Com o início das precitações na região Sudeste do País, é acionado o alerta para ocorrências como inundações, desabamentos, quedas de árvores e de energia e outros transtornos. Na primeira semana de janeiro, as chuvas em São Paulo já mostraram que o ano não será diferente dos anteriores nesse quesito.
Na quinta-feira (11), após quatro dias consecutivos de precipitações em São Paulo, a capital registrava 400 árvores caídas e estado de atenção para alagamentos acionado pelo Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE), com dezenas de pontos intransitáveis.
Além de milhares de pessoas sem energia elétrica, trânsito acima da média para o período, especialmente no final da tarde, entre diversos outros transtornos.
Entretanto, a preocupação é ainda maior dos moradores de áreas de infraestrutura precária, que vivem perto de encostas de morros ou à beira de rios.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que, em 2018, eram 8,27 milhões de brasileiros vivendo em áreas de risco em 872 municípios. Assim, desse total, 26,1% não contavam com saneamento básico e 4,1% estavam sem destino adequado para o lixo.
A incidência desses acontecimentos impacta diretamente na mobilidade, ou na falta dela, uma vez que esses incidentes bloqueiam vias e limitam o ir e vir das pessoas, desencadeando uma série de outros prejuízos.
De acordo com Renato Cymbalista, arquiteto e urbanista graduado pela Universidade de São Paulo (USP), as perdas, após cada acontecimento causado pelas chuvas, são enormes e difíceis de serem contabilizadas.
“Ruas e estradas são interrompidas por enchentes e deslizamentos, sistemas e transporte coletivo param de funcionar e, após os desastres, é necessário reparar todos os danos. Mas o mais importante são os prejuízos em sofrimentos e vidas perdidas”, diz.
De maneira geral, as áreas de risco estão associadas à deficiência de infraestrutura urbana e saneamento básico, normalmente regiões de mananciais ou encostas ocupadas de forma incorreta e sem sistema de drenagem.
“Aa periferias são grandes afetadas, pois são áreas de grande densidade populacional e onde a atuação do Poder Público tem menor alcance”, explica Luciano Machado, engenheiro civil e diretor comercial da MMF Projetos, empresa de engenharia especializada em projetos de infraestrutura.
De acordo com o engenheiro, as medidas para evitar os que são chamados pelas autoridades de “desastres naturais” deveriam ter sido tomadas ao longo do ano.
“Agora, não há mais tempo hábil para se realizar as obras necessárias. O mais eficaz, em grande parte, seria investir de forma consistente em infraestrutura básica; porém, o tema enfrenta resistência pela complexidade e pelo alto custo de execução”, diz Machado.
Os custos das obras são os principais empecilhos, alegam as autoridades, mas, quando observamos o impacto das catástrofes, esse argumento não faz sentido, principalmente se pensarmos nas vidas perdidas.
Para o arquiteto e urbanista Renato Cymbalista, desastres naturais como deslizamentos ou mesmo enchentes são, em grande medida, evitáveis com o uso responsável do solo e com boas políticas de habitação para que as pessoas não precisem ocupar áreas de risco.
Nas regiões já densamente ocupadas, é possível remediar a situação, com a repermeabilização do solo e com o engajamento da população – por exemplo, na instalação de lugares de drenagem e jardins de chuva”, explica.
As mudanças estruturais, na opinião do engenheiro da MMF Projetos, devem partir do Poder Público, que, além de desenvolver as reformas e melhorias, também tem a responsabilidade de alertar as pessoas para mudanças preventivas de comportamento, tanto de topografia como de volume das precipitações.
Na falta de uma atuação efetiva pelos órgãos competentes, algumas ações, tomadas pela própria população, podem ajudar a diminuir os danos desencadeados pelas chuvas.
São elas: descartar o lixo de forma correta, nunca jogando os resíduos em encostas, córregos e bocas-de-lobo; manter limpos ralos, esgotos, galerias e valas; e, de maneira nenhuma, construir às margens de cursos d’água, sobre aterros ou próximo a brejos.
Moradores de áreas consideradas de risco também devem estar atentos a alguns sinais durante o período mais intenso das chuvas. Alguns dos mais comuns são árvores inclinando nos arredores, trincas nas paredes ou mesmo no chão.
De acordo com Machado, é preciso redobrar a atenção em caso de movimentações do terreno e observar se a água da chuva está barrenta ou se contém plantas e troncos, que são indícios de inundação. “É importante fortalecer muros e paredes poucos confiáveis e providenciar a poda ou o corte de árvores com risco de queda”, afirma o especialista.
De acordo com a Prefeitura de São Paulo, existem na cidade 287 rios, riachos e córregos que atravessam o município. O Projeto Rios e Ruas registra, além destes, em torno de 300 cursos d’água nas imediações.
Com a urbanização e a consequente pavimentação das ruas e avenidas, a absorção da água pelo solo fica cada vez mais difícil, e mais comuns os alagamentos.
“Inicialmente, o que deveria ter sido feito era a ocupação controlada das áreas de mananciais e adjacentes a rios e córregos na cidade. Considerando o nível de ocupação que já existe, o Poder Público deve intervir realocando as famílias que se encontram em locais mais críticos”, diz Machado.
De acordo com ele, o lixo descartado incorretamente agrava ainda mais o problema. “O descarte irregular dificulta o escoamento de córregos, cria pontos de estrangulamento do fluxo das águas, gera superfícies propícias a deslizamento de solo e detritos. Essa condição também está associada a áreas com deficiência de infraestrutura urbana”, completa.
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