Mobilidade como Serviço depende avanços básicos para decolar em 2023

O conceito de Mobilidade como Serviço está associado ao uso de novas tecnologias, de plataformas de mobilidade e a integração entre modal, informações e pagamentos. Foto: Getty Images

19/12/2022 - Tempo de leitura: 4 minutos, 3 segundos

A regulação sobre o compartilhamento de dados e maior facilidade de pagamento despontam como principais desafios na Mobilidade como Serviço para 2023, segundo especialistas no setor. A presença do sinal 5G nas capitais tende a contribuir com a qualidade do transporte, mas antes é preciso melhorar coisas mais essenciais que o sinal de internet.

“Ainda há desafios mais básicos. O conceito de Mobilidade como Serviço está associado ao uso de novas tecnologias, de plataformas de mobilidade e a integração entre modal, informações e pagamentos. Isso pressupõe a colaboração muito intensa entre o poder público, operadores de transporte coletivo e serviços por aplicativos. É essencial a regulação sobre o compartilhamento de dados. Hoje, há uma série de serviços com plataformas próprias, disputando os mesmos usuários, e não há compartilhamento de dados. Falta a regulação e estabelecimento de ambientes, com regras claras e participação de diferentes atores”, afirma Iuri Moura, gerente de projetos de desenvolvimento urbano do Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento (ITDP).

“Ainda há alguns passos a dar dentro do setor público. É um tema que usa compartilhamento muito intenso de dados, algo importante para o desenvolvimento tecnológico”, reforça Moura. Ele recorda que, apesar dos aplicativos de transporte já presentes no dia a dia do usuário, a maior parte dos dados do serviço permanece sob o controle dos operadores. “Teoricamente, o 5G vai contribuir, mas não adianta tê-lo à disposição se não houver compartilhamento de dados para aplicar o conceito de Mobilidade como Serviço no País.”

Ciro Biderman, pesquisador do Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas (FGV), vê como urgente a necessidade de abertura da bilhetagem, ou seja, a possibilidade de pagamento pelo uso do transporte público a partir de diferentes formas e por aplicativos de mobilidade, como já ocorre em diferentes países. “Se a bilhetagem não for aberta, estaremos enxugando gelo”, diz.

O pesquisador da FGV também acredita na necessidade de mudanças na governança. “As concessionárias continuam prestando um serviço tradicional. Talvez fosse preciso rever os contratos, prevendo a prestação de serviço sob demanda”, afirma, referindo-se à colocação de mais veículos em linha à medida que aumente o número de passageiros (algo comum em Berlim, na Alemanha). Sobre 5G nas capitais, Biderman acredita que existe uma expectativa exagerada: “Não vejo hoje problemas no transporte por causa da qualidade da internet, mas sim na governança.”

Tendência de modernização no pagamento

Iuri Moura, do ITDP, imagina alguns avanços para 2023 no pagamento eletrônico: “Acredito que há espaço para melhora na bilhetagem no ano que vem. As cidades vêm adotando novas tecnologias. Existe possibilidade de evolução, mas é preciso integrar diferentes serviços em uma única plataforma. A questão é saber se a partir dela será possível pegar metrô, ônibus e seguir com uma patinete.”

Moura citou uma viagem que fez a Londres, onde todos os serviços são geridos por uma mesma plataforma. “Do ponto de vista de governança e informação, eles já estão um passo à frente. Só usei o cartão de crédito, inclusive para serviços integrados [bicicletas]. Havia informação em tempo real sobre todos os serviços e horários de chegada de todos os ônibus.”

Ele recorda ainda que a mobilidade continua dependendo de uma prestação de serviço regular, de calçadas conservadas e espaço bem definido para bicicletas e patinetes em volta das estações e terminais. “Às vezes, é preciso eliminar vagas de carro no entorno em favor de outras opções, o que pode desagradar a alguns grupos. Existem desafios de diferentes naturezas.”

Ciro Biderman também acredita que, em 2023, deve começar um movimento dos municípios para retirar as concessionárias da bilhetagem, mas afirma que esse processo deve ocorrer em pelo menos três anos.

Digitalização versus idade

Perguntamos aos estudiosos sobre como lidar com pessoas acima de 50 ou 60 anos e menos familiarizadas com a tecnologia. Moura afirma que a questão geracional já foi identificada. “Não se pode abrir mão do pagamento em dinheiro em algumas situações. O País é marcado pela exclusão digital. Por isso, é preciso ter muito cuidado com usuários sem acesso ao uso do celular ou sinal de internet.” Ele lembra que também há pessoas sem conta bancária. “É preciso pegar o contexto e aprimorar, tendo sempre atenção à exclusão digital.”

Biderman, da FGV, estima que a falta de poder aquisitivo que permita acesso a planos de internet pode ser um problema ainda maior que a idade avançada ou falta de escolaridade.