Com o advento dos veículos eletrificados no Brasil, as concessionárias, um dos principais alicerces da cadeia automotiva do País, estão precisando passar por uma adequação importante para atender os consumidores interessados na compra desse tipo de carro.
As mudanças se apoiam em três pilares: treinamento para qualificar os times de venda e pós-venda, investimento do ferramental e tecnologias necessários para mexer nos motores elétricos na hora da manutenção e adaptações nas instalações. Confira, a seguir, como as autorizadas das marcas vêm se preparando para atender os clientes nesta nova realidade da eletrificação dos automóveis.
O uso do carro elétrico é muito diferente do modelo com motor a combustão. “Ele está mais próximo do telefone celular que propriamente do automóvel”, afirma Rodolfo Possuelo, diretor de vendas da Nissan. Por isso, as equipes que trabalham na área comercial e nas oficinas das concessionárias passam por treinamentos específicos.
O desafio das marcas é alcançar o melhor índice possível de qualidade em vendas e pós-vendas.
A Nissan realiza cursos virtual (de quatro horas) e presencial (de oito horas), em seu centro de treinamento de Jundiaí (SP), sobre o mercado de carros elétricos e para os funcionários conhecerem os recursos existentes no Leaf, único carro elétrico da marca. Além disso, outro curso de uma semana é dado em parceria com o Senai.
A qualificação inclui test drive para todos aproveitarem a tecnologia embarcada no carro. “Veículo elétrico é experimentação, e os técnicos das concessionárias precisam entender o conceito por trás dele, como torque imediato e nível de ruído zero”, afirma Possuelo.
O nível de exigência é alto e Rodolfo Possuelo, diretor de vendas da Nissan, se orgulha do patamar alcançado. “A base dos técnicos do Leaf é composta pelos profissionais máster da rede de concessionárias. Desde que o modelo foi lançado no Brasil, em 2019, nenhuma unidade retornou à concessionária para que algum serviço fosse refeito”, garante.
Em algumas fabricantes, a capacitação deve seguir a métrica da matriz. É o caso da Porsche, que, em suas dez concessionárias, tem ao menos um técnico de alta tensão, profissional especializado para mexer em todos os sistemas e circuitos do Taycan, esportivo elétrico da marca alemã.
“A Porsche sempre organiza treinamentos de acordo com a necessidade. Ao entrar na loja, um cliente será atendido por uma equipe de vendas treinada há mais de dois anos”, afirma Leandro Giacon, gerente sênior de desenvolvimento da rede de concessionárias Porsche. “Ela está completamente apta a explicar as tecnologias do Taycan.”
Tanto os funcionários da linha de frente do atendimento inicial como os que atuam na área de pós-venda das concessionárias precisam ter na ponta da língua as respostas das dúvidas mais frequentes dos consumidores, como autonomia do motor, valores de manutenção e tempo de recarga da bateria.
Os automóveis híbridos – que combinam motores a combustão com elétricos – também exigem mão de obra especializada. “Dos 1.500 técnicos das 276 concessionárias da Toyota, 500 já foram capacitados, em um total de 15 mil horas de treinamento”, revela Vladimir Centurião, diretor comercial da Toyota. “Embora os veículos com motorização híbrida sejam mais simples que os 100% elétricos, é nossa missão conhecer em detalhes seus dispositivos.”
Os treinamentos são periódicos e anualmente o time de pós-venda passa por um curso para se atualizar sobre as evoluções de Prius, RAV4 e Corolla Hybrid, os representantes híbridos da marca. “O conteúdo fica guardado em um portfólio digital e, quando há necessidade de treinar um funcionário novo, a concessionária recorre a esse material”, diz Centurião.
O segundo pilar para encarar a realidade dos carros eletrificados é a preparação das instalações das concessionárias. A estrutura para expor, vender e fazer as revisões dos modelos com propulsão híbrida ou integralmente elétrica precisa ser aprimorada. Em 2016, a Porsche alertou sua rede com quatro anos de antecedência: “Teremos automóvel elétrico no Brasil”.
O Taycan foi lançado no ano passado, mas a sinalização prévia valeu a pena. “As lojas se adequaram com calma e se prepararam com a infraestrutura necessária. Afinal, as mudanças demandaram obras, cabeamento e digitalização nas operações de vendas e serviços”, ressalta Leandro Giacon.
“As lojas seguem um padrão mínimo de fachada e mobiliário e cada uma possui oito carregadores de até 22 kW, instalados no showroom, na oficina e na área de entrega. Uma das concessionárias, em São Paulo, se dá ao luxo de oferecer um carregador de 350 kW, de carga ultrarrápida.
Mas nem todas as concessionárias já são capazes de trabalhar com essa tecnologia, que ainda é novidade no Brasil. Apenas sete autorizadas da Nissan estão habilitadas para receber o Leaf, número que deverá chegar a 30 até o fim de 2022. Elas investiram na digitalização de processos, postos de serviço e reformulação de layout. O carro elétrico também precisa de uma área isolada para garantir a segurança contra descargas elétricas durante a manutenção.
As mudanças são mais simples quando se trata de um veículo híbrido, que, ao contrário do elétrico, não deve ser tratado de maneira diferente em comparação a um automóvel com motor a combustão. “Ao chegar à concessionária, basta identificá-lo como híbrido e, se o problema é mais complexo, basta desligar o sistema de alta tensão dele”, salienta Vladimir Centurião.
As oficinas das concessionárias que fazem manutenção de veículos elétricos usam instrumentos e ferramental específicos, como aparelhos para remover módulos da bateria, gancho de emergência para casos de choque elétrico e elevador com base livre. “Os carregadores são essenciais na oficina, mas há outros itens importantes, como baias de energia e ferramental para trabalhar com alta tensão”, diz Leandro Giacon, da Porsche.
Os investimentos para deixar as concessionárias totalmente preparadas para atender aos carros eletrificados podem chegar a R$ 200 mil. O montante inclui a digitalização das operações, com direito a uma rede de computadores e tablets para que toda a permanência do automóvel dentro da oficina seja acompanhada pela equipe técnica de forma online e integrada.
Já os gastos com adaptação de oficinas que recebem veículos híbridos são menores, cerca de R$ 30 mil, que contemplam medidores de alta tensão e voltímetro.
As oficinas das sete concessionárias Nissan que dão suporte ao Leaf dispõem de, ao menos, dois carregadores – um wallbox e um portátil, que é conectado a uma tomada comum. “Há também uma área especial, com ferramental apropriado para reparos mais pesados”, afirma Rodolfo Possuelo. “E o melhor de tudo é que a adaptação do showroom e das oficinas não ocupa espaço maior que o de um automóvel convencional.”
R$ 200 mil
é o valor para adaptar uma oficina aos veículos elétricos
R$ 30 mil
é a quantia para preparar uma oficina para os híbridos
15 mil horas
foram dedicadas aos treinamentos dos técnicos da Toyota
350 kW
é a capacidade de um carrregador ultrarrápido da Porsche