“Vamos ter quatro modelos 100% elétrico no Brasil”
Renault lança hoje nova linha da Master, incluindo a inédita versão a eletricidade da van
Ricardo Gondo gosta tanto de carro que costuma sair dirigindo sem destino nos fins de semana em companhia do filho. O engenheiro mecânico nascido em Santo André (SP) iniciou a carreira na indústria de autopeças.
Em 1996, ingressou na Renault para ser gerente de vendas. Trabalhou na Espanha e em Portugal e voltou à América do Sul em 2016 como vice-presidente de vendas e marketing para a região.
O executivo, que ocupa o cargo de presidente da empresa francesa no País desde 2019, conversou com o Estadão sobre os desafios impostos pela pandemia e o futuro da indústria. Além disso, revelou que a marca lança hoje, no mercado brasileiro, uma versão 100% elétrica da van Master de olho no crescimento do setor de transporte de carga de última milha.
Como foi o ano de 2021 para a Renault?
Ricardo Gondo: O ano de 2021 foi o primeiro ano da implantação do plano estratégico global, baizado de “Renaulution” e lançado pelo CEO do Grupo, Luca de Meo. No Brasil, a primeira etapa, batizada de Resurrection, está em fase de conclusão com bastante sucesso.
Prova disso são os lançamentos que seguem a pleno vapor. Continuamos investindo no Brasil, lançamos novos carros em 2021 e iniciamos 2022 lançando o novo Kwid no País. A próxima etapa do plano é a Renovation, que foi apresentada pelo De Meo em novembro, na visita ao Brasil. Agora, vamos ampliar nossa gama de produtos em segmentos superiores, em que ainda não atuamos no País.
No início de 2021 anunciamos um ciclo de investimentos mais curto no Brasil, de R$ 1,1 bilhão, que foi uma etapa importante. No período 2020/21, a gente estava pilotando muito de perto o caixa da empresa. Olhando para 2022, ainda há várias incertezas em relação à covid e à inflação e à taxa de juros, que continuam altas.
Então, estamos avaliando mensalmente como o mercado vai se comportar em 2022. Outros temas que preocupam são as falhas na cadeia de suprimentos e a falta de semicondutores. Seja como for, em 2022 vamos crescer. E a previsão é de que o mercado também cresça entre 5% e 10%.
É possível saber quando a cadeia de suprimentos deve se normalizar?
Gondo: Ainda é bastante difícil fazer uma previsão. Seja como for, nosso plano de produção para novembro e dezembro foi cumprido. Agora, a visibilidade é de curto prazo.
Temos metas para janeiro e fevereiro e precisamos cumprir os compromissos com nossos clientes e com a rede de concessionárias. Portanto, temos de acompanhar esse processo quase diariamente. O primeiro semestre vai ser difícil. Acreditamos que a situação deve começar a melhorar no segundo semestre.
Quais são os planos para 2022 e o que será feito para alcançar essas metas?
Gondo: Como parte do plano de investimentos 2021/22, lançamos o novo Zoe 100% elétrico e o novo SUV Captur como motor 1.3 turbo. Em 2022, já lançamos o novo Kwid, que tem mais tecnologia e ficou mais econômico. Nesta quarta-feira (26 de janeiro), vamos lançar a nova (van) Master, que, pelo oitavo ano consecutivo, é o líder de vendas do segmento. Na nova geração, a Master tem motor 24% mais econômico que o anterior.
Além disso, a linha traz ESP, controle de tração e sistema anticapotamento. Outra novidade é a versão 100% elétrica. Vários clientes que atuam no setor de entregas de última milha vinham pedindo esse tipo de solução. Lançamos o Kangoo elétrico no fim de 2021 e já vendemos 100 unidades. Além disso, vamos lançar os elétricos Kwid e Master no Brasil. Assim, vamos ter quatro modelos 100% elétricos no País: Zoe, Kwid, Kangoo e Master.
Estamos lançando o conceito E-Tech no Brasil, que é uma estratégia global do Grupo Renault. Ou seja, de veículos híbridos e 100% elétricos. Na Europa, 30% das nossas vendas são de modelos E-Tech. Aliás, a Renault ingressou na mobilidade elétrica há mais de dez anos. Temos ampla experiência na concepção, fabricação e comercialização de veículos elétricos. São mais de 500 mil Renault eletrificados circulando no mundo.
Mais do que fabricar automóveis, a Renault vai oferecer soluções de mobilidade e movidas por energia limpa. Por isso, o grupo criou em 2021 a Mobilize, uma divisão focada nesse tema.
O que haverá de novidade na área de compartilhamento?
Gondo: Em 2021, começamos a testar um serviço de compartilhamento no Complexo Industrial Ayrton Senna, no Paraná. Juntamos todos os carros da empresa em uma frota única. Ela é cerca de 25% menor que o total de veículos de todas as áreas. Isso deu origem ao Mobilize Share, que funciona por meio de um app. Os colaboradores podem utilizar esses carros no trabalho ou para fins pessoais sete dias por semana e 24 horas por dia.
Com isso, o serviço passou a ser fonte de receita. Incialmente, tínhamos Kwid e Sendero. Depois, os usuários começaram a pedir modelos como Captur, Master e a (picape) Oroch. O pagamento pode ser feito pelo cartão de crédito. No ano passado mesmo começamos a trabalhar com algumas empresas, como a Copel.
