Passe livre: São Caetano do Sul é a maior cidade de SP a adotar a tarifa zero
No Brasil, mais de 80 municípios já funcionam dessa forma, que leva mais passageiros para o sistema e é apontada por especialista como uma das soluções para a crise do setor
Desde o dia 01/11, passou a funcionar, em São Caetano do Sul (SP), a tarifa zero ou o passe livre nas oito linhas do transporte público por ônibus. Isso quer dizer que, desde o início do mês, toda a população do município pode pegar ônibus de graça em seus deslocamentos.
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Assim, com pouco mais de 165 mil habitantes, de acordo com o IBGE, e 15 km2 de área, São Caetano do Sul passa a ser a terceira cidade da Região Metropolitana de São Paulo a adotar o modelo, logo atrás de Vargem Grande Paulista, pioneira ao instituir a gratuidade em 2019, e de Pirapora do Bom Jesus, em 2020.
Entretanto, o município é o maior em população no Estado de São Paulo a conceder a tarifa zero. De acordo com a prefeitura municipal de São Caetano do Sul, a projeção é de um investimento de R$ 2,9 milhões por mês para garantir o passe livre à população.
Ainda de acordo com a prefeitura, o valor exato será calculado mensalmente com base em georreferenciamento e pago diretamente à Viação Padre Eustáquio (VIPE), concessionária do sistema. O benefício atende a população e também visitantes.
Atualmente, de acordo com a Coalizão Triplo Zero, mais de 80 municípios em todo o Brasil já funcionam com a tarifa zero ou passe livre no transporte público. Para entender mais sobre a medida e como ela impacta a população, conversamos com Rafael Calabria, coordenador de Mobilidade do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). Confira a seguir.
Em média, quanto os municípios brasileiros que adotam a tarifa zero empenham de seu orçamento?
Rafael Calabria, coordenador de Mobilidade do Idec: As cidades que adotam são pequenas e têm, em geral, um transporte de menor qualidade e frequência. Então, não é tão custoso. Mas muitas delas estão trabalhando para melhorar essa frequência, pois há demanda, além de reclamações da população.
O que temos visto é que essas prefeituras empenham de 1% a 3%, em média, do orçamento municipal, muitas vezes porque não buscam outras fontes de receita – à exceção de Vargem Grande e Paranaguá, que usaram o Vale Transporte. Normalmente seguem esse perfil, mesmo sem termos uma análise mais detalhada: baixa frequência no transporte, com um valor mais baixo.
Que benefícios a medida traz?
Todas as prefeituras que adotaram o passe livre são unânimes em apontar um aumento exponencial no uso do transporte, de 4 a 5 vezes, ou até mais. Algumas delas mencionaram, também, elevação da arrecadação e do comércio nas regiões centrais pela maior circulação de pessoas.
Há, também, o relato de Mariana, em Minas Gerais, onde a população está usando os ônibus para ir até a área central para venda de seus itens, que são produzidos na área rural, gerando nesse caso também oportunidades de trabalho. Isso tudo são relatos, porque no Brasil ainda não há estudos sobre o impacto da implementação da tarifa zero na redução do uso do carro, da poluição, entre outros efeitos.
Na capital paulista, a tarifa zero pode ajudar a reconquistar passageiros no transporte público?
Numa cidade grande como São Paulo, a redução da tarifa já traria aumento considerável no número de passageiros. Isso aconteceu em Maringá (PR) e o resultado foi muito positivo. Então, sem dúvida, a tarifa zero por aqui teria essa impacto.
O desafio, entretanto, seria fazer a integração com CPTM e Metrô-SP e, principalmente, seria necessária uma fonte de receita tarifária, porque o impacto no orçamento já é muito grande e o transporte já tem um custo muitíssimo maior do que nas cidades pequenas.
Em São Caetano do Sul esse aumento já está acontecendo?
Sim, o município relatou um crescimento de 50% no primeiro dia de implementação da tarifa zero em relação ao registrado antes. Entretanto, ainda é muito cedo para avaliarmos, visto que a medida passou a valer em 1º de novembro. Importante trazer aqui o relato de Maricá (RJ), que tem tido aumento no uso do transporte mesmo muito tempo depois da implementação da medida, porque a população vai entendendo melhor a política e se apropriando do uso do transporte.
Então, as pessoas vão compreendendo que podem usar os ônibus para outras finalidades, como lazer e consumo, e não apenas para o deslocamento para o trabalho. De forma que é ainda muito recente fazer afirmações sobre São Caetano do Sul, mas já há sinais de aumento.
Que particularidades de São Caetano do Sul você destaca?
São Caetano é uma cidade rica, com um município muito pequeno, ao contrário de Mariana (MG) e Maricá (RJ), por exemplo, que têm área muito grande e, consequentemente, deslocamentos maiores também.
De forma que, via de regra, em São Caetano do Sul, os deslocamentos são menores e a cidade tende a ter uma redução do uso do transporte [sem a tarifa zero], porque naquele cenário era mais vantajoso que as pessoas fossem caminhando. Agora, com a tarifa zero, há o estímulo para que a população use o transporte público.
Me chama a atenção que o município quase não tem infraestrutura para o transporte coletivo e integração com a CPTM – nas duas estações que abastecem a cidade – que geram um polo de viagens para o transporte coletivo. Que, inclusive, tende a ser muito ampliado, pelo volume transportado pela CPTM, que é alto. Mas, apesar da proximidade com a capital paulista, não foge muito do perfil das demais cidades que adotaram o passe livre.
Tem evoluído o número de municípios que aderiram à Tarifa Zero?
Sim, está aumentando. Na minha visão, isso ocorre por alguns motivos, como a repercussão das cidades que adotaram frente as vizinhas. Na Região Metropolitana de Fortaleza (CE) por exemplo, Eusébio aderiu primeiro, depois veio Aquiraz, e, mais recentemente, Caucáia, movimento que também se deu de forma parecida na Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG).
Outra questão é a crise que o setor enfrenta há anos. Como nas cidades pequenas os deslocamentos são menores e o uso do transporte não é tão alto, a tarifa é uma barreira muito mais sensível. E, com poucos passageiros, o serviço feito por parte das operadoras fica inviável. Temos conhecimento de algumas que até devolveram a operação para as prefeituras. Então, sem a cobrança da tarifa, aumenta muito o uso do transporte e para algumas cidades essa pode ser a solução para a crise.
Por fim, há a experiência, neste ano, da adoção do passe livre nas eleições, que gerou uma experiência muito interessante, com algumas cidades repetindo, recentemente, com Enem [Exame Nacional do Ensino Médio] e eleições do Conselho Tutelar.
São Caetano do Sul em números
• 165 mil habitantes
• 15 km2 de área
• 8 linhas no transporte público
• R$ 2,9 milhões por mês de investimento pela prefeitura na tarifa zero
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