“Carros voadores” devem revolucionar a mobilidade aérea urbana

Aeronave elétrica vertical da alemã Lillium tem alcance para voar 250 quilômetros e capacidade para sete passageiros. Azul espera iniciar operação com o Lillium Jet a partir de 2025. Imagem: Divulgação Lillium

08/12/2021 - Tempo de leitura: 7 minutos, 52 segundos

Imagine ir da Avenida Faria Lima ao aeroporto de Guarulhos em apenas 15 minutos, por apenas 20% do valor de uma viagem de helicóptero? E, o melhor, sem emitir gases poluentes ou ruídos. Essa é a promessa das aeronaves elétricas de pouso e decolagem verticais (eVTOLs, da sigla em inglês). 

Mais silenciosas, sustentáveis e acessíveis do que os helicópteros e jatos executivos, as aeronaves elétricas capazes de pousar e decolar verticalmente – portanto, sem a necessidade de uma pista longa como a dos aeroportos – são a aposta para revolucionar a mobilidade aérea urbana do futuro. 

A facilidade de operação e os tipos de uso, como o transporte entre aeroportos em grandes centros urbanos, renderam aos eVTOLs o apelido de “táxi ou carro voador”, embora nada se pareçam com os automóveis que voam em filmes como De Volta para o Futuro. Equipadas com rotores e hélices, as aeronaves elétricas verticais se assemelham aos helicópteros, mas também podem ter pequenas asas, que dão sustentação ao voo. 

Para Stephen Fitzpatrick, CEO da inglesa Vertical Aerospace, os helicópteros e jatos executivos atuais são fantásticos, porém, infelizmente, são poluentes, barulhentos, caros e danosos ao meio ambiente. “Os eVTOLs resolvem todos esses problemas”, afirma o CEO da empresa, fundada, em 2016, para descarbonizar as viagens aéreas.

A Vertical Aerospace já está na quarta versão de sua aeronave elétrica de pouso e decolagem verticais. Batizada de VA-X4, pode transportar até quatro passageiros e um piloto, com alcance de 160 quilômetros (100 milhas) e velocidade máxima de 320 km/h (200 mph). A aeronave também produz 100 vezes menos ruído do que um helicóptero em voo de cruzeiro, e 30 vezes menos nos momentos de decolagem e pouso.

Para a Vertical, a VA-X4 é o primeiro passo para a eletrificação da aviação. O eVTOL inglês foi o escolhido pela Gol para suas operações de mobilidade aérea urbana. 

No final de setembro, a companhia aérea, em conjunto com o Grupo Comporte, uma entidade de seu acionista controlador, anunciou um protocolo de intenções não vinculante com a Avolon para aquisição e/ou arrendamento de 250 unidades da VA-4X. “Assumindo que a aeronave seja certificada e que as suas entregas aconteçam com sucesso, a companhia espera iniciar as operações com uma malha aérea brasileira usando aviões eVTOLs, em meados de 2025”, afirmou a empresa, em seu comunicado oficial.

eVTOL “brasileiro”

O eVTOL da EVE, empresa criada pela Embraer para acelerar a mobilidade aérea urbana, promete conectar o centro de São Paulo ao aeroporto de Guarulhos em 15 minutos. Foto: Divulgação EVE

Uma das empresas que lidera essa revolução na forma de se locomover nas cidades é a Eve Urban Air Mobility Solutions, empresa criada, em outubro de 2020, pela EmbraerX, para acelerar o ecossistema de mobilidade aérea urbana em todo o mundo. O primeiro conceito do eVTOL da empresa foi apresentado em 2019. Há cerca de um ano, a EmbraerX fez o primeiro voo do modelo em um simulador, que segue os parâmetros das leis de voo e é utilizado no desenvolvimento e na certificação dos aviões da empresa. 

Com 13 metros de comprimento e 11 de envergadura, a aeronave vertical elétrica tem capacidade para quatro passageiros, além do piloto. Embora, inicialmente, os voos devam ser operados por profissionais da aviação, a Eve garante que seu eVTOL está sendo projetado para voos autônomos. Capaz de atingir 250 km/h, o eVTOL da Eve tem autonomia para pouco mais de 100 quilômetros.

Em junho, a Eve fez uma parceria com a Halo, líder em operações de táxi aéreo e helicópteros nos EUA e no Reino Unido, para desenvolver produtos e serviços de mobilidade aérea urbana (UAM) nos mercados em que a Halo atua. 

A parceria inclui um pedido de 200 aeronaves elétricas de decolagem e pouso verticais (eVTOL) da Eve. A encomenda, com entregas previstas para começar em 2026, representa uma das maiores da indústria de UAM até o momento. 

“A parceria é um passo importante para a Eve assumir sua posição como líder global na indústria de UAM. Estamos prontos para construir o futuro da mobilidade com nossos parceiros de uma forma extremamente colaborativa”, afirmou, em nota, Andre Stein, presidente e diretor executivo da Eve Urban Air Mobility.

