Sérgio Avelleda

Coordenador do Núcleo de Mobilidade Urbana do Laboratório Arq. Futuro de Cidades, do Insper

Redução da velocidade é essencial para diminuir as mortes no trânsito

Excesso de velocidade é um dos principais motivos de mortes nas vias brasileiras. Foto: GettyImages

28/06/2023 - Tempo de leitura: 3 minutos, 40 segundos

Diariamente, morrem em torno de 120 pessoas em acidentes de trânsito no Brasil – número equivalente a um desastre aéreo. Tenho certeza que, se realmente caísse um avião por dia, em pouco tempo as autoridades fariam algo. Mas, como se trata de ocorrências viárias, elas são banalizadas e tratadas como se não fosse possível evitá-las.

Existem elementos que contribuem para esse número muito ruim que o País registra – ao redor de 20 mortos por 100 mil habitantes – e que nos distancia muito dos países desenvolvidos, e até mesmo de cidades brasileiras que estão conseguindo melhorias importantes nesse campo.

Destaco, em primeiro lugar, a gestão das velocidades, fundamental para a redução das mortes: uma colisão de carro com pedestre a 30 km/h oferece 90% de chance de sobrevivência, enquanto a 50 km/h essa possibilidade cai para apenas 25%.

Para saber mais sobre segurança viária, acesse o canal Maio Amarelo

Falta percepção dos riscos

O brasileiro “glamouriza” a velocidade e, sobretudo, não recebe treinamento adequado para perceber os riscos implicados na condução de um veículo. Então, compete às autoridades, sobretudo nas vias urbanas que têm muito fluxo de pedestres, ciclistas e demais pessoas vulneráveis, gerenciar de maneira correta os limites de velocidade.

Dentro do carro, especialmente nos mais novos e tecnológicos, há diversas proteções como air bag, célula de sobrevivência, cintos de segurança muito poderosos, entre outros. E, em contrapartida, o pedestre só pode contar com o próprio corpo, que é muito frágil.

Epidemia moderna

O segundo fator de risco que destaco é o uso do celular enquanto se dirige. Já existem estudos comprovando que usar o smartphone ao conduzir um veículo provoca perda de atenção equivalente ao uso de álcool.

Vivemos uma epidemia do uso do equipamento, então vejo dois caminhos para inibir esse que já virou um hábito: fiscalização com tecnologia de ponta e também com agentes de trânsito humanos que inibem os motoristas infratores, e, em segundo lugar, o desenvolvimento de tecnologias para adaptar esses dispositivos – como conversão de mensagens de texto por áudio, entre outras. Esses recursos precisam ser incorporados como itens de segurança.

Processo para obter a CNH

É preciso, também, reforçar a formação dos motoristas, pois nosso processo de habilitação é muito falho e pouco rigoroso. Eu acredito, inclusive, que, para que uma pessoa se torne motorista, é fundamental que tenha “aula” como pedestre e, se tiver condições, como ciclista para se colocar no lugar do outro no trânsito e compreender a necessidade do comportamento cuidadoso. E deveria haver um módulo apenas sobre risco – gestão de riscos.

Por fim, acredito que as cidades precisam incorporar, definitivamente, a metodologia do Visão Zero e Sistemas Seguros, que entende que, por mais preparado que seja, em algum momento, o motorista pode e vai errar.

As cidades que conseguiram implementá-la obtiveram resultados impressionantes. Então, levando isso em conta, é o desenho das vias que irá evitar acidentes; é a diminuição das velocidades para que as pessoas façam a conversão mais devagar; são as faixas elevadas para que o pedestre possa atravessar; é a sinalização adequada, entre outros aspectos. E o poder público precisa entender sua responsabilidade nesses elos.

Experiências

Temos aqui, no Brasil, experiências que merecem ser destacadas. A cidade de Fortaleza vem adotando, há vários anos, as melhores práticas na gestão do trânsito e alcançando resultados muito bons. É uma das poucas cidades do Hemisfério Sul a alcançar a meta da ONU de redução, na última década, de 50% das mortes.

Salvador (BA) é outra: lá também, assim como na capital do Ceará, há ações de redução de velocidade, fiscalização para motoristas e priorização de pedestres e ciclistas.

Esse modelo, chamado de Ruas Completas, prioriza os mais frágeis, oferecendo à população estruturas urbanas como ciclovias e vias confortáveis e adaptadas a todo perfil de população, como idosos, crianças e pessoas com deficiência.

É o redesenho da via para que todos sejam contemplados – uma ótima prática de mobilidade que se materializa em uma cidade bem mais amigável.

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