Em dezembro do ano passado, ciclistas que utilizam o túnel Nove de Julho, importante via de 450 metros de extensão que liga o centro da capital paulista à Zona Sul, foram surpreendidos com o retorno de uma placa de sinalização proibindo o tráfego de bicicletas.
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De acordo com Renata Falzoni, arquiteta, jornalista e cicloativista, o túnel sempre teve essa sinalização e, muitos anos atrás, ela proibia até mesmo carroceiros e pedestres.
“Entretanto, em 2014, em uma reunião entre ciclistas de diversas partes da cidade de São Paulo com Jilmar Tatto, então secretário de transportes da gestão de Fernando Haddad (PT), prefeito entre 2013 e 2016, pedi ao secretário a retirada da placa R12, que proíbe bicicletas, a colocação de uma rampa sobre a escada de acesso na passarela lateral e o afastamento do corrimão, para que a largura da passarela permitisse a passagem de pedestres empurrando uma bicicleta dentro do túnel, caso a pessoa não desejasse pedalar junto aos carros”, explica a cicloativista.
Segundo Falzoni, o pedido feito em 2014 foi atendido em poucos dias, a placa foi retirada e uma rampa foi instalada. “Mas o corrimão não foi afastado para aumentar a largura da passarela de pedestres”, afirma.
Na época, segundo ela, outras medidas foram adotadas na cidade de forma geral, como a redução de velocidade máxima nas avenidas de 60 km/h para 50 km/h, estreitamento de cruzamentos, piso táctil, ações que fazem parte do que é chamado por especialistas em segurança viária de acalmamento do tráfego.
A alegação das autoridades é que a proibição visa proteger os ciclistas. Em nota, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) esclarece que o trânsito de bicicletas no túnel é proibido desde 2006 e que não há, no momento, possibilidade de implantação de estrutura cicloviária no local em função das características da via. “Por lá, há um corredor de ônibus à esquerda e uma faixa de rolamento de veículos à direita”, informa o comunicado.
De acordo com a CET, o ciclista tem como opção fazer a travessia no túnel desmontado da bicicleta, pela área destinada aos pedestres, ou seguir pelas ruas Eng. Monlevade (no sentido Centro-Bairro) e Convenção de Itú (sentido Bairro-Centro). “A medida tem como objetivo a segurança de todos os usuários da via, principalmente os mais vulneráveis, como os ciclistas”, finaliza.
Para Falzoni, mesmo com a atuação da Câmara Temática da Bicicleta, fórum de discussão entre ciclistas e a prefeitura criado oficialmente em 2015, as recentes gestões municipais têm priorizado a fluidez de automóveis e o diálogo com ciclistas tem perdido relevância nas decisões de políticas públicas de mobilidade.
“Levamos anos para conseguir a retirada da placa e ela simplesmente voltou e não houve discussão, ou mesmo consulta junto aos ciclistas. É uma arbitrariedade calcada em ‘excluir para garantir segurança’ e não em ‘incluir e promover segurança’. É uma medida que tira da CET a responsabilidade pelos ciclistas no túnel, local onde um técnico da companhia – que não pedala – acha que é inseguro”, afirma Falzoni.
Para ela, deveria ser feito exatamente o contrário: permitir a passagem de ciclistas e sinalizar que a prioridade dentro do túnel, como em qualquer outro local, é de quem pedala e está compartilhando a via com veículos motorizados.
“Ao proibir ciclistas no local, a CET exclui esse público e estimula o comportamento intolerante dos motoristas, que se sentem no direito de desrespeitar quem pedala, pois ali é um local ‘proibido de pedalar’. Isso cria um ambiente hostil aos que vão de bicicleta”, finaliza.
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