Após a eleição deste novo governo e, também, dos governos estaduais, ficamos, naturalmente, ansiosos com os novos rumos nas políticas de mobilidade urbana. Até porque esse foi um dos setores mais afetados pela pandemia. Houve uma perda de passageiros no transporte público (cuja demanda, na maioria das cidades, ainda não alcançou os mesmos patamares de 2019), gerando a maior crise de financiamento nos serviços da história e um aumento no uso do transporte individual motorizado.
Logo no final de 2022, fomos positivamente surpreendidos com o anúncio da recriação do Ministério das Cidades. De fato, a imensa maioria da população brasileira é hoje uma população urbana. Estão, nas cidades, os grandes problemas nacionais (pobreza, exclusão, desigualdade), mas também é ali que se concentra a força da economia.
Mesmo o agronegócio tem suas bases de financiamento e transações comerciais agenciadas nas cidades. Não fez nenhum sentido o fechamento desse ministério. Com seu retorno, também voltou, felizmente, a Secretaria Nacional de Mobilidade, que, no governo anterior, havia sido reduzida a uma mera diretoria.
Tudo isso pode parecer apenas nomes e títulos, mas dá relevância institucional na disputa, natural dentro de governos, aos temas urbanos e da mobilidade nas grandes cidades.
E, de fato, pudemos perceber que a mobilidade urbana ganhou novos contornos, com maior e mais efetiva intervenção do governo federal. Recentemente, por exemplo, tivemos a notícia de um acordo de cooperação entre a Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana e o BNDES, que irá viabilizar a realização de um estudo de projetos prioritários nas regiões metropolitanas de todo o País, para criar, oxalá isso realmente se efetive, um pipeline de projetos que receberão contínuo apoio de Brasília.
O governo federal também recebeu um estudo elaborado pela NTU (Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano), contendo um programa de rápida implementação para recuperação do transporte público e contribuição para a descarbonização das cidades, inclusão social e apoio à indústria nacional que fabrica ônibus. Logo depois de receber o estudo, o BNDES anunciou um ambicioso plano de financiamento à transição energética dos ônibus urbanos no Brasil.
Ainda esperamos anúncios de medidas em relação à segurança viária. É preciso reverter, com urgência, medidas adotadas no governo federal que criaram embaraço à fiscalização dos motoristas infratores, o que contribuiu para uma indevida flexibilização das normas do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Esse tema é mais do que urgente.
Tenho certeza de que todos os leitores deste artigo conhecem alguém que perdeu a vida no trânsito. Não é possível que sigamos protegendo os infratores e colaborando para a verdadeira carnificina que é a morte de quase 120 pessoas, todos os dias, nas ruas e estradas brasileiras.
Também em 2023 vimos crescer de forma exponencial o número de cidades brasileiras que estão subsidiando os sistemas de transporte público, algumas delas, inclusive, ofertando transporte gratuito a todos.
Esse é um tema fundamental: é preciso que a sociedade entenda, cada vez mais, que o subsídio ao transporte, seja para reduzir, seja zerar as tarifas cobradas dos usuários, é uma política social de alto impacto, gerando fortes externalidades, inclusive para a economia, que se beneficia diretamente do maior acesso das pessoas a trabalho, compras, serviços públicos e lazer.
Para 2024, ano de eleições municipais, espera-se que o debate do financiamento do transporte arrebate parte da agenda das campanhas. Belíssima oportunidade para que os três níveis federativos (municípios, Estados e União) pactuem um arranjo institucional, nos moldes do SUS, para a mobilidade urbana. E, com isso, desenhar com precisão as atribuições de cada um, especialmente na junção de esforços para ampliarmos a atratividade do transporte público.
Dada a gravidade que atingimos em termos dos extremos climáticos (furacões, secas, enchentes etc.), espera-se também que as cidades se mobilizem a fim de favorecer a mobilidade ativa, colocando em prática políticas de qualidade e perenes em favor dos pedestres e ciclistas, assim como acelerem a transição energética do transporte público.