Sindicalista negra amplia os olhares sobre a defesa da educação
Professora ‘sem querer’, Juliana Mildemberg conta que aprendeu no sindicato qual era seu lugar no mundo
3 minutos, 57 segundos de leitura
19/04/2022
Por: Luiz Carvalho
Quando foi fazer um teste para ingressar no ensino médio do Instituto de Educação do Paraná, a curitibana Juliana Mildemberg, de 32 anos, se submeteu à avaliação do magistério. O que poderia ter sido um erro mudou sua vida. Aprovada, Juliana decidiu que seria professora.
Em 2007, ela passou em um concurso público para trabalhar na educação infantil da rede municipal e sua efetivação ocorreu em 2011. Naquele mesmo ano, em uma greve de cinco dias, a categoria reivindicava redução de carga horária, melhores condições de trabalho e a criação de um plano de carreira. O acordo firmado não foi o que Juliana e outros professores esperavam e o grupo resolveu questionar o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba (Sismuc).
A resposta foi um convite para que todos integrassem um grupo técnico dentro da entidade e, desde então, ela nunca mais deixou o sindicato. Em 2018, tornou-se a segunda liderança mais jovem da organização, sucedendo Marcela Bonfim, de 26 anos, na coordenação geral.
Negra, mulher, jovem — Na luta por educação de qualidade e condições dignas e justas de trabalho para os professores — causas complementares e que dependem uma da outra — Juliana integra um grupo muito atuante no movimento sindical de Curitiba. Dos nove mil filiados ao Sismuc, mais de sete mil são mulheres e a diretoria é majoritariamente feminina.
Na comparação com o que ocorre em outras organizações, o perfil do Sismuc em termos de representatividade se destaca. Para ter uma ideia, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior central sindical do País, nunca teve uma mulher eleita presidenta, apesar de adotar desde 2012 a paridade de gênero. Além disso, o público jovem tem poucas cadeiras nas entidades sindicais do Brasil. No mais recente congresso da CUT, 56,4% dos inscritos tinham entre 45 e 64 anos. As informações são da própria entidade.
Segundo Juliana, a inspiração para ingressar e permanecer na luta sindical veio da ideia presente na família de que não há conquista sem luta. “Minhas referências são as mulheres da minha família. Fui a primeira sindicalista, mas minha mãe e avós que me criaram e criaram meus três irmãos nos ensinaram que é preciso lutar pelo que se acredita. Aprendi a entender a importância do movimento sindical e que, se não fosse essa luta, não teríamos muitos dos direitos que temos hoje”, explica.
Minhas referências são as mulheres da minha família. Fui a primeira sindicalista, mas minha mãe e avós nos ensinaram que é preciso lutar pelo que se acredita. Entendi a importância do movimento sindical. Se não fosse essa luta, não teríamos muitos dos direitos que temos hoje (Juliana Mildemberg, professora e sindicalista)
Mudanças e conquistas — Os momentos de maior visibilidade dos sindicatos são as greves. Houve uma paralisação liderada pelo Sismuc, em 2014, ficou nacionalmente conhecida e, diferentemente do que aconteceu em 2011, rendeu conquistas importantes.
As manifestações da chamada onda amarela, uma alusão à cor das camisetas usadas pelas servidoras, fez com que o então prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT), incorporasse o grupo técnico do sindicato às negociações responsáveis por estabelecer um plano de carreira para os docentes, corrigindo defasagens salariais. Os embates também resultaram em um curso de formação para professores em Pedagogia. O convênio entre a Universidade Aberta do Brasil e a prefeitura beneficiou 150 educadores.
A conjuntura atual, porém, mostra-se tão crítica quando a de 11 anos atrás, avalia a coordenadora. Ela aponta que a prefeitura deve um aumento de 37,73% aos profissionais da educação em referência ao Piso Nacional, que em 2022 passou a R$ 3.845,63, e indica um déficit de ao menos mil profissionais no ensino infantil. Pautas que irão nortear uma nova paralisação de advertência marcada para 30 de abril.
Seja qual for a batalha, Juliana defende que mudanças estruturais precisam sair de dentro do próprio movimento sindical. A primeira delas é a maior participação das mulheres em um universo ainda machista. A segunda, mostrar que as organizações sindicais são espaços de formação de indivíduos conscientes e atuantes — nesse gesto, o objetivo é combater uma visão negativa que boa parte da sociedade tem dessas organizações.
“No movimento sindical aprendi meu lugar no mundo, a diferença que posso fazer, onde posso chegar. Abriu minha cabeça para outros horizontes. Me ajudou a entender outras realidades e que minha preocupação tem de ser para além de mim, também pelo que o outro sente e passa”, afirma Juliana.
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