Mais passageiros e maior alcance

Em agosto, a Azul também anunciou a intenção de comprar 220 aeronaves verticais elétricas da alemã Lilium. A previsão da Azul é de que os equipamentos entrem na malha viária da companhia a partir de 2025. 

A opção pelo Lilium Jet, em vez de outros eVTOLs, como o da brasileira Eve, justifica-se pelas diferenças entre as aeronaves. O Lilium Jet se assemelha mais a um jato executivo, com capacidade para sete passageiros e maior alcance. Equipado com 36 motores elétricos com arquitetura de dutos, pode chegar à velocidade de cruzeiro maior, cerca de 280 km/h, a 10 mil pés de altitude. 

O Lilium Jet tem alcance de 250 quilômetros, ou seja, maior autonomia para atender aos planos da Azul. À época do anúncio da parceria, a companhia aérea fundada por David Neeleman afirmou que sua malha de eVTOLs pretende conectar centros econômicos, regiões metropolitanas, aeroportos e até mesmo condomínios residenciais. Ou seja, seria mais do que um “táxi aéreo”.

A Azul acredita tanto no projeto que, no final de outubro, celebrou um acordo que dá à subsidiária Azul Linhas Aéreas Brasileiras S/A o direito de compra de 1,8 milhão de ações da empresa alemã Lilium.

Certificação e regulamentação são desafios


CityAirbus terá perfil de táxi aéreo: autonomia de80km e velocidade de cruzeiro de 120 km/h; empresa afirma que operação ainda depende de certificação e regulamentação do espaço aéreo. Foto: Divulgação Airbus

Mas a UAM envolve bem mais do que apenas o desenvolvimento de novos veículos elétricos de decolagem e pouso verticais (eVTOLs). “É um ecossistema complexo, com peças críticas, incluindo projetar um veículo seguro, oferecer o serviço aos passageiros, projetar uma gestão de tráfego segura para veículos não tripulados e tripulados, bem como construir infraestruturas que se integram com os modais de transporte existentes”, declarou Darcy Olmos, diretor de novos negócios e head de mobilidade aérea urbana da Airbus.

A empresa multinacional também trabalha em um eVTOL. Chamado de CityAirbus, a aeronave está sendo desenvolvida para voar em um alcance de 80 quilômetros e atingir uma velocidade de cruzeiro de 120 km/h. O CityAirbus, totalmente elétrico, é equipado com asas fixas, cauda em forma de V e oito hélices movidas a eletricidade como parte de seu sistema de propulsão. 

Mas, como bem frisou o executivo da Airbus, além do desenvolvimento das aeronaves, as empresas precisarão certificar os “carros voadores” e trabalhar com operadores do tráfego aéreo, em todo o mundo, para criar um ecossistema seguro para a mobilidade aérea urbana. 

No final do ano passado, a Eve criou um “conceito de operação” para a UAM em parceria com a Airservices, provedor de serviços de navegação aérea civil da Austrália. O objetivo é usar a cidade de Melbourne como modelo para verificar como as soluções existentes podem funcionar com os novos “carros voadores”.

“Temos a responsabilidade de manter nossos céus seguros e estamos entusiasmados em alavancar nossa significativa experiência e capacidade operacionais em gestão do espaço aéreo e fazer parceria com um especialista global em aviação para desenvolver soluções inovadoras que garantam acesso seguro e equitativo ao espaço aéreo urbano por um amplo espectro de aeronaves, incluindo helicópteros convencionais, aeronaves de asa fixa e eVTOLs”, declarou Peter Curran, diretor de experiência do cliente e estratégia da Airservices.

Simulado no Rio

Mobilidade aérea urbana (UAM) no RJ. Foto: Divulgação EVE

No início de novembro, a Eve, em parceria com a Flapper, plataforma independente para voos sob demanda, iniciou o simulado de mobilidade aérea urbana (UAM), conectando a Barra da Tijuca ao Aeroporto Internacional Tom Jobim. 

No primeiro momento, a iniciativa vai utilizar um helicóptero, operado pela Helisul Aviação. O objetivo é avaliar todo o ecossistema de UAM e os principais conceitos relacionados à experiência de uma operação futura, com seis voos diários, a um “custo mais acessível do que a operação de um serviço de helicóptero convencional”, afirma a Eve. O valor da “passagem” entre a Barra da Tijuca e o aeroporto internacional fluminense é de R$ 99,90, uma fração do valor cobrado por uma viagem de helicóptero pelo mesmo trajeto.

“A simulação no Rio de Janeiro, uma das cidades com mais congestionamento no Brasil e no mundo, nos ajudará a levantar as reais necessidades dos usuários, parceiros e comunidade, que irão se beneficiar das nossas soluções de mobilidade”, diz André Stein, CEO da Eve, em nota.