, os mesmos trens se chocaram novamente. Os incidentes recentes na Linha 15, mais alguns antigos – como o de janeiro de 2019, quando dois carros vazios bateram na região da Estação Jardim Planalto –, somados às ocorrências e descarrilamentos nas últimas semanas em várias linhas que atendem a cidade de São Paulo e municípios vizinhos, trouxeram à tona a questão da segurança do sistema.

Para entender um pouco mais sobre esse assunto, que, diariamente, envolve a segurança de milhares de passageiros, o Mobilidade conversou com Joubert Flores, especialista com mais de 40 anos de experiência no modal. 

Joubert Flores, 67 anos, atuou por 20 no Metrô Rio, ocupando diversos cargos, como gerente de manutenção e diretor de engenharia.

Como o sr. avalia o sistema de segurança do transporte sobre trilhos de SP em geral?

Quando falamos de segurança e de sinalização metroferroviária, nos referimos a tecnologias que são utilizadas há 200 anos. No início, os trens trafegavam em uma via única, e esperava-se que o primeiro chegasse a seu destino para que outro “carro” pudesse voltar, em uma via que chamamos de singela. Havia um despacho, que poderia ser uma bandeira.

Estando de posse dela, o condutor poderia trafegar e, ao chegar ao final, ele a entregava a outro trem, autorizando, dessa forma, sua viagem. Algum tempo depois, a bandeira foi substituída pelo rádio, que também se transformou, por sua vez, na sinalização que temos hoje.

Como funciona a sinalização atual?

Todo sistema metropolitano, seja dos metrôs, seja dos trens, seja dos monotrilhos, possui sinalização parecida. Simplificando, ela possui três camadas. A primeira garante que se conheça a posição do trem, e isso pode ser feito dividindo a via em pedaços ou circuitos, sinalizando quando se está em determinado local e avisando aos demais que nenhum outro pode ocupar aquele espaço – o que é chamado de bloco fixo. Os sistemas mais modernos têm blocos móveis, com os trens se comunicando com os demais por uma espécie de radar.

O segundo nível é o de intertravamento, quando o trem muda de via e é preciso saber qual a rota que ele deve seguir. Já o terceiro é o da automação: determina se o condutor tem controle exclusivo do carro, supervisão de velocidade, funções que são totalmente automáticas, como no caso do monotrilho, da Linha 4 do Metrô de São Paulo, entre outras.

E com relação à automação?

Nesse caso, é possível escolher diversas funções: nos trens que possuem condutor, caso da CPTM, é feita uma supervisão de velocidade, e um controle, caso ultrapasse o limite ou avance o sinal vermelho, e o trem para em qualquer uma dessas situações. Já no Metrô-SP ou na Linha 1 do Metrô-RJ, também há um condutor, mas o trem faz tudo sozinho. Ou, ainda, pode trafegar sem condutor, com o trem fazendo tudo sozinho sempre, configurando o grau 4 de automação, que é o mais avançado.

Paralisações das linhas provocaram transtornos para a população que precisa ir ao trabalho. Foto: Taba Benedicto/Estadão

E todos esses aspectos revertem em segurança para os usuários, como os do monotrilho?

Ao escolher um dos sistemas mencionados, adota-se o topo da escala tecnológica ou o melhor nível de sinalização e de automação disponível atualmente. E, geralmente, sistemas sem condutor precisam ter o nível máximo de segurança, o que, na prática, indica a possibilidade de uma falha a cada 10 bilhões, o que é praticamente impossível de acontecer.

Adicionalmente, eles possuem um sistema chamado fail safe, ou “falha segura”, o que significa que, em caso de dúvida de qualquer tipo, o trem irá parar. Todos os nossos sistemas em operação, inclusive o monotrilho da Linha 15, que também trafega sem condutor, tem níveis máximos de automação e de segurança.   

Mas, então, o que pode estar causando esses incidentes na Linha 15-Prata?

É importante dizer que hoje existe no mundo mais de mil quilômetros de trens que utilizam o sistema sem condutor. Algumas delas são as linhas 1, 4 e 14 do metrô de Paris, na França, a linha 9 de Barcelona, na Espanha, diversas na Ásia, três delas no Chile, algumas no Canadá, entre outras. Se formos questionar essa prática, teríamos que fazer isso em nível mundial.

Não podemos ser levianos com o que ocorreu na Linha 15, que, inclusive, está sendo investigado para que se conheçam os detalhes, mas, olhando de fora, aparentemente, alguma função foi desabilitada naquela situação – que não era uma viagem tripulada, e, sim, uma manobra – e culminou em um incidente. A maioria deles, inclusive, é devido à falha humana. Com o sistema todo automatizado, antes de qualquer situação, o trem iria parar. Então, em situações normais, o que ocorreu não pode acontecer, a não ser que alguma função tenha sido desabilitada.

Há sempre alguém supervisionando as viagens no monotrilho?

Todas as operações são monitoradas em tempo real pelo Centro de Controle. O condutor também pode intervir, nos casos obviamente dos trens em que eles existem. Esses carros, em geral, não possuem cabine, mas existe uma bancada que pode ser aberta e que pode servir para essa finalidade, caso necessário. A interface desses veículos, que é automática, é exaustivamente testada.

O fundamento da tecnologia desse sistema é o mesmo que o dos veículos autônomos, com a diferença de que o trem está em um ambiente fechado, segregado, e com obstáculos conhecidos. Na rua, no caso dos veículos autônomos, os desafios e imprevistos são infinitamente maiores: pessoas circulando, animais que atravessam a rua, entre outros.

O processo, no caso dos autônomos, é via machine learning, ou seja, as informações são lançadas nas máquinas até que elas aprendam e tomem decisões. Já nos monotrilhos, a probabilidade de uma falha é muito pequena, e há um monitoramento em tempo de real de uma pessoa no Centro de Controle.

Malha metroviária de São Paulo*

• 104,4 km de extensão
• 6 linhas: 1-Azul; 2-Verde, 3-Vermelha, 4-Amarela, 5-Lilás e 15-Prata
• Total de estações: 91*
* Algumas estações atendem mais de uma linha do sistema

Trens metropolitanos*

• 275 km de extensão
•  7 linhas: 7-Rubi, 8-Diamante, 9-Esmeralda, 10-Turquesa; 11-Coral; 12-Safira e 13-Jade
• Total de estações: 101

*Fontes: Metro-Sp, ViaQuatro, ViaMobilidade e CPTM

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