Entenda a relação entre ciclovias e a segurança dos ciclistas
De acordo com urbanista Hannah Arcuschin Machado, a chave para diminuir as mortes no trânsito com o modal está na infraestrutura, que precisa ser adequada para todas as idades e realidades
A expansão das redes cicloviárias nos grandes centros, como na capital paulista, costuma ser mencionada como uma das formas de oferecer mais segurança a quem pelada. Afinal, trata-se de uma estrutura segregada dos demais modais, especialmente dos motorizados.
Mas, para que seja efetiva, é preciso que essa rede cresça e, também muito importante, que a estrutura existente passe por manutenções constantes e seja requalificada. Para falar sobre o tema, conversamos com Hannah Arcuschin Machado, urbanista e pesquisadora visitante no Massachusetts Institute of Technology (MIT), em Boston (EUA). Confira.
Qual o potencial da bike como meio de transporte em centros como a cidade de São Paulo?
Hannah Arcuschin Machado: A bicicleta é um modo muito eficiente de transporte em termos de velocidade alcançada, da massa movimentada – na comparação com o carro, que pesa uma tonelada para transportar pessoas com 70 kg, em média – e, por meio dela, é possível aumentar consideravelmente o raio de alcance em relação ao deslocamento a pé.
Então, para trajetos de até 5 km, vejo a bicicleta como um excelente modal. Passando dessa quilometragem, já começa a ficar penoso e acredito que se foge do perfil de ciclista comum. Então, pensando nas grandes distâncias como as encontradas na capital paulista, o equipamento é um ótimo complemento para a última milha, nas duas pontas do sistema.
De modo que a pessoa pode ir pedalando até um terminal de ônibus, deixar sua bike lá no paraciclo ou estacionamento seguro, ir até o metrô ou trem e, ao sair, usar uma bike compartilhada, o que gera economia de dinheiro e ganho de tempo. E, finalmente, é importante destacar também o prazer de pedalar, pois esse é um modo de transporte que, caso haja uma infraestrutura adequada, pode gerar uma situação de bem-estar.
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E como oferecer a segurança necessária para quem pedala?
Hannah: Na minha visão, a resposta está na infraestrutura adequada para todas as idades e realidades. É fundamental que ela transmita segurança para todos os perfis de ciclistas, e não apenas para os de nível avançado, que se aventuram no meio dos carros.
Então, a infraestrutura tem que ser desenhada pensando nas crianças, nos idosos, que possuem reflexos mais lentos, entre outros perfis. E a capital paulista ainda não chegou lá: vejo alguns trechos de ciclovias que atendem a esse padrão, mas, em sua maioria, ainda temos o desafio fundamental de reconquistar o espaço da via para permitir o uso da bicicleta, fazendo sua requalificação.
Esse é o desafio, um trabalho constante, para que se possa chegar a uma situação em que todos se sintam confortáveis e seguros. Então, fazer ciclovias segregadas, bem sinalizadas, com uma largura e pavimento adequados, além da receptividade do entorno – como velocidades compatíveis dos veículos, por exemplo – são aspectos fundamentais que precisam acontecer ao mesmo tempo.
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Como você avalia a expansão da rede cicloviária da capital paulista?
Hannah: O que acontece na cidade de São Paulo, ainda que em um ritmo aquém do desejado, é um processo de recuperação do espaço para uso da bicicleta para que essa infraestrutura seja requalificada, aos poucos, até que se chegue a uma malha ideal.
A prefeitura assumiu o compromisso, em seu Plano de Ação Climática, de aumentar as viagens de bicicleta – que hoje representam menos de 1% do total de deslocamentos – para atingir 4% do total até 2030. Então, para isso, é fundamental requalificar a infraestrutura. A prefeitura sabe o estado das ciclovias e ciclofaixas, pois foi feito um trabalho de auditoria em parceria com a associação Ciclocidade, o que demonstra que não é falta de informação.
No Plano de Mobilidade da cidade, de 2015, está determinado que, até 2028, devemos ter mais de mil quilômetros de ciclovia e estamos distantes disso, com 667 km. Então, nos próximos anos, esse trabalho precisa ser intensificado, com a construção de ciclovias em outras regiões da cidade, além da manutenção e qualificação das existentes.
O Brasil tem evoluído no quesito segurança para ciclistas?
Hannah: Vejo com muita preocupação a diminuição na queda do número de mortes de ciclistas na cidade de São Paulo, a partir de 2015. Quando refletimos sobre os dados, e vemos que a bike representa menos de 1% das viagens feitas atualmente, mas que equivale a 5% do total de mortes em acidentes de trânsito no Brasil, temos um ponto de atenção enorme.
Essa reflexão é importante para que se comece a mudar comportamentos. Aqui, pensando na segurança, reforço a importância das ciclovias e da bicicleta como modo de transporte: existe uma relação de ganha-ganha, do ponto de vista da saúde, que é muito relevante.
Pedalar é uma atividade física que traz muitos benefícios, é um modal não poluente, que pode, com as condições e infraestrutura corretas, reverter em qualidade de vida para as pessoas, tanto aos praticantes como para toda a sociedade.
Como a falta de local para treino para ciclistas de velocidade – que acabam impactando em acidentes de ciclistas nas estradas – pode ser resolvido?
Estou vivendo atualmente em Boston (EUA) e aqui há uma iniciativa muito interessante: uma vez por mês eu pedalo 1h30 até uma cidade vizinha, Bedford, onde há um lago para banho, por uma grande ciclovia segregada, chamada Minuteman Bike Path.
Ela foi instalada em uma ferrovia desativada e esse espaço, por pressão dos cicloativistas – pois haviam muitas pessoas contrárias, por isso destaco aqui a importância da participação popular nesses temas – se e transformou em um local muito seguro e agradável para pedalar. O Brasil é enorme e no país também poderiam existir locais semelhantes, basta que sejam feitos estudos e que isso seja priorizado.
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