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Ao que devemos somar

Por: . 27/04/2022

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Ao que devemos somar

“A mobilidade sustentável e elétrica não é tendência; é necessidade.”

4 minutos, 0 segundos de leitura

27/04/2022

Energia elétrica e sustentável é uma das soluções para reduzir as emissões de gases estufa. Foto: Getty Images

O futuro do transporte é elétrico. Vamos concordar que não dá mais para continuar queimando combustível fóssil como se não houvesse amanhã (e talvez por isso mesmo não haja). A questão é como eletrificar o transporte para valer. O desafio é demasiado grande e o tempo para agir demasiado pequeno para dar tiros no escuro. Partindo desse ponto, trago, aqui, alguns fatos que não devemos perder de vista.        

Primeiro: vivemos em um mundo superconectado. Na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, todos afetamos uns aos outros econômica, social e climaticamente. É ilusão achar que resolveremos crises de todos com soluções de e para poucos. Todos precisam estar a bordo.        

No nosso caso – o Brasil abriga a maior parte do grande ar-condicionado do planeta e possui um enorme potencial para energias renováveis –, a responsabilidade é enorme, e uma da qual não podemos fugir. Na prática, não há solução climática verdadeira se não estivermos incluídos.        

Vamos adiante: pensar na mobilidade elétrica como uma simples troca de veículos a combustão por carros elétricos é colocar embalagem nova em um produto velho – e perigoso. Ao eletrificar o transporte, temos uma grande oportunidade de repensar radicalmente a mobilidade – e isso só se faz considerando como carros, ônibus, trens, bicicletas e até nossos velhos e bons pés se integram sistemicamente para proporcionar bem-estar econômico, social e climático.        

Dentre outras coisas, bem-estar é viver em cidades em que pessoas e veículos convivam em paz. Na cidade da mobilidade sustentável, as pessoas são prioridade: não perdem um quarto do seu dia no trânsito, não respiram gás de escapamento, não ficam surdas com os decibéis dos motores nem se afogam em enchentes a cada chuva mais forte.        

Dos superblocos de Barcelona ao Eixão do Lazer (que não precisava ser só do lazer) brasiliense e ao teleférico de Medellín, já se está fazendo algo para esse bem-estar. Nenhuma dessas iniciativas resolveu todos os problemas de suas cidades, mas contribuem para devolver o espaço urbano às pessoas. É a isso que a mobilidade elétrica deve se somar.        

Outra questão importante tem a ver com a energia com que eletrificamos nossos transportes. A verdade incômoda é que parte considerável da eletricidade mundial ainda vem da queima de combustível fóssil (mais de 63%, em 2020, conforme o Our World in Data). Nessas condições, um carro elétrico não é lá coisa muito limpa.

Movido a chuva        

Até que o Brasil não está tão mal nessa foto: a mesma fonte diz que só 13% de nossa energia veio da queima de combustível fóssil, naquele ano. É bom, mas não vamos esquecer que somos um país movido a chuva e que o desastre climático nos tem obrigado a ligar uma termelétrica aqui e acolá muito mais do que gostaríamos. Isso sem falar que temos contas ambientais e sociais a pagar pelas hidrelétricas que ligam nossas tomadas. Em todo caso, o que importa é que, sem uma limpeza geral na produção de energia, eletrificar transportes pode ser simplesmente passar adiante a conta do desastre climático.        

Espero não ter deprimido ninguém a essa altura. Quer dizer que esse negócio de mobilidade elétrica não adianta nada?        

Calma. Não é bem assim. Eletrificar os transportes é fundamental não só para um desenvolvimento mais inclusivo e socialmente justo mas para nossa sobrevivência neste planeta. Só precisa ser feito da maneira certa, e isso não vai acontecer sem políticas públicas.        

Acontece que elas também não se materializam no ar. Chegar a políticas públicas que possibilitem que a mobilidade elétrica seja aproveitada como a oportunidade que de fato é exige colaboração e coordenação de vários setores da sociedade: o de transportes, em seu papel de proporcionar os diferentes modais de maneira integrada; o da energia, proporcionando uma matriz limpa; o das cidades, proporcionando espaços que reduzam a necessidade de viagens desnecessárias; o da indústria, colocando na economia de escala os avanços tecnológicos; e o do Estado, cumprindo o seu papel de garantir que tudo isso ocorra para o bem-estar coletivo. Não é fácil, admito, mas não tem outro jeito. É para isso, fundamentalmente, que temos que trabalhar.        

A mobilidade sustentável e elétrica já está aí e veio para ficar. Não é tendência; é necessidade. Pode representar uma virada no jogo e contribuir, crucialmente, para uma transição para uma economia mais verde, segura, acessível, eficiente e sustentável para todos. É a esse esforço que devemos nos somar.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão

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