Poeta usa redes sociais para coletar doações na pandemia
O debate sobre a utilização e a eficiência dos direitos humanos tem de ser apropriado pelas favelas e periferias. Foto: Getty Images
Com a perda de renda e emprego, as periferias enfrentam dificuldades diárias para manter suas famílias; o número de refeições por dia caiu de 2,4 em 2020 para 1,9 em fevereiro de 2021
No Campo Limpo, periferia da zona sul de São Paulo, não é todo dia que os mais de 216 mil moradores têm arroz, feijão e gás, itens básicos e que, desde o início da pandemia, estão cada vez mais caros. Com a perda de renda e emprego, as pessoas enfrentam dificuldades diárias para manter as famílias.
Em fevereiro deste ano, o Instituto Data Favela, em parceria com a Locomotiva e a Central Única das Favelas (Cufa), fez uma pesquisa com os habitantes das favelas brasileiras: 68% dos entrevistados disseram que, nas duas semanas anteriores ao estudo, eles não tiveram dinheiro para comprar comida em ao menos um dia. O número de refeições diárias dos moradores das comunidades caiu de 2,4 em 2020 para 1,9 em 2021.
Moradora do Campo Limpo, a escritora e produtora cultural Thayaneddy Alves, de 29 anos, mais conhecida como Thata Alves, mantém há anos uma lista de transmissão no WhatsApp onde circulam ações dos coletivos culturais e dos trabalhos e poesias que a artista divide com os participantes. Só pontualmente o grupo pedia alimentos e outros itens para as famílias mais pobres do bairro. Desde o início da pandemia, porém, a rede se transformou em uma importante ferramenta de doações.
“Na crise, tivemos vários gritos pedindo cesta básica, conta de luz, água e novas urgências”, diz Thata. “As pessoas precisam de ajuda. Me vi nessa situação também, com um núcleo de artistas que também precisaram.” De um lado, as pessoas tinham mais necessidades e menos recursos; de outro, as políticas públicas não eram suficientes. “O auxílio emergencial, por exemplo, não atendeu todos os moradores em situação de extrema pobreza”, afirma.
Um dos movimentos que Thata compõe é o Sarau da Ponte pra Cá, que desde 2014 faz ações culturais na região e também se mobilizou na tentativa de conter parte dos impactos trazidos pela crise do coronavírus. Os pedidos de ajuda são disparados aos cerca de mil contatos, que de alguma forma sempre respondem. Quem não consegue colaborar com alimentos ou dinheiro se oferece ajuda para montar cestas, cozinhar ou fazer entregas.
Todos por todos
As doações não são contabilizadas nem registradas, segundo Thata, para não expor quem precisa, porque quando a pessoa pede ajuda, é o ápice do desespero. A poeta ressalta a solidariedade, uma característica forte entre os moradores da periferia. “Aqui, a gente sempre faz isso. Quando bate laje, quando tem churrasco. Tem divisão de feira, empréstimo de café e açúcar”, afirma. Na ausência do poder público percebida dia a dia, são as iniciativas das próprias comunidades que predominam. “Na zona sul, por exemplo, vários coletivos se uniram para ajudar famílias. A periferia se deu as mãos, talvez nunca soltou”, diz Thata.
A reportagem consultou a prefeitura e o governo de São Paulo sobre as políticas públicas para a região e a demanda dos moradores. Até o fechamento deste texto, não houve retorno.
A campanha de Thata Alves continua. Interessados podem fazer doações através do perfil pessoal da escritora ou do Sarau da Ponte pra Cá. Outra opção é o PIX 327 639 800 0001-70
Importância das doações
49% dos brasileiros fizeram algum tipo de doação na pandemia Entre os mais pobres, a participação chegou a 63% A cada dez pessoas, nove receberam alguma doação Oito em cada dez famílias afirmaram que, sem as doações, não tiveram condições de se alimentar, comprar produtos de higiene e limpeza ou pagar as contas básicas caso não tivessem recebido doações
Fonte: Instituto Data Favela, setembro de 2021
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