A distribuidora de energia elétrica oferece o Renault Zoe elétrico para seus 2.500 funcionários por meio do serviço de compartilhamento.
Quais foram os impactos da aceleração da digitalização nos negócios?
Gondo: Desde 2017 a Renault já apostava na digitalização. No lançamento do Kwid, era possível fazer a pré-reserva de forma 100% digital. Depois, o cliente passou a poder fazer todo o processo de compra por esse canal. Atualmente, vendemos mais de 20 carros por meio desse sistema.
Além disso, integramos o estoque da rede de concessionários. Assim, o processo já havia começado. Agora, o agendamento de serviços e vários outros processos podem ser feitos diretamente pelo usuário, via smartphone.
Há alguma decisão que o sr. mudaria se pudesse?
Gondo: Os anos de 2020 e 2021 foram bastante desafiadores. Mas fizemos um bom trabalho em equipe. Durante esse período, enfatizamos bastante o processo de comunicação. Faço uma reunião mensal com todos os gerentes e diretores. Houve meses em que fizemos duas, três reuniões para manter toda a equipe bem informada, dar respostas às equipes e alcançar o resultado esperado.
Então, aprendemos a trabalhar melhor em equipe e ser transparentes. Há muita gente em home office e é preciso manter as equipes engajadas e focadas nos nossos objetivos. A empresa tem uma visão muito clara de prioridade, que é proteger as pessoas, nossas equipes.
O que o governo deveria fazer para estimular o setor e a indústria em geral?
Gondo: Nossa indústria precisa de investimentos, que são muito altos. Além disso, o ciclo dos nossos produtos são longos – têm cinco, sete anos. Isso inclui plataforma, carroceria, motores e tecnologias. Então, é importante haver previsibilidade e segurança jurídica.
Outro ponto importante é equilibrar a inflação e a taxa de juros para gerar crescimento econômico. No fim, o que precisamos é gerar emprego e renda. Para ser viável, o setor de veículos precisa ter volume, e quem compra automóvel em todo o mundo é a classe média. Portanto, o equilíbrio ajuda o País a voltar a crescer.
O que o sr. faz para convencer a matriz a investir no Brasil?
Gondo: O plano de oferta de produtos é definido a partir da nossa visão do mercado. Temos de entender como o mercado vai se comportar, quais serão as demandas dos clientes de hoje e de amanhã.
A partir disso, podemos avaliar maneiras de construir nosso plano e mostrar porque precisamos ter determinado tipo de produto no Brasil. Depois vem a questão econômica. Temos de mostrar qual será o retorno sobre o investimento.
O ponto é que competimos com as outras filiais do Grupo Renault no mundo. Estamos discutindo agora o próximo plano produto. Vamos entrar em segmentos nos quais ainda não atuamos e que têm maior valor agregado. Mas isso vale também para segmentos em que já atuamos. O Kwid, por exemplo, tem três versões. O novo modelo ganhou itens para poder competir em um segmento superior de mercado.
O sr. chegou a perder o sono antes ou depois de tomar um decisão importante?
Gondo: Não perdi o sono, mas houve ocasiões em que tive de tomar decisões bem importantes. Por exemplo, tivemos de adaptar o tamanho da empresa e a produção. São ações que impactam a vida dos colaboradores. São decisões difíceis, mas que eu tomo em conjunto com minha equipe.
Por isso reforço a importância do trabalho em equipe, da boa comunicação e da transparência. Todos têm de entender o motivo daquela decisão. É o caso do home office. Todos enfrentamos os mesmos desafio.
Creio que minha experiência ajudou bastante. Trabalhei na Espanha de 2013 a 2016. Ou seja, em meio a uma grande crise. Isso também dá suporte para enfrentar as novas crises que vão surgindo.
O que o sr. faz quando não está trabalhando?
Gondo: Gosto de ficar com a minha família, viajar e poder compartilhar experiência com meus filhos e minha esposa. Quando você sai de férias, passa 15 dias e 24 horas por dia com a família. E tem oportunidade de descobrir muitas coisas bacanas da família.
Tenho um filho que, assim como eu, adora automóvel. Então, no fim de semana a gente gosta de andar de carro, mesmo que seja sem destino. Passear de carro isso já é um grande prazer para mim.
Qual mensagem você mandaria para o Gondo que estava se formando em engenharia no início dos anos 1990?
Gondo: Sou engenheiro mecânico e adoro carros. Comecei na indústria de autopeças e depois tive a oportunidade de vir para a Renault. Então, acho que é preciso saber fazer boas escolhas e, no trabalho, buscar aquilo que dá prazer.
O fato de a Renault desenvolver tecnologias para a Fórmula 1 e fornecer motores que foram campeões é motivo de orgulho. Tenho prazer em participar dos eventos e passar o fim de semana em Interlagos é excepcional.
Com isso, a Renault terá veículos elétricos em vários segmentos…
Gondo: Com a Master elétrica, a Renault assume o protagonismo também no Brasil. Temos veículos para atender diferentes faixas do mercado. Mas ainda não dá para oferecer um SUV elétrico, pois o preço ficaria fora da realidade do Brasil. Porém, a marca vai ter o maior número de veículos elétricos do País.
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