‘Situação das mortes no trânsito, que já é grave, está piorando’, diz ONSV
Pedro Borges, head de Mobilidade Segura do Observatório Nacional de Segurança Viária, afirma que educação sobre trânsito deve começar muito antes do processo de habilitação
Para marcar a 11ª edição do Maio Amarelo, o Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) escolheu uma localização que simbolizasse a intenção de internacionalização do movimento. Assim, o 4º Seminário de Mobilidade Humana, Segura e Sustentável foi realizado nos dias 6 e 7 de maio em Foz do Iguaçu, no Paraná, na região da tríplice fronteira, divisa entre Brasil, Argentina e Paraguai.
De acordo com Pedro Borges, head de Mobilidade Segura do ONSV, “a ideia é expandir o Maio Amarelo para os nossos vizinhos”. Relatório da Organização Mundial da Saúde divulgado em 2023, referente a dados de 2021 (o último disponível) revelou que o Brasil registrou 16 óbitos em acidentes de trânsito por 100 mil habitantes.
Média perigosa
O índice é similar ao de países vizinhos como Colômbia, Costa Rica e Suriname, e acima do verificado na Argentina (9 mortes por 100 mil habitantes), Chile (10/100 mil), Peru e Uruguai (13/100 mil). No Paraguai, a média é de 21 mortes por 100 mil habitantes. Isso mostra que o problema é continental, e que o Brasil está acima da mediana, segundo Borges.
“Quando a gente olha para a quantidade de vítimas fatais, o nosso cenário é grave. São mais de 33 mil pessoas morrendo por ano no nosso trânsito, o que é muita coisa, e esse valor vem aumentando desde 2021. Então, em vez de melhorar, a gente vê que está piorando uma situação que já é grave”, afirma.
Levantamento da Polícia Rodoviária Federal mostra que as mortes em acidentes rodoviários vinham caindo ano a ano entre 2011 (8.675 ocorrências com mortes) e 2018 (5.273 falecimentos).
Entretanto, em 2019 o número voltou a subir (5.338 mortes). Caiu levemente em 2020 (5.293) e a partir daí continuou subindo em 2021 e 2022, último dado disponível.
Influência econômica
O executivo do ONSV diz que o período de queda nos índices pode estar relacionado com uma melhora das condições das vias, principalmente nas capitais, que começaram a focar mais em segurança viária.
Embora não apoie a tese “100%”, Borges cita também um viés econômico para explicar o período de queda, apontado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que atribui a redução nos índices até 2018 a um desaquecimento da economia brasileira.
“Eu, como (representante do) Observatório não gosto de afirmar isso 100%, porque parece que fica atrelado só à economia. A segurança viária é multidisciplinar, você chega a ela com fiscalização, infraestrutura, educação da população.”
No evento de abertura da 11ª edição do Maio Amarelo, no início do mês, o secretário nacional de Trânsito, Adrualdo Catão, lembrou que a responsabilidade sobre o trânsito também é do Poder Público. “Não podemos colocar esse ônus apenas no cidadão. Nós, gestores, também somos responsáveis pela segurança viária.”
Motorista nota 6
Questionado sobre como classificaria o motorista brasileiro, numa escala de 0 a 10, Pedro Borges, do ONSV, diz que daria “um 7 ou 6”. “Acredito que falta um senso de cidadania aos motoristas brasileiros. Eles devem entender que o espaço (no trânsito) é público, não é só deles, e que muitas vezes o meu desejo de chegar rápido em algum lugar não tem de ser prioridade”, afirma. “A gente tem muito a evoluir nessa questão.”
Apesar dos problemas, Borges considera que o País está avançando com a questão da segurança veicular. “O Brasil já tem uma rota de resoluções até 2030, para trazer novas tecnologias veiculares. Então eu acho que o Brasil, mesmo que esteja atrasado em relação às normas da União Europeia, por exemplo, já tem ao menos uma previsão.”
Por outro lado, ele cita a infraestrutura viária como um problema mais grave. “O Brasil tem cidades muito desiguais.” Citando São Paulo como exemplo, Borges afirma que a capital paulista tem boa oferta de infraestrutura viária nas regiões mais centrais, com mais ciclovias, mais ônibus. “Entretanto, nas periferias isso não ocorre. Então, o próprio nível de infraestrutura acaba influenciando em uma segurança melhor ou pior.”
Na escola
Outro ponto levantado por ele diz respeito à educação. “Acho que a educação no trânsito é um tema muito importante. A gente acaba olhando para isso apenas para a formação do condutor. Mas isso tem de ocorrer ao longo de toda a formação da criança, do adolescente, de ele entender a parte dele no trânsito para tornar um lugar mais seguro.”
Além de preparar a pessoa, o executivo reforça a importância da fiscalização. “O poder público precisa fiscalizar ainda mais os fatores de risco para tentar diminuir esse cenário que a gente tem atualmente. A partir do momento em que a pessoa torna o trânsito mais inseguro, ela tem de arcar de alguma forma. E muitas vezes a punição é o pagamento de uma multa.”
Uma das maiores transportadoras do País, a Braspress implantou há 11 anos um sistema de monitoramento de motoristas, que por meio de telemetria detecta condições indesejadas ao volante.
Segundo a empresa, das 64.822 ocorrências de anomalias constatadas nos veículos da empresa em 2020 (que vão de uso de celular a excesso de velocidade, por exemplo), o índice caiu para 10.481 eventos em 2023, uma redução de 83%.
Acidentes com mortos em estradas
2011 – 8.675
2012 – 8.663
2013 – 8.426
2014 – 8.234
2015 – 6.867
2016 – 6.398
2017 – 6.248
2018 – 5.273
2019 – 5.338
2020 – 5.293
2021 – 5.396
2022 – 5.439
Fonte: Anuário da Polícia Rodoviária Federal
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