Eletrificação no transporte dependerá do investimento de muitas tecnologias
No painel de abertura do Summit Mobilidade, especialistas revelam que a descarbonização pode ter outras plataformas além da energia elétrica

A transição energética brasileira não será ditada apenas por uma tecnologia. Ela deverá passar por várias plataformas de combustível, valendo-se do índice de aproximadamente 90% de fontes renováveis existentes na matriz elétrica do País. Esse foi o consenso do primeiro painel do Summit Mobilidade 2025, que acontece nesta quarta-feira, 28, no Teatro Bravos, que abordou o tema “Híbridos flex, eletrificados e novas tecnologias”. A medição foi feita por Diogo de Oliveira, editor do Jornal do Carro.
O presidente e CEO da Bosch América Latina, Gastón Diaz Perez, iniciou o debate ao falar da importância de investir em novas alternativas. “A tecnologia flexfuel foi lançada há 21 anos e, três anos depois, 90% dos carros vendidos no Brasil já eram flex”, afirma. “Quando você acerta em cheio no desenvolvimento de uma tecnologia, a coisa flui naturalmente.”
Perez defende que o Brasil não pode seguir um único caminho. “Não existe uma solução geral que moverá o mundo todo. No caso do Brasil, há uma vocação regional para preferir esse ou aquele combustível e o biocombustível é uma possibilidade muito interessante”, revela.
A Bosch, segundo o executivo, tem um portfólio completo para eletrificação e aposta na diversidade. “Adotar os veículos híbridos é uma decisão segura. Eles estão se consolidando como segmento de mercado e vai permanecer nessa condição por muitos anos”, acredita.
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Motores movidos a biometano
Representante da indústria de veículos comerciais, Marcelo Gallão, diretor de desenvolvimento de negócios da Scania Operações Comercial Brasil, lembra que a fabricante trabalha em projetos de motores movidos a biometano desde 2014. Desde 2019, a empresa já vendeu 1.500 unidades com essa motorização que, segundo ele, reduz em até 95% as emissões de CO2.
“O biometano para o transporte acima de 16 toneladas é mais viável. Em caminhões elétricos, o peso da bateria aumenta em cerca de 2 toneladas, limitando a capacidade de carga útil do veículo. Além disso, devemos questionar a origem da fabricação da bateria. Será que ela usa a queima de carvão e mão de obra escrava?”, questiona.
Gallão acredita que a eletrificação “terá a vez dela”, mas levará mais alguns anos. “Antes de mais nada, devemos solucionar a questão da distribuição de energia elétrica, o que não acontecerá em três ou quatro anos. A indústria envolvida precisará de tempo”, diz.
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‘Não existe falta de energia’
Já o líder do laboratório de genômica e bioenergia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Gonçalo Amarante Guimarães Pereira, foi enfático ao desmistificar um possível colapso de energia por conta da eletrificação automotiva. “Não existe falta de energia no planeta. Ao contrário, há excedente. O que se deve discutir é como capturar essa energia e transformá-la em combustível”, salienta.
Pereira pondera que o combustível fóssil não pode ser encarado como vilão durante o desenvolvimento de fontes não poluentes. “O petróleo é resultado de centenas de milhares de anos de safras acumuladas em um celeiro. Mas quem tem a chave desse celeiro para fazer bom uso dessa matéria prima?”, pergunta.
Com visão acadêmica, ele traça um paralelo: “A idade da pedra não acabou por falta de pedra, da mesma forma que a era do petróleo não terminará pelo esgotamento do petróleo na natureza, mas sim pelos movimentos climáticos”.
Embora inocente o petróleo, ele elogia iniciativas como o Pro-Álcool, criado nos anos 1970. “Foi um programa tão revolucionário como a ida do homem à lua”, aponta. “Há 50 anos, o Brasil mostrou ao mundo que a união de dois combustíveis é viável. Nada no mundo é melhor que o biocombustível.”
Brasil pode liderar movimento global na eletrificação
Gáston Perez concorda, ao dizer que o etanol torna o Brasil um ponto fora da curva. “O País tem condições de liderar um movimento global na eletrificação. O protagonismo pode ser do sistema híbrido, apesar de ainda ser mais caro devido ao trabalho conjunto de motores elétrico e a combustão”, afirma.
A Bosch, revela o CEO, está preparada para fornecer tecnologias de híbridos plug-in flex e propulsores elétricos com energia gerada a partir do motor a combustão. “Mas a massificação dependerá da escala. Não adianta investir em uma tecnologia cara para implantar em 20 mil veículos. Isso não se paga”, argumenta. Para ele, uma coisa é certa: a transição energética ainda demandara uma década para ser concluída.
Gallão, da Scania, vai na mesma linha. “A pressa é desnecessária, ainda mais no segmento de transporte pesado, que não pode carregar o peso da descarbonização da sociedade”. “Entendo que o valor do quillowat-hora de um caminhão elétrico já diminuiu, mas a conta ainda não fecha. Essa paridade deve ocorrer só em 2030”, estima.
Como cientista, Gonçalo Pereira faz um adendo, ao afirmar que o termo “descarbonização” não é empregado corretamente. “O certo é desfossilização. Até porque o dióxido de carbono (CO2) não é bom quando despejado no meio ambiente, mas é fundamental na terra para realizar a fotossíntese”, explica.
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