Projeto de lei que prevê exame toxicológico para motoristas de aplicativo desagrada categoria
Texto propunha que parte da arrecadação de multas de trânsito fosse destinada a CNH Social, mas recebeu emendas com novo teor no Senado
A emenda proposta pelo senador Carlos Potinho (PL-RJ) ao projeto de lei 3965/2021 amplia a obrigação de realização de exame toxicológico para motoristas autônomos ou empregados. Essa possível alteração do texto, que inicialmente sugeria que parte dos valores arrecadados em multas de trânsito fosse destinada ao custeio da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) Social, desagradou os motoristas de aplicativo.
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Ampliação do escopo dos exames toxicológicos obrigatórios
Além de tornar obrigatório a realização de exames toxicológicos por parte de motoristas profissionais das categorias A e B, todos os condutores das categorias C, D e E devem comprovar exame negativo para obter renovação da CNH. Ademais, condutores com menos de 70 anos devem realizar novo exame a cada dois anos e meio a partir da renovação da carteira.
Na emenda, o senador também incluiu um artigo em que as empresas de transporte remunerado individual por aplicativo, como a Uber e 99, deverão exigir comprovação prévia da realização do exame toxicológico. Já em relação ao custo do exame, o senador explica que os trabalhadores em regime de CLT cumprem o que determina a legislação. Ou seja, o valor desses exames toxicológicos será arcado pelo empregador.
Contudo, Portinho coloca na emenda que o caso dos motoristas autônomos, devem realizar o exame por conta própria. Já os aplicativos devem exigir o resultado do teste toxicológico antes de iniciar o trabalho.
Após sofrer alteração no Senado, o texto voltou para a Câmara de Deputados para avaliação do novo texto. Além de Carlos Portinho, os senadores Fabiano Contarato (PT-ES), Beto Martins (PL-SC) e Magno Malta (PT-ES) propuseram emendas.
Questionado sobre o novo teor do PL, o senador Carlos Portinho optou em não se manifestar. Já o deputado José Guimarães, autor do projeto inicial, não respondeu à reportagem do Mobilidade Estadão.
Autônomos contra o pagamento de exame toxicológico
A análise das emendas na Câmara de Deputados ainda não começou, entretanto, o tema já tem gerado discussões na categoria. Conforme Leandro Cruz, presidente da Federação Nacional dos Sindicatos dos Motoristas de Aplicativo (Fenasmapp) e do Sindicato dos Motoristas por Aplicativo do Estado de São Paulo (Stattesp), os motoristas de aplicativo são totalmente contra essa emenda.
O principal argumento de Cruz é a cobrança de uma taxa (custo do exame) para uma categoria que sequer é regulamentada. “É um absurdo, uma categoria que não existe e ter que fazer exame toxicológico”, diz o presidente.
Para ele, a regulamentação dos autônomos precisa ocorrer para imposição de novas obrigações. Existem dois projetos de lei com esse objetivos parados na Câmara, um de autoria do governo e outro proposto pelo coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Motoristas de Aplicativos, deputado Daniel Agrobom (PL-GO).
Leandro também opina contra os custos serem arcados pelos trabalhadores. “Essa conta deveria ir para as empresas que vêm trabalhando no Brasil há tanto tempo sem sequer estar regulamentada a parte dos trabalhadores”, diz ele. “Se é para regulamentar com essa taxa de toxicológico, que eles encaminhem isso aí para as empresas poderem fazer o pagamento’, acrescenta o presidente.
De acordo com Leandro Cruz, o sindicato e a federação deve procurar os líderes dos partidos para colocar o posicionamento da categoria. Isso porque, segundo o presidente, a categoria não foi consultada duranta a elaboração das emendas. “É um absurdo, os deputados, da cabeça deles, tiraram uma regulamentação do exame toxicológico sem consultar a categoria, a gente é totalmente contra”, opina ele.
Conforme o texto da emenda do senador Carlos Portinho, “a relação entre as empresas de transporte por aplicativo e motoristas não apresenta a continuidade característica de um vínculo empregatício”. Por isso, ele defende que não faz sentido “tratar o preenchimento das condições legais para o exercício da atividade como se estivessem no âmbito de um exame admissional ou demissional.”
Inconformismo faz sentido, porém há amparo na falta de legislação
Para o advogado especialista em direito do trabalho, Fernando Zarif, o inconformismo por parte dos motoristas de aplicativo faz sentido. Porém, a legislação vigente protege as empresas caso o PL vire lei. Conforme Zarif, a falta de proteção legal e regulamentação coloca os autônomos em uma posição marginalizada em qualquer novo projeto proposto pelos deputados e senadores.
“De repente, encontrando nesse vácuo legislativo, começam a ser exigidos exames toxicológicos, que é algo realmente, nessa situação, desproporcional”, explica o advogado.
Além disso, Zarif ressalta que a falta de um contrato formal deixa os motoristas sem direito de questionar a nova exigência. Se o PL for aprovado, passar a ser exigência legal. “Não teria problema nenhum as empresas de transporte por aplicativo inserirem, dentro dessas condições de termos geral de uso, uma cláusula obrigando eles a se submeterem a exame toxicológico e começar a fazer essas exigências”, conta o advogado.
Ou seja, para usar a plataforma, os motoristas teriam que aceitar essa determinação já no cadastro inicial. E isso teria amparo legal e não descaracterizaria a relação de informalidade entre os envolvidos.
Entretanto, para Zarif, o que gera dúvidas é a forma que isso seria feito, em qual laboratório e quais seriam as exigências. A preocupação do advogado é em garantir que os motoristas não sejam onerados por práticas abusivas. “Teriam que criar meios de viabilidade para que eles tenham essa liberdade e um meio razoável para poder fazer e apresentar esses exames’, explica ele.
Possível nova exigência pode configurar vínculo
Caso o PL seja aprovado com a emenda do senador Carlos Portinho, a cobrança desses exames passa a ser exigida por lei. Isso fará com que as empresas exijam a comprovação toxicológica. Por isso, o advogado enxerga que a nova determinação faça parte dos argumentos de quem acredita no vínculo empregatício entre motoristas e aplicativos.
“Pois passa a ser mais uma exigência, algo que está diretamente ligado à subordinação desses motoristas, e que, de repente, se eles deixarem de cumprir ou de atender essa exigência, podem ser banidos da plataforma, podem deixar de fazer as corridas, podem ser excluídos”, explica ele.
Entretanto, o argumento contrário também terá força. “Em defesa, a empresa de aplicativo vai afirmar que está apenas seguindo a legislação”, conclui ele.
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