Jogadores trans de futebol de salão formam rede de apoio e acolhimento em São Paulo
Equipe é campã municipal de futsal para homens trans
O Sport Club T Mosqueteiros é um time de futsal amador formado por jogadores trans de diversas quebradas da cidade de São Paulo. A equipe treina desde 2019 e nos encontros semanais — além de jogar — compartilha experiências e fortalece vínculos de amizade ao modo “um por todos e todos por um”. A reportagem do Expresso na Perifa acompanhou um treino e conversou com atletas.
O T Mosqueteiros é uma ideia da dupla Tatto Oliveira e Gabriel Cardoso. Surgiu no coletivo LGBTI Núcleo de Resistência, que articula projetos de arte, educação, esporte e apoio social em encontros e rodas de conversas. Morador do Capão Redondo, na região sul da capital paulista, Tatto explica que os encontros do time ocorrem no centro da cidade — na região da República — para que alcancem mais gente. O objetivo da iniciativa, afirma, é contribuir para o bem-estar físico e mental dos participantes.
O contato para participar do T Mosqueteiros é feito pelo Instagram @sctmosqueteirosoficial. Os treinos ocorrem aos domingos de manhã com aquecimento e respeitando os limites de cada um. O time tem um preparador físico e uma preparadora tática
“Em maio de 2019, foi feito um chamamento público para homens trans que estivessem interessados em jogar”, lembra Tatto. “Foram mais de 120 inscrições e os primeiros treinos foram na Casa Florescer, que é um espaço de acolhida de mulheres trans.”
Por causa da pandemia, as reuniões presenciais ficaram suspensas até setembro de 2021. Em novembro, a resolveu competir na primeira edição dos Jogos LGBTQIA+ da cidade de São Paulo. Na correria, teve até rifa para comprar uniformes. Mas valeu a pena: o T Mosqueteiros foi campeão no futsal. “Foi muito produtivo, porque, além de ganhar o campeonato, conseguimos empoderar pessoas trans masculinas para praticar esportes”, emenda o idealizador do time de futsal.
A vitória na quadra também fortaleceu a amizade dentro do time que é formado por pessoas com idade entre 17 e 49 anos, de diversos lugares da capital e região metropolitana, como explica o tatuador Miguel Midori Garcia Shimasaki. “A coisa mais importante de tudo para mim é a troca de ideias, experiências. Tenho crescido muito como pessoa, me tornei um homem trans mais confiante depois de conviver com outros como eu”, comenta o atleta, nascido em Guarulhos. Shimasaki gostava de futebol desde pequeno, mas não conseguiu levar a paixão adiante. “Não tive apoio da família, por ser considerado coisa de ‘menino’, o que me levou a abandonar.”
‘Um por todos, todos por um’ — A rotina do T Mosqueteiros é cheia de desafios. A equipe não tem patrocinadores e o aluguel da quadra pesa no orçamento, o que pode ser insustentável a longo prazo, afirma Bernardo Gonzales, professor e analista de diversidade e inclusão. “Raramente perco um treino, porque para meu corpo e minha psique a prática esportiva entre minhas pessoas favoritas do mundo é o que recarrega energias para reivindicar um mundo melhor, mais humano em que nossas identidades sejam respeitadas e dignas de humanidade”, comenta.
Para meu corpo e minha psique a prática esportiva entre minhas pessoas favoritas é o que recarrega energias para reivindicar um mundo em que nossas identidades sejam respeitadas e dignas (Bernardo Gonzales, professor e analista de diversidade e inclusão)
Tatto destaca que essa rede de apoio é importante para compartilhar informações sobre os direitos de pessoas trans e os caminhos de atendimento público e gratuito. Em janeiro de 2022, foi criado no bairro de Santana, na zona norte da cidade, o Centro de Acolhida Especial de Homens Trans João Nery, que é o primeiro espaço exclusivo para corpos transmasculino e funciona 24 horas por dia.
O nome do CAE é uma homenagem ao escritor João Nery, o primeiro brasileiro a fazer a cirurgia de redesignificação sexual, no ano de 1977. Nery nasceu em 1950 em Niterói, no Rio de Janeiro, e morreu em 2018, vítima de câncer.
Políticas públicas para a transição de homens trans O processo de transição de gênero para homens trans passa por dois anos de tratamento hormonal e acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Depois desse período mínimo, vem a fila da mastectomia (cirurgia de remoção das mamas), pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Tatto Oliveira está nesse processo e explica que na rede pública é possível fazer consultas e retirar os medicamentos.
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