‘A gente ocupa os lugares com nossas vozes, nossos espíritos e nossos corpos’, diz Txai Suruí
A ativista e estudante de Direito fala ao ‘Na Perifa’; ela foi a única brasileira a discursar no principal palco da cúpula do clima, a COP-26
Quem acompanhou a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP-26, provavelmente já viu Walelasoetxeige Suruí, mais conhecida como Txai Suruí.
Indígena do povo Suruí Paiter, a ativista foi a única brasileira a falar na tribuna principal no encontro que reuniu chefes de Estado em novembro de 2021 em Glasgow, na Escócia. O encontro debateu estratégias para frear o ritmo do aquecimento global.
Walelasoetxeige significa mulher inteligente em Tupi Mondé [língua do seu povo], se tornou o rosto da COP-26 ao denunciar o governo brasileiro sobre as políticas adotadas (e as não adotadas) com as populações indígenas e as mudanças climáticas — o engajamento de Txai vem desde a infância. Está nas raízes da sua família.
TRECHO DO DISCURSO DE TXAI NA COP-26
"O Brasil está muito mal visto internacionalmente por toda essa política anti ambientalista que vem praticando. Então ouvir uma voz que fala de esperança, que fala que a gente consegue reverter essa crise e que os povos indígenas fazem parte dessa salvação, faz o mundo acreditar um pouco no Brasil e mostra que aqui ainda existem pessoas que têm compromisso com agenda climática e que o Brasil não é só destruição da Amazônia”
Txai nasceu em Porto Velho, capital de Rondônia, e foi criada na comunidade 7 de Setembro, Terra Indígena Paiter Suruí. Quando tinha entre 4 e 5 anos, seu pai e seu avô a colocaram em cima do tronco de uma árvore e disseram a todas as aldeias presentes que Txai seria uma grande líder.
Desde então, ela acompanha os pais nas manifestações e pede pelos direitos das crianças indígenas. Almir Narayamoga Surui e Ivaneide Bandeira Cardozo são conhecidos internacionalmente pela luta em defesa dos povos indígenas e a proteção das florestas.
Aos 24 anos, Txai estuda Direito na Universidade Federal de Rondônia (Unir). Ela coordena o Movimento da Juventude Indígena do Estado, é voluntária na organização Engajamundo e integra o núcleo jurídico da associação de defesa etnoambiental (Kanindé), fundada por sua mãe e que trabalha com o povo Uru-eu-wau-wau. “Estou tendo a oportunidade de estar em vários eventos e demais pessoas me seguirem nas redes sociais. Pessoas que escutam o que tenho para falar e uso isso como forma de denunciar e divulgar o que está acontecendo aqui e que as pessoas não viam”, diz.
Os jovens na agenda climática
Em entrevista ao Expresso na Perifa, Txai afirma que a juventude que luta contra as mudanças climáticas é símbolo de esperança. Para ela, é inadmissível que jovens e pessoas que estão sendo afetadas diretamente pelo emergência climática não façam parte de debates como a COP-26.
Como a gente muda a visão das coisas? Como a gente muda os resultados? Como a gente tem propostas diferentes se temos sempre as mesmas pessoas decidindo? A gente precisa ocupar esses espaços e dizer ‘Olha, essas discussões não podem mais acontecer sem a nossa presença’. A gente tá ocupando esses lugares com as nossas vozes, nossos espíritos e nossos corpos
Txai Suruí
Depois do discurso na COP-26, a líder indígena foi atacada nas redes sociais por muitas pessoas — entre elas o atual presidente, que não foi à conferência. Txai conta que ficou triste. “Eram mensagens de ódio e racistas, então decidi não acompanhar. Outra estratégia que tive foi aproveitar que aquelas pessoas estavam indo atrás de mim nas redes sociais e denunciar invasões em terras indígenas.”
Literatura, entretenimento, arte
Para além do ativismo, Txai busca nutrição na arte. No audiovisual, gosta de séries, como The Office, e filmes.
O livro A Experiência Zapatista – Rebeldia, Resistência e Autonomia, de Jérôme Baschet, aprofundou conhecimentos sobre o movimento de libertação formado por indígenas no México, no estado de Chiapas.
Outro que entrou para a lista foi o premiado Torto Arado, premiada ficção de Itamar Vieira Júnior. O romance conta a história das irmãs Bibiana e Belonísia, desde a infância, na década de 1960. Elas crescem em uma fazenda onde trabalhadores rurais afro-descendentes são subjugados por seus patrões. Ambientado na Chapada Diamantina, o livro retrata essa comunidade de relação profunda com a terra, o cultivo, a natureza em geral e a espiritualidade.
“A arte é muito importante. Ela alcança mais pessoas que outros meios, né? A própria música alcança muito mais as pessoas que qualquer outra coisa. Gosto muito de arte. Gosto de pintar, gosto de poesia e de desenhar. Faço alguns desenhos abstratos, onde coloco o que estou sentindo”, conta.